terça-feira, 15 de abril de 2025

MARIO VARGAS LLOSA

 

(Idígoras y Pachi, http://www.elmundo.es)

(Agustin Sciammarella, http://elpais.com)

 

A morte de Mario Vargas Llosa (MVL), ontem acontecida aos 89 anos na capital do seu país de origem (Lima, Peru), trouxe-me à cabeça memórias difusas de toda uma vida. Para simplificar: um romancista genial, na sua melhor expressão altamente focado na realidade que lhe era mais próxima (a América Latina), que muito contribuiu (com outros, como García-Márquez, Borges, Neruda ou Amado) para me abrir horizontes decisivos na compreensão das especificidades da Região e das vicissitudes políticas que a foram marcando; o autor de duas obras maiores, entre outras igualmente incontornáveis que contribuíram para o seu Prémio Nobel de 2010, como “Conversa na Catedral” (1969) – reportado à experiência social do Peru ditatorial dos anos 50, enraizado nos movimentos de oposição estudantil ao regime autoritário de Adriá, baseado numa conversa entre o filho de um empresário bem-sucedido e o seu motorista e centrado na corrupção como um dos traços mais sistémicos da sociedade em causa  – e “A Festa do Chibo” (2000) – a meio caminho entre ficção e realidade, a narrativa passa-se na República Dominicana e retrata o assassinato do ditador Trujillo (o Chibo) em 1961, os seus antecedentes no apogeu da ditadura durante a década de 1950, a história de uma família ligada ao regime (a de Urania Cabral, que regressa dos Estados Unidos nos últimos dias da ditadura e testemunhará a transição para a democracia), o atentado e as respetivas consequências na Ilha e seus habitantes –, um livro que me permitiu naquele Verão iniciar de modo marcante o gosto pela leitura de duas adolescentes; um intelectual insaciável que se tornaria num cronista versátil e de largo espetro (da crítica literária ao ensaio, de temas de atualidade à política espanhola ou latino-americana, da grande política internacional ao posicionamento ativo e cidadão em matérias de voto, de impacto democrático ou de relevância societal) que acompanhei de perto durante décadas, designadamente no “El País”, e que também se deixou tentar pela incursão direta na política quando, em 1990, decidiu candidatar-se à presidência do seu país contra Alberto Fujimori (que venceria e evoluiria para o autoritarismo e a corrupção); um homem da vida e do mundo que nunca prescindiu da sua irredutível independência, mesmo quando as suas posições de um determinado momento pareciam contraditórias (ou, pelo menos, pouco coerentes) em relação a outras anteriores, fazendo dele um personagem inclassificável – visto à esquerda por força do sentido das suas obras literárias, MVL nunca abandonou um essencial progressismo nos usos e costumes mas também não se coibiu de assumir atitudes (algumas bem discutíveis e até superficiais) lidas como conservadoras em muitas dimensões de incidência política, já para não referir os seus muito criticados aparecimentos nas páginas da “Hola” ao lado da ex-mulher de Julio Iglesias (Isabel Presley), por quem se apaixonou e com quem manteve uma relação altamente polémica e mediatizada, isto numa área em que a pujança das suas paixões sempre tendeu a exceder o convencional e que o levou a acabar os seus dias ao lado da sua prima e mãe dos seus três filhos (Patrícia) em “peregrinação” aos locais mais simbólicos da sua escrita.

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