segunda-feira, 9 de junho de 2025

ECOS DE UM FIM DE SEMANA DESPORTIVO E NÃO SÓ

 

(À falta de melhor tema e inspiração para dar vida a um ecrã em branco do portátil e que respondesse ao compromisso de redigir mais um post neste blogue que já virou prática obsessiva, não sei sinceramente por quanto tempo serei de capaz de manter esta cadência reflexiva, lembrei-me de elaborar sobre este fim de semana, não na perspetiva da “insignificância” de ser português, mas de o fazer na perspetiva de alguém residente em Madrid ou pelo menos de sentimento castelhano. Nessa perspetiva, o fim de semana passado reunia um conjunto de emoções anunciadas sobre as quais vale a pena refletir, que não seja apenas pelo gozo particular de termos conseguido influenciar negativamente, na perspetiva castelhana claro está, o que estava anunciado. Explico-me. Por um lado, o PP de Nuñez Feijoo, cada vez mais acossado internamente pela rebeldia de Isabel Diáz Ayuso, que não hesitou em flirtar politicamente com o troglodita e inenarrável argentino Milei, promoveu mais uma megamanifestação para forçar o governo de Sánchez a eleições antecipadas, tirando partido das mais que sucessivas incongruências e desmandos políticos que o fim de festa político do poder do PSOE tem feito emergir na política espanhola. A contradição entre o desempenho macroeconómico da economia espanhola e a consistência governativa começa a tornar-se insuportável, já que para seguir as sucessivas tramas políticas que vão sendo cavadas é necessária uma atenção que não está ao alcance do comum dos mortais. E já não é uma simples relação entre Governo e oposição. A festança processa-se no âmbito da própria maioria parlamentar apelidada por muitos de solução Frankenstein e já envolve Tribunal Constitucional, Supremo Tribunal, Guarda Civil e sabe-se lá que mais. Por outro lado, a nível desportivo tudo estava encenado para a Espanha castelhana poder gozar um domingo para mais tarde recordar, antecipando-se a coroação de Carlos Alcaraz como rei da terra batida em Roland Garros e a vitória da Roja na Liga das Nações na Allianz Arena em Munique.)


 

Recordando agora o que se passou pode concluir-se que nem tudo foram rosas nesse fim de semana de glorificação da “espanholidade”.

A megamanifestação do PP pode ser entendida como um pau de dois bicos. As cerca de 100.000 pessoas que se concentraram nas imediações da Praça de Espanha (os símbolos também contam) deitam por terra qualquer tentativa de desacreditar a convocatória do PP. Já em tempos de quase verão, o poder manifestado de convocação de Feijoo e do PP parece dar razão à sondagens que anunciam que cerca de 70% dos espanhóis desejariam eleições antecipadas. Por outro lado, parecem confirmar que só Feijoo é alternativa real à liderança de Sánchez e que Ayuso pode esperar sentada para se impor como alternativa, a não ser nos decibéis com que estrebucha contra o governo de Sánchez. Mas quando a direita, neste caso presume-se que só a direita democrática encheu a Praça de Espanha, se afirma com tanta força, a fragilidade do suporte parlamentar do Governo pode dar origem a um toque de rebate, já que nenhum parceiro regionalista do Governo morre de amores pelo PP.

Veremos nos próximos dias o que a dinâmica de convocação de pessoas do PP irá trazer ao tempo político de antes de férias. Já perdi a conta aos sucessivos momentos em que a análise política em Espanha afiançou que o Governo de Sánchez iria cair. O jornalista mais esclarecido da direita democrática espanhola, Pedro J. Ramirez não hesita em afirmar no seu último editorial que “o objetivo estratégico deste movimento não foi o de arrastar Sánchez às urnas este outono, mas tão só ganhar oxigénio para aguentar mais dois anos na oposição”. Penso que está tudo dito.

O outro acontecimento passava-se em Paris e disputava-se o encontro mais esperado entre os dois mais geniais e jovens jogadores de ténis do momento, Carlos Alcaraz, murciano e Yannick Sinner, italiano do norte. Os espanhóis sabem que Alcaraz é por agora o rei da terra batida e o encontro não defraudou expectativas. Não me recordo de ter visto um jogo tão emocionante e denso de jogadas do outro mundo. A recuperação de Alcaraz é uma coisa para ficar nos arquivos do ténis, sobretudo num contexto em que Sinner não deu qualquer bónus ao espanhol (por exemplo, nenhuma dupla falta ao longo do encontro). As mais do que cinco horas que demorou o encontro levaram o resultado da vitória de Alcaraz até ao início do jogo da Roja com Portugal. Não foi por acaso que os jornalistas presentes na Allianz Arena referiram que alguns jogadores espanhóis acompanharam nos seus telemóveis as últimas incidências da vitória do impetuoso murciano.

Estava assim tudo preparado para o domingo perfeito com uma vitória da Roja sobre Portugal. O selecionador nacional Roberto Martinez quis fazer um favor aos espanhóis e continuou a inventar sujeitando o pobre e abnegado João Neves a uma espécie de suicídio anunciado. Mas temos de convir que a excelência da competência individual dos jogadores portugueses pode bem com qualquer perturbação tática do seu selecionador. E sobretudo o luxo do banco português supera de longe o banco espanhol. O estratosférico Nuno Mendes apareceu a fazer a diferença, reduziu o puto Lamine Yamal à sua insignificância inexperiente, jogou, marcou e fez jogar e Ronaldo, com as suas rugas cada vez mais visíveis, comeu de cebolada o “pequeno”e cabeludo Cucurella, afastando-o subtilmente da jogada para fazer o 2-2. Depois, foi a resiliência do costume, competência inexcedível nas grandes penalidades e uma vitória deliciosa para dar cabo da barriga cheia dos convencidos espanhóis.

Por tudo isto, deu-me bastante gozo “estragar” o domingo perfeito aos espanhóis. Fiquem lá com o Alcaraz, pois ele é de facto do outro mundo.

 

 

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