domingo, 9 de novembro de 2025

AS PRESIDENCIAIS DE 1986 (2)

(Elaboração própria a partir de https://www.sg.mai.gov.pt)

(Elaboração própria a partir de https://www.sg.mai.gov.pt) 

Volto ao tema fascinante das Presidenciais de 1986, focando-me agora na segunda volta entre Freitas e Soares. Primeiro, alguns dados determinantes: (i) a abstenção diminuiu entre os dois escrutínios, com o número de votantes adicionais a aproximar-se dos 200 mil; (ii) o conjunto dos votos à esquerda na primeira volta (i.e., dos apoiantes de Soares, Zenha e Pintasilgo) excedeu a votação em Freitas em cerca de 420 mil eleitores, o que justifica que a estratégia de Soares tenha derivado de um “inimigo principal” à esquerda (Zenha e os comunistas) para um esforço hercúleo para captar os votos assumidamente fidelizados pelo PCP; (iii) Freitas logrou aumentar a sua votação em 236 mil pessoas na segunda volta, com a curiosidade de que esse aumento ocorreu – em dimensões obviamente diversas – em todos os então 305 concelhos do País, exceto Góis (onde perdeu 264 votos contra um aumento de 529 de Soares); (iv) já Soares apenas aumentou votação em 171 municípios (contra 134 em baixa), o que traduziu resistências de maior ou menor monta em inúmeras zonas do País; (v) nesta linha, registo para o facto de que apenas 4 concelhos (Lisboa, Porto, Loures e Sintra) contribuíram mais significativamente para o crescimento de Freitas entre os dois atos, cabendo a 19 (quase todos cidades de grande ou média dimensão) um contributo superior a 1% e atingindo cerca de um terço do total; (vi) quanto a Soares, foram 18 os concelhos de evolução mais favorável entre escrutínios (de diferentes localizações e escalas, entre Guimarães e Funchal à cabeça, Braga e Coimbra, Famalicão e Santo Tirso ou Lousada, Baião e Seia) e 19 aqueles cuja dinâmica desfavorável se revelou mais marcante, logo onde a recomendação de Cunhal (“olhos tapados” no momento de colocar a cruz no boletim) terá sido menos seguida (concelhos localizados no Alentejo – Odemira, Évora e Santiago do Cacém –, e bastante concentrados na Grande Lisboa a sua área de influência – Palmela, Montijo, Vila Franca de Xira, Cascais, Moita, Seixal, Setúbal, Oeiras, Amadora, Barreiro, Sintra, Almada, Loures e Lisboa –, sendo exceção mais clara a de Viana do Castelo e o caso muito especial da Marinha Grande); neste último âmbito, uma curiosidade surpreendente traduzida no facto de a Capital ter contributo em metade para a perda por parte de Soares de mais de 31 mil votos em relação ao total da esquerda na segunda volta. Eis o que se me apraz hoje a respeito de um ato eleitoral que marcou para sempre a política nacional e no qual a lucidez visionária de Soares se impôs perante a ingenuidade bem-intencionada de um Freitas injustamente tratado pela força esmagadora da realpolitik.

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