(Este é talvez um dos títulos mais enigmáticos de escritos para este blogue. Perdoem-me tê-lo escrito em castelhano, mas a verdade é que ele me veio à mente nessa forma e por isso quis ser fiel a essa intuição. Obviamente que se percebe tratar-se de mais uma incursão pela política espanhola, sendo talvez o termo por mim inventado de “mazoneria” o mais enigmático. Mas eu explico. O termo está associado a um político espanhol, Carlos Mazón, presidente da Comunidade Valenciana e que esteve, ainda está, sob a fúria dos protestos dos valencianos pela inépcia que revelou na gestão dos temporais trágicos que assolaram aquela comunidade autónoma do Mediterrâneo espanhol. Não se trata, por isso, de qualquer incursão pelo mundo da maçonaria, isso de aventais só para uma boa refeição e é preciso proteger o vestuário, problema de velhos. A importância dos dramas em torno de Mazón é algo que está já para lá da calamidade que assolou a Comunidade Valenciana para se transformar no coração dinâmico da política espanhola, que não cessa de nos surpreender e que é cada vez mais um caso de estudo da complexa relação entre o centro-esquerda, o centro-direita, a direita e a extrema-direita xenófoba, nacionalista e provocadora. É nessa perspetiva que o tema me interessa.
A ascensão de Mazón na política espanhola e a responsabilidade pelas agruras do PP de Feijoo têm origem na sua vitória nas eleições regionais, destronando uma coligação que integrava o PSOE e regionalistas valencianos. Mas não é essa vitória que está na origem dos problemas do PP com o líder regional. Os problemas surgiram quando, ainda se festejava a vitória do PP e Mazón celebrava à revelia de todos um acordo de governação regional com o VOX de Abascal. Como se compreende, a celebração de um acordo efetivo de governo, ainda que a nível regional, é um verdadeiro pitéu para a política de resistência do PSOE no poder, cuja coligação com os independentistas está hoje completamente esburacada. Tal como sempre previ, o Junts per Catalunya não é força que se convide para jantar em nossa casa, nem sequer para nela entrar a título de mera cortesia. Não é uma força fiável, nem ela nem o seu líder das franjinhas exilado em Bruxelas. O catalanismo de direita do Junts é das formações menos fiáveis em Espanha e quem com ela acorda alguma coisa sai sempre de calças na mão, como está o governo espanhol, totalmente bloqueado na sua ação legislativa pela quebra de confiança e saída deste membro da coligação independentista.
Regressando ao assunto Mazón, como seria de prever a tragédia da Comunidad Valenciana foi tão dramática e causou tantas mortes e infelicidade que dificilmente a inépcia do líder regional lhe evitaria a demissão. E foi isso que aconteceu depois de uma inenarrável sequência de disfarces e recuos que procuraram evitar a demissão. O problema é que a demissão aconteceu, mas acompanhada da decisão também oportunista de não convocar eleições, o que para todos os efeitos significava deixar a situação nas mãos do VOX de Abascal, que passa a partir de agora a controlar o timing de uma possível convocatória de eleições regionais. A posição do PP de Feijoo nesta matéria foi esquiva e, como é seu timbre, nebulosa. Percebeu-se que Mazón foi sucessivamente pressionado para apresentar a demissão, mas Feijoo nunca transmitiu a ideia de que pretendesse a antecipação de eleições. Na prática, isto significa que, no caso mais relevante de governação conjunta com o VOX de Abascal, o PP de Feijoo está submetido incondicionalmente aos ditames deste último, por mais discursos circunstanciais que este possa produzir para reafirmar a sua autonomia face à extrema-direita espanhola.
Este aperto em que Mazón colocou Feijoo, ou em que este se deixou embrulhar, é música celestial para os ouvidos de Pedro Sánchez, sistematicamente encurralado para convocar eleições que seguramente no momento atual o afastariam da governação. Como o sempre perspicaz jornalista galego Fernando Salgado entendeu, temos assim os dois contendores da política espanhola procurando controlar o tempo de eleições antecipadas de diferente natureza, mas com a desvantagem de Feijoo estar dependente dos caprichos do VOX. A “mazoneria” de Feijoo começou afinal na precipitada coligação que o líder valenciano consumou com o VOX, uma espécie de pecado original que vai perseguir o PP nos próximos tempos e do qual parece não haver salvação possível, por mais confissão e peregrinações que possa concretizar.
Estamos todos a imaginar o tipo de campanha eleitoral que o PSOE vai conduzir, não sabemos se em 2026 ou no dealbar de 2027, já que governar sem orçamento, bloqueado na ação legislativa e tapando buracos numa coligação cada vez mais esventrada não tem uma elasticidade infinita. Claro que o sempre oportunista Junts já piscou o olho por várias vezes ao PP de Feijoo. Tudo é possível com o oportunismo e não fiabilidade. Mas a Catalunha não para de nos surpreender. Também já existe e em franca progressão uma força regionalista de extrema-direita, a Aliança Catalana. Dele, a IA diz-nos: “A Aliança Catalana é um partido político independentista catalão de extrema-direita, fundado em Ripoll em 2020, liderado por Sílvia Orriols que defende o protecionismo económico, a separação entre Estado e religião e a economia de mercado, posicionando-se contra o bilinguismo e a imigração”.
Temo dizer-vos, caros Amigos, que isso de associar o catalanismo a uma visão progressista da Espanha e do mundo foi provavelmente chão que já deu uvas, mas que está seco. De um certo modo, a história nunca nos engana.

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