(Há dias, no seu substack agora regular que substituiu a crónica no New York Times, Paul Krugman clamava que a devastação das inundações e cheias no Texas deviam ser também analisadas numa perspetiva política. Essa advertência tem todo o sentido, pois já vimos essa realidade noutras situações e noutros países. Assim aconteceu no Reino Unido, quando a fúria ideológica de redução da despesa pública do governo de Cameron-Osborne, prolongada com os governos seguintes, reduziu o investimento em infraestruturas nesse caso de proteção de cheias e inundações e reduziu efetivos de entidades com o dever de conceber alertas e atuar em conformidade nestas situações. As inundações no norte do Reino Unido foram então brutais e tiveram efeitos devastadores, encontrando nos “diques ideológicos” da redução de despesa pública as condições ideais para uma tempestade perfeita. O mesmo sucedeu no Estado do Texas, onde apesar da já costumeira acusação de Trump de que a administração Biden desguarneceu essa proteção, se percebe que a fúria da administração Trump contra a agenda climática é neste momento a grande responsável pelo facto do Governo Federal não ter atuado preventiva e posteriormente como se impunha. Obviamente que a Fox News se encarregará de distorcer a informação sobre o que se passou no Texas, ocultando que a desconstrução de toda a agenda climática americana deveria ser convocada para explicar aos Texanos que o pior poderia ter sido evitado, sobretudo as mortes, incluindo de crianças, registadas. Ignorando, por agora, os efeitos devastadores que a desconstrução da agenda climática tenderá a provocar nos estados mais vulneráveis, em que o Governo Federal deixou de ser um parceiro fiável e com quem se pode contar nas ocasiões mais difíceis, é importante que reflitamos sobre a necessidade de construir uma agenda climática que resulte da sábia combinação entre medidas de adaptação e medidas mais estruturais, identificadas, como sabemos, com a necessidade de reduzirmos acentuadamente as emissões de gases com efeitos de estufa e atacarmos de frente a questão do aquecimento global do universo. É um debate à margem do combate aos exercícios meramente ideológicos e negacionistas dos efeitos devastadores que a emergência climática está já a provocar. E o Texas nem era, à partida um dos Estados mais vulneráveis.)
Invoco para esse efeito um esclarecedor artigo publicado na Foreign Affairs por Alice C. Hill que nos alerta para o facto dos progressos inequívocos já alcançados com o avanço nas energias renováveis, que integra o campo das respostas estruturais à emergência climática. De facto, a multiplicidade e diversidade de manifestações já correntes da crise climática não podem ser escamoteadas: secas mais severas, ondas de calor cada vez mais frequentes (o exemplo do recente junho em Portugal é esclarecedor), níveis extremos de precipitação, fogos cada vez mais selvagens e descontrolados, subida evidente do nível do mar são exemplos de eventos, já hoje correntes, que podemos associar ao aumento das temperaturas. Isto significa que, sem abrandar a cruzada contra as energias fósseis, e nessa dimensão a atitude da administração Trump é criminosa, é necessário construir uma resposta consequente a um melhor tratamento destas manifestações extremas já correntes. A principal nota do artigo de Alice C. Hill é a de projetar a persistência de investigação científica e tecnológica e de inovação em geral na abordagem adaptativa aos tais eventos extremos correntes, abordagem incompatível obviamente com a fúria ideológica que a administração Trump e a falhada passagem de Elon Musk pela reorganização dos serviços públicos provocou. O que não significa de todo ignorar o papel da investigação científica e tecnológica na resposta mais estrutural das tecnologias verdes, como por exemplo a investigação na área das baterias para os veículos elétricos, na mitigação dos efeitos da introdução das renováveis, particularmente das eólicas, na rede de oferta ou no esclarecimento definitivo se a opção hidrogénio é para considerar ou afastar. O alerta de Alice C. Hill é preciso e está cheio de bom senso: “A luta para conter a devastação da mudança climática é na melhor das hipóteses preocupante, mas com progressos insuficientes na mitigação, mais aquecimento global estará garantido. Isso não nos deixa qualquer hipótese de escolha, a não ser a de seguir em frente na adaptação. Se os governos falharem na concretização dos investimentos necessários, a destruição provocada pela mudança climática continuará a ajoelhar as comunidades.”

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