(Fiel à sua congénita imprevisibilidade e depois de afirmar que decidiria em duas semanas o que fazer com o Irão, envolvendo-se ou não intervindo, Trump ultrapassou convicto a linha vermelha do não envolvimento norte-americano e atacou, não se sabe com aviões B2 ou de outro modelo, três locais de instalação de atividades nucleares, mais propriamente a mítica instalação de Fordow em que se pensar estar a grande profundidade armazenado o arsenal nuclear do Irão e os centros de Natanz e de Isfahan. Consultando exaustivamente a imprensa internacional é impossível discernir se a basófia comunicacional está certa e se as referidas instalações nucleares foram efetivamente atingidas em proporções consideráveis ou se a opacidade comunicacional iraniana é a que estará certa. Mas, independentemente de saber se os alvos americanos estavam ou não bem caracterizados, o importante a destacar é saber se a intervenção americana no conflito vai conduzir a uma rápida intensificação do conflito de proporções não de momento imagináveis. Tudo dependerá da estratégia de retaliação das autoridades iranianas e, a esse nível, o que sabemos é que o Irão tem por vezes estratégias desconcertantes. Quando em 2020, os EUA mataram em território iraniano o comandante militar Qasem Soleimani, a retaliação iraniana surpreendeu muita gente, limitando-se a um conjunto relativamente contido de mísseis dirigidos a bases americanas na região. O que me parece hoje evidente é que, na situação de grande fragilidade económica e militar em que o Irão se encontra, e não sabemos que percentagem de instalações de envio de mísseis balísticos solo a solo terá sido destruída pelos ataques israelitas, o Irão não estará provavelmente interessado num confrornto de grandes proporções com os EUA.)
Existe por isso na imprensa internacional uma grande interrogação sobre o escalamento futuro do conflito e por isso a máxima do “rien ne va plus” dificilmente se aplicará, já que a indeterminação é total. Das notícias de hoje, parece não poder confirmar-se que a decisão parlamentar iraniana de autorização do encerramento do estreito de Ormuz, que provavelmente ditaria o envolvimento da marinha americana no conflito, tenha tido consequências práticas. Por outro lado, o único contra-ataque conhecido dirigiu-se a território israelita e até ao momento em que escrevo não há qualquer notícia de retaliação dirigida a bases americanas, mas nada disso é seguro. E para aumentar irremediavelmente a incerteza, há declarações do próprio Trump a sublinhar que se tratou de ataques seletivos, não necessariamente para continuar nos próximos dias.
Estamos, por conseguinte, no meio da indeterminação mais radical. Será que o ataque de Trump ao Irão mudou decisivamente as interrogações das autoridades iranianas em aceder a uma arma nuclear efetiva?
O que me parece também evidente é que o objetivo de destruição do regime teocrático iraniano através de ataques desta natureza é uma completa impossibilidade. Confundir o regime iraniano com as “proxies” do Hamas ou do Hezbollah é pura fantasia.
Qual será, por conseguinte, o real efeito da entrada dos EUA na guerra nas possíveis mudanças de comportamento do regime iraniano? Essa é que me parece ser a principal fonte de indeterminação. Mas se esta é a fonte real de indeterminação isso significa que a intervenção de Trump na guerra está ela própria assente num risco de grandes proporções.
A aceleração do tempo é vertiginosa.
Ainda há tempos discutíamos os efeitos na instabilidade internacional que poderiam decorrer da imprevisibilidade congénita de Trump. Ora aí está, estamos já no meio desses efeitos, a realidade foi mais rápida do que todas as nossas cogitações.

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