quarta-feira, 7 de maio de 2025

ESTABILIDADE E REFORMISMO

(a partir de Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt) 

Continuo incapaz de descortinar as razões substantivas que podem levar tantos portugueses à admiração quase sebastiânica que parecem devotar a Pedro Passos Coelho. Mesmo não desvalorizando que esteve ao comando no tempo da Troika e da respetiva saída limpa do País – não obstante o servilismo que evidenciou e os excessos ideologicamente condicionados que não quis deixar de alardear garbosamente –, mesmo reconhecendo que poderá ter tido um papel patriótico e até corajoso no modo como negou o apoio que Ricardo Salgado lhe foi solicitar antes da queda do BES – não obstante o contraponto posterior numa falência do BANIF que foi tudo mesmo clara e gerida em nome de interesses nacionais – e mesmo registando o facto de estar a revelar uma santa paciência de já quase uma década de aparente “pouca sede ao pote” no tocante a um eventual regresso à política – não obstante o faça disfarçando um manifesto desejo num desempenho de despojado salvador do País –, o certo é que sempre que ouço declarações de Passos não consigo nele perceber o quantum satisfatório de carisma, densidade e coerência de que vou à procura com sincero espírito de abertura.

 

Além do mais, a tal imagem que Passos decidiu construir para si próprio, rapando o cabelo e adotando uma postura marcadamente distante, enfática, pausada e supostamente compenetrada – assim como se o interlocutor da sua boca devesse esperar receber uma argumentação inigualável e incontestável porque muito refletida, fundamentada e esclarecida –, torna-o objetivamente menos convincente do que pretende e chega a roçar um lado algo dissimulado e caricatural. Esforçadamente, ainda fui atrás de alguns dos seus contributos publicados, nomeadamente em órgãos de comunicação social, mas também nunca deles obtive mais do que vulgaridades adaptadas às conjunturas (maioritariamente “laranjas”) em presença; o mesmo se diga sobre a sua atividade profissional, onde foram ficando na penumbra passagens por uma ONG vocacionada para a cooperação, pela consultoria no quadro da Tecnoforma, pela Fundação Ilídio Pinho ou pelo ensino superior privado; como primeiro-ministro, o que mais lhe vi foi alguma habilidade no manejo dos instrumentos ao dispor (com a imprescindível ajuda do maestro Miguel Relvas) mesclada com uma execução algo acéfala de instruções próximas ou exteriores.

 

Vem tudo isto a propósito da presença de Passos no almoço de ontem com os ex-líderes do PSD a convite de Luís Montenegro. À entrada, e com o primeiro-ministro a servir de emplastro, Passos aceitou falar à imprensa e fê-lo àquele seu novo jeito. O que disse? Nada menos do que postular “lapalissianamente”, embora com a devida pompa e circunstância, quanto o País carece hoje de estabilidade e reformismo – e, assim entalado o pobre Montenegro (segundo a leitura de alguns maledicentes) ou apenas assim informados os concidadãos de tão genial verdade do momento (segundo a leitura dos comentadores mais esperançosos e conscientes), lá seguiu Passos para o almoço a que aceitou juntar-se para não fazer feio e talvez memória futura.

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