(O sistema financeiro e a progressiva e descontrolada sofisticação financeira da vasta família de produtos que os mercados internacionais nos oferecem transformam a literacia financeira num ponto crítico da qualificação da sociedade civil e do seu juízo crítico sobre possíveis desmandos que a euforia dos mercados por vezes nos oferece. A preocupação pelo aumento dos níveis dessa literacia na população portuguesa tenho a sensação que já viveu melhores dias. Creio que Carlos Costa enquanto governador do Banco de Portugal se destacou nessa cruzada e existem ainda algumas iniciativas e projetos que procuram junto dos alunos do ensino básico e secundário manter essa chama, como é o caso da Fundação Cupertino Miranda, preparando desde cedo os cidadãos para um melhor entendimento e, por isso, melhor uso das oportunidades que o sistema financeiro vai oferecendo. O Financial Times, convocado por Adam Tooze, recorre a um inquérito promovido pela OCDE para avaliar qual é o nível de literacia nesse grupo de países, com data de 2022. O principal objetivo dessa convocação de evidência era para mostrar que a Itália ocupa o último lugar do grupo de países sobre o qual foi possível reunir respostas ao referido inquérito. Imaginaria que Portugal pudesse estar num lugar menos positivo, mas segundo o referido inquérito ocupa um lugar ligeiramente acima da OCDE, o que no cenário de inverno demográfico que o país vive não deixa de ser surpreendente.)
A literacia financeira é inquestionavelmente um elemento orientador fundamental das decisões que cada um tem de tomar sobre a aplicação das suas poupanças, isto obviamente para quem consegue retirar do seu rendimento anual pós-impostos algum dinheiro para aplicar e gerar algum rendimento suplementar. Os cidadãos colocam-se regra geral entre dois extremos, os que privilegiam a prudência e segurança das suas poupanças, caso evidente deste vosso Amigo, e os que se aventuram no desconhecido da sofisticação financeira não interessa agora com que padrão de assunção de riscos, se minimamente objetivo e baseado em evidência, se entregues à vertigem do aleatório.
Com base em informação proveniente do BCE, logo uma fonte distinta da do inquérito OCDE, é possível confirmar que existe uma relação entre o nível de literacia financeira e a propensão para conservar dinheiro na sua forma líquida. Contrariando em parte a informação proveniente do inquérito OCDE, Portugal aparece nesta correlação com um desempenho relativamente baixo em termos de literacia financeira, associado com base na referida relação, a uma propensão relativamente elevada para conservar dinheiro na sua forma líquida. Talvez a informação proveniente do BCE seja mais fidedigna do que aquela em que se baseia o gráfico que abre este post, no qual Portugal aparece numa posição ligeiramente superior à média OCDE.
O panorama de novo em formação para taxas de juro de depósitos bancários muito baixas atira os aforradores atraídos pelo risco baixo para as conhecidas aplicações em certificados de aforro. Existem aplicações de depósitos bancários de prazo médio ou curto que acabam por revelar-se enganosas, pois à terceira renovação a taxa fixa-se nos 0,25, dececionante para tempos em que a inflação não está ainda estabilizada plenamente em torno dos 2%, o que significa perder alegremente poder de compra como preço da aversão ao risco.
Qualquer incursão por terrenos mais arriscados exige solidez em matéria de literacia financeira. Só a segurança a esse nível permitirá avaliar objetivamente o risco das eventuais aplicações, até porque casos anteriormente observados no sistema financeiro português aconselham a prudência de estar atento às incorreções da informação de divulgação de alguns produtos, agravadas pela febre dos objetivos impostos aos funcionários bancários. Por maioria de razão, para quem utiliza exclusivamente as plataformas digitais para as suas aplicações financeiras só uma literacia financeira à prova de bala e dos ímpetos psicológicos mais fortes permitirá navegar com algum conhecimento do risco envolvido.


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