(El País)
(A expressão do jornalista Rui Gustavo do Expresso online “Jangada sem Luz”, movendo-se "sem remos, nem velas, nem hélices em direção ao sul do mundo" numa feliz invocação da Jangada de Pedra de José Saramago, foi a referência mais imaginativa que encontrei na imprensa online ao apagão de ontem que transformou por momentos as nossas vidas. Já não é a primeira vez que, obcecados com a inovação tecnológica, perdemos de vista que as sociedades modernas estão hoje dependentes e vulneráveis a um ponto que não está em linha com os avanços da tecnologia. A energia elétrica está obviamente entre essas dependências e vulnerabilidades. Aparentemente, um desequilíbrio repentino ainda por explicar na rede espanhola apanhou o território continental num período de importação de energia mais barata proveniente de Espanha e o caos instalou-se. Muita gente, tendo perdido já o hábito de ouvir rádio, ignorou que aquele meio de comunicação era o único que poderia proporcionar alguma informação e assim o fizeram alguns, bem como regressando à rua para junto de outras pessoas obter alguma informação. Ficamos a saber que ao provérbio “De Espanha nem bom vento nem bom casamento” junta-se agora a ideia de que os apagões podem ter aí também a sua origem, desafiando a cooperação necessária. Nos termos em que a crispação política está instalada, não me admiraria que o apagão viesse instalar-se na campanha eleitoral. Montenegro talvez agradeça pois esbaterá o tema da SPINUMVIVA, agora que parece apresentar uma vantagem crescente, ligeiramente acima do empate técnico. Por mais insólito que o apagão seja como fenómeno energético, fica-se, porém, com a ideia incómoda de que o País reage, mas que as coisas não estão planeadas como deveriam estar para contingências desta natureza. Não tenho conhecimento técnico que me permita avaliar se a existência de duas apenas duas infraestruturas de reenergização do sistema, Tapada do Outeiro cuja proximidade explicou que antes das 18 horas já tivesse energia e internet aqui em casa e Castelo do Bode, é suficiente para fazer face a uma retoma o mais rápida possível.)
De todo este apagão fica sobretudo a estranha sensação de não ser conhecida a sua causa. Lendo os jornais espanhóis fica-se também com essa sensação de ninguém saber explicar a queda súbita de produção de energia elétrica que ocorreu no sistema espanhol, gerando a resposta automática do apagão subsequente. Tudo se passou como se alguém tivesse furtado uma percentagem relevante de produção e impactasse o sistema por esse motivo.
Mais grave é, do meu ponto de vista, a ideia de que a ligação de Espanha e, consequentemente, também de Portugal ao sistema elétrico europeu está presa por circunstâncias de grande vulnerabilidade, a que talvez não seja estranha a posição das autoridades francesas, algo de similar ao que se passa nas ligações ferroviárias e o ponto crítico são também os Pirinéus.
Nota complementar
Segundo informação complementar que obtive a partir do El País, estão em curso os trabalhos de interconexão da Península Ibérica com França através do Golfe da Biscaia, na modalidade de ligação submarina que aumentará a capacidade de troca de energia de 2.800 MW para 5.000 MW. Esta ligação está prevista para entrar em funcionamento apenas em 2028. Até lá a precariedade da ligação com França permanecerá.

Sem comentários:
Enviar um comentário