domingo, 25 de maio de 2025

A QUEM SERVE UMA REVISÃO CONSTITUCIONAL AGORA?

 
(Andrés Rábago García, “El Roto”, http://elpais.com) 

A verdade pura e dura é que este país perdeu o bom senso! Já não bastava a forma como o portuguesinho adotou politicamente as dores da desesperança, da solidão e da ignorância (para citar José Pacheco Pereira) e se deixou encantar por um demagogo de má qualidade, parece que vamos começar agora a correr atrás do oportunismo da cartilha liberal colada com cuspe que Rui Rocha agita a torto e a direito, qualquer que seja o assunto em análise. Este posicionamento doutrinário só encontra a recetividade que lhe vai sendo concedida no egoísmo que se apoderou das nossas elites, cujas únicas grandes preocupações passam hoje pelos impostos que lhes cobram (ou assim dizem que acontece), com a inerente diminuição marginal de rendimentos que alegadamente os afeta, e pela continuidade das condições que têm permitido o seu enriquecimento por via da especulação imobiliária e turística que impera em Portugal. Sendo que é óbvio o objetivo complementar que une toda esta gente em torno de um ataque primário ao Estado e ao seu lugar na sociedade, o que é inenarrável à luz do conhecimento adquirido quanto ao papel da ação estatal no desenvolvimento harmonioso dos países – e todos os exemplos relevantes à escala internacional o demonstram à saciedade! –, e não pode buscar razão de ser na estrita constatação de maus funcionamentos detetáveis na esfera da gestão pública.

 

Vem todo este arrazoado a propósito da revisão constitucional que se anuncia à direita, ainda que o PSD não se tenha ainda pronunciado claramente sobre a matéria e sobre o ponto até ao qual se deixará capturar por agendas primárias (IL) ou extremistas e visando a destruição do regime prevalecente (Chega). Dir-me-ão que a atual Constituição enferma de vícios de forma que decorrem do seu caráter datado de quase cinquenta anos, com o que concordo não sem contrapor o facto de tal não ter nunca obstado aos avanços económico-sociais que foram ocorrendo no país. Ou seja, a questão deveria merecer atenção cuidada e programada, com o PSD a garantir a salvaguarda dos grandes equilíbrios vigentes, de modo a evitar o riso de uma centralidade de agendas perigosas e potencialmente incontroláveis, com os nossos liberais a tornarem-se nos obreiros voluntaristas de caminhos sectários e românticos que querem ver impostos e a acabarem essencialmente marginalizados numa servidão a interesses condenáveis.

 

Daqui apelo à moderação das forças democráticas tradicionais para que não se deixem iludir. A derrota do PS e a sua perda de expressão na cena política nacional não deveria dar lugar a um embandeiramento em arco por parte da algum PSD sequioso de pequenas vinganças. Porque é aqui que reside o busílis da grande questão política dos próximos tempos em Portugal – de facto, só com um PS renovado e focado e uma IL limada das arestas infantis que a definem será possível que cheguemos, meio século depois de abril, à normalidade de democracias mais exemplares onde os ideários social-democratas, democratas-cristãos e liberais convivam entre si, sem prejuízo de outras representações mais atinentes a causas específicas e de uma eventual presença da extrema-direita limitada à sua justa medida. Estarei a ser lírico ou apenas a apontar um sentido salvífico em que ainda consigo rever-me?

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