sexta-feira, 7 de novembro de 2025

CASARAM E FORAM MUITO FELIZES...

(Peter Crowther, https://www.economist.com)

 

Muito interessante e relevante o tema de capa da última edição da “The Economist”, “a grande recessão relacional”. Trata-se da constatação do significativo incremento de pessoas solteiras no mundo desenvolvido e do debate em torno do modo como tal está a contribuir para mudar o mundo (em sentidos positivos e negativos). Os dados apontados explicitam informações como as seguintes: (i) entre os americanos de 25 a 34 anos, a proporção de pessoas que vivem sem cônjuge ou parceiro dobrou em cinco décadas, chegando a 50% para os homens e 41% para as mulheres; (ii) desde 2010, a percentagem de pessoas que vivem sozinhas aumentou em 26 dos 30 países desenvolvidos; (iii) mesmo no role model que se atribui aos países nórdicos, a tendência para o isolamento cresce (na Finlândia e na Suécia, cerca de um terço dos adultos vive sozinho) e impacta na respetiva taxa de natalidade; (iv) o mundo terá, pelo menos, 100 milhões de solteiros a mais hoje do que se as taxas de união conjugal se mantivessem ao nível de 2017.

 

A vertente analítica surge bastante mais dividida, tendendo a concluir que aquele aumento não é necessariamente bom ou mau. Com efeito, e se existe muito quem o veja como uma evidência de uma decadência social ou moral, ameaçando mesmo a civilização ocidental, há também quem o encare como um sintoma de uma libertação feminina que permite às mulheres independência financeira e escolhas individuais sem risco de estigmas sociais. Por outro lado, importará igualmente considerar possíveis efeitos colaterais, da solidão e suas consequências potenciais às “falhas de mercado” que se impõem a quem pretende encontrar parceiro(a) e se defronta com as expectativas e exigências irrealistas criadas pelas redes sociais, com os medos por estas alastrados, com o impacto delas em termos de quebra de competências sociais, com a realidade dos desfasamentos de género no plano formativo e cultural e em matéria de desencontros de valores (p.e., a deriva direitista dos homens vs. a inclinação esquerdista das mulheres – a este propósito, o “El País” forneceu-nos, há dias, dados bastante curiosos sobre a situação em Espanha) e com a inalterabilidade essencial de um insuportável comportamento masculino em casa, fora dela ou nas redes (manosphere).


Como quer que seja, a moral da história surge inapelável: “Muitos podem temer que um mundo com menos casais e crianças seja mais triste e atomizado. Contudo, o lamento dessa perspetiva não a evitará. E não cabe aos governos contrariar as preferências das pessoas comuns — embora certamente devam tentar combater o baixo desempenho escolar dos homens. Um futuro com muito mais solteiros está aí. Todos, desde empresas construtoras até aos contribuintes, fariam bem em se preparar para ele.”

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