segunda-feira, 7 de julho de 2025

A FATURA DE TRUMP

 


(Já alguns dias que não zurzimos as alarvidades políticas do Presidente norte-americano, não porque o homem esteja mais apagado, mas apenas porque a maior intermitência de animação deste blogue pela minha parte me tem afastado do azedume de comentar tanta boçalidade junta. A fatura a que me refiro é a que a administração Trump está a dirigir ao povo americano, agora que, como o admiti, a sua BILL ou orçamento passou os trâmites legais no Congresso, sendo transformada em lei no dia 4 de julho. A fatura que a lei de enquadramento das receitas e despesas da administração Trump vai impor aos americanos é dura, a ponto que os Republicanos que a votaram têm manifestado a sua preocupação com as consequências eleitorais que as referidas atrocidades legais poderão provocar no seu eleitorado. Ó hipocrisia e cobardia extremas – se estavam assim tão preocupados com a fatura futura então deveriam ter conseguido uma maioria de rejeição. Trump não parece muito preocupado com esses riscos eleitorais, joga nos ganhos de momento e prepara uma trapaça qualquer para influenciar o voto das próximas eleições intercalares, até porque a vitória nas primárias democratas em Nova Iorque, dando a vitória a um candidato mais de esquerda e mais radical, implicará em meu entender um longo debate entre os democratas mais conservadores, fazendo com que se apresentem nas intercalares ainda sem rumo certo para uma estratégia de vitória. Os indícios de que o “privilégio exorbitante” da dominância do dólar na economia mundial começa a perder força também parecem não tirar o sono a Trump, preparado para ameaçar os países que se aproximem dos BRIC com novos aumentos de tarifas. E a procissão ainda não chegou verdadeiramente a sair do adro.)

Os cronistas Ryan Cooper e David Dayen do American Prospect, que tem feito uma marcação impiedosa às alarvidades da política trumpiana redigiram uma crónica interessante sobre as dimensões mais bizarras da lei de enquadramento orçamental. De facto, existem mais matérias chocantes do que as mais conhecidas orientações de reduzir impostos a favor dos mais ricos e de cortes no sistema de saúde americano que irão provavelmente gerar uma série de encerramentos de instituições hospitalares, agravar as já dramáticas condições de esperança de vida das populações mais desfavorecidas, brancas, negras, asiáticas e hispânicas. Essas alterações eram anunciadas e são a imagem de marca dos chamados bastardos de Hayek, para recordar aqui a crónica que dediquei ao trabalho de Quinn Slobodian.

Os dois cronistas documentam uma série de bizarrias malévolas, mais insidiosas e sobre as quais Trump ou não tinha feito qualquer menção, ou até produzira considerações contraditórias com o agora aprovado, perante a impotência democrata e a venalidade dos Republicanos não críticos.

É o caso, por exemplo, da habilidade de fazer recair nos Estados a cobertura orçamental adicional de alguns cortes nos suplementos de ajuda alimentar agora decretados, sempre na eterna linha de penalizar os mais necessitados. No Senado, foram propostas algumas isenções a essa necessidade dos Estados suprirem os cortes federais, mas os critérios estranhos assumidos por alguns senadores para proteger os seus Estados conduziram à bizarra situação de beneficiar os Estados com mais irregularidades de despesa certificada.

Num país que glorifica as armas como instrumento de defesa, subsistia no tempo uma penalização fiscal pela compra e utilização de silenciadores, taxa que foi agora abolida, enquanto as necessidades de registo dessa utilização de silenciadoras nas armas pessoais foram também eliminadas. Uma benesse para os amigos.

O que também parece ser o caso de atribuição de isenções fiscais por parte dos municípios à construção de rampas de lançamento (space ports), o que para os cronistas só é explicável pelo facto de uma empresa espacial da Flórida o pretender. Mais benesses seletivas.

Em linha, com a proteção descarada aos financiadores da sua campanha com origem nas indústrias petrolíferas e de extração de gás, foi também consagrada uma isenção fiscal para as empresas que deixam de pagar a taxa mínima de imposto. Além de cortar com toda a política ambiental da administração Biden, a administração Trump consagra uma vasta subsidiação à extração de carvão e arrendamento de terras para a sua extração. Autorizações para uma vasta área de terra para esse fim foram concedidas e a taxa de royalties reduzida de 12 para 8%. Fartar vilanagem …

E as bizarrias malévolas não ficam por aqui.

É um orçamento e não uma fatura. Mas as consequências da bizarria global e das bizarrias mais seletivas implicarão futuramente uma fatura dificilmente dedutível.

 

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