sexta-feira, 7 de novembro de 2025

ESCLARECENDO INTERPRETAÇÕES

 

(Um Amigo de longa data, Rodrigo Meireles, e pelos vistos leitor atento deste blogue, teve a amabilidade de me enviar um comentário ao meu post sobre a rede transeuropeia de alta velocidade, que constitui uma excelente oportunidade de regressar ao tema e caracterizar com contornos mais firmes a minha interpretação daquele estado da arte. O comentário faz referência a que na minha interpretação existiria uma desvalorização implícita da valia estratégica da ligação Lisboa-Porto-Braga-Vigo-Corunha, entendida como o grande eixo estruturante da fachada atlântica ibérica e, a partir dela, da fachada atlântica europeia. Neste post, pretendo, não corrigir a minha interpretação, mas precisar o contexto de argumentação que me levou a concluir que muito dificilmente poderá ser mantida a opção anteriormente assumida de priorizar essa ligação relativamente à ligação Lisboa-Madrid. Esclareço que ao falar em não priorização não estou a transpor a ligação Lisboa-Corunha para as calendas, mas tão só a sublinhar que a conjugação das opções nacionais, ibéricas e comunitárias conduzirá muito provavelmente a inscrever as duas operações de investimento no mesmo plano temporal de investimentos a realizar, senão mesmo, à luz da programação comunitária, a conceder prioridade temporal ao Lisboa-Madrid.)

Podem dizer-me que estou a ceder ao realismo pragmático. Talvez isso possa acontecer. Mas a minha interpretação não desvaloriza de todo a importância estratégica de promover a estruturação ferroviária da fachada atlântica ibérica e a própria fachada atlântica europeia, bem necessitada de maior e melhor atenção para contrariar a inclinação para leste da dinâmica europeia. Claro que os maus ventos que sopram da América de Trump penalizam esta orientação, pois a valorização económica e política do Atlântico é tango para dois e se os EUA ficarem renitentes e desinteressados lá se vai o interesse estratégico dessa cooperação.

O que eu pretendi dizer é que os dois COM invocados na minha reflexão fundamentam o meu realismo pragmático a dois níveis: primeiro, porque a ênfase é colocada na necessidade de assegurar ligações rápidas entre as capitais europeias, em que essa opção clara e temporalmente programada para 2034 não se compadece com as especificidades ibéricas (bitolas, esse bicho estranho para a generalidade dos europeus, relações de conflitualidade política entre governos nacionais e regionais (caso típico de Espanha), atavismos, inércias e outros bloqueios endógenos (caso de Portugal); segundo, porque a rede ferroviária de alta velocidade não pode ser dissociada dos objetivos de redução das emissões provocadas pelo transporte aéreo: neste caso, é impossível ignorar o enormíssimo potencial de redução de emissões através da transformação de viagens de avião entre Lisboa e Madrid em ligações ferroviárias de alta velocidade e atrativas.

Claro que a plena transformação do potencial ao nível da fachada atlântica ibérica ferroviária depende das negociações entre o PP da Galiza e o esburacado PSOE do governo de Madrid. Ao ler os dois COM atrás assinalados, não pude deixar de ler com agrado que a Comissão Europeia não está disposta a que a lengalenga das bitolas se transforme em discriminação por barreiras técnicas da atividade empresarial e por mais que a argumentação portuguesa sobre as vantagens de evoluir mais lentamente da bitola ibérica para a bitola europeia seja hábil e tecnicamente fundamentada, penso que permanecer nesse plano dos “ses” e dos condicionantes vai acabar por nos penalizar seriamente.

 

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