terça-feira, 6 de maio de 2025

REGRESSO ALGO PENOSO ÀS LIDES DOMÉSTICAS

 


(Depois de no domingo à noite ter viajado de carro do aeroporto de Lisboa até casa, com a segunda-feira a servir de readaptação ao trabalho, eis-me aqui de novo agora no Alfa em direção a Lisboa, com problemas no wifi da CP para me certificar que o regresso aos nossos problemas é mesmo efetivo. O regresso é tanto mais penoso quanto reconheço que sou peixe fora do aquário em matéria de campanhas eleitorais. Há qualquer coisa no ritual das campanhas que me irrita e incomoda, o que é estranho para alguém que gosta do debate político e se entusiasma com a argúcia da argumentação. A sensação que tenho das campanhas é a de que estamos perante algo simultaneamente cansativo e penoso, um ritual que serve para marcar o tipo de presença na comunicação social, imprensa, rádio e televisão. A verdadeira relação não é a que se processa entre candidatos e eleitores, mas a que se desenvolve entre o discurso dos políticos em campanha e os jornalistas que editam os ecos do modo como os políticos se apresentam ao eleitorado. Os jornalistas louvam este período, pois deixam em parte de andar a reboque das redes sociais para adquirir algum poder de marcar o tom da campanha. É pois neste ambiente de pessimismo envelhecido que organizo estas notas de reflexão, que não tem qualquer pretensão de serem exaustivas, pois o pouco tempo que tenho dedicado à cobertura das diferentes campanhas não é suficiente para ter essa pretensão, tanto mais que tenho a convicção de que, por mais consistentes que sejam os esforços das forças políticas mais representativas, os verdadeiros problemas que a Europa e o mundo hoje nos trazem ficarão por conveniência fora das mensagens eleitorais. A sensação do faz de conta instala-se e embora a nossa periferia geográfica nos ajude a esquecer a agrura dos problemas fico sempre com a sensação de que já chega de tanta especificidade e vontade de ignorar o que nos espera à beira-mar plantados.) 

Sem querer ser ave agoirenta e antecipar a sensação de votar derrotado no PS, estas eleições e o que a campanha nos vem trazendo sugerem-me que a AD se movimenta num quadro macroeconómico completamente irrealista, aliás já confirmado pelo crescimento da economia no primeiro trimestre de 2025. O ministro das Finanças Miranda Sarmento não é de facto uma grande espingarda e parece confundir o que são os estímulos de muito curto prazo de algumas medidas sobre o crescimento económico com a tendência estrutural que estamos a atravessar. O minguado crescimento do 1º trimestre mostra essa evidência, mas isso não impede que Montenegro e seus pares mais próximos, apoiados por toda a tralha política do PSD, Cavaco e muitos outros, até alguns ressuscitados das trevas como Fernando Nogueira, continuem a vangloriar-se de que estamos a navegar com ventos de feição, miraculosamente acionados pelo governo minoritário.

Mas tenho para mim que o eleitor mediano considera os dados macroeconómicos algo demasiado abstrato, podendo por isso existir uma gama ilimitada de dissonâncias entre o que os dados macroeconómicos nos revelam e o modo concreto como eles se materializam nos bolsos dos eleitores.

Para lá das cenas macroeconómicas, o que me parece é que Montenegro parece estar a ver sua teimosia de ignorar a sua falta de ética política com a longa história da SPINUMVIVA ser ganhadora. Não é que os eleitores não percebam que o primeiro-Ministro se meteu por atalhos pouco recomendáveis. O problema é que parece cada vez mais que os eleitores não valorizam essa falta de ética na gestão dos conflitos de interesses. Bem lá no fundo, o estatuto de videirinho é apreciado pela maralha mediana. Montenegro terá intuído isso mesmo e depois um mano-a-mano com Tony Carreira ajuda a distender o ambiente. A maneira jovial como Montenegro se movimenta por estes dias é seguramente o produto da convicção de que para o eleitor médio a SPINUMVIVA é um não-problema, um deslize que o eleitor está disposto a esquecer a troco de alguma coisa e o cardápio mais ou menos demagógico de medidas tem tudo e para todos os gostos.

À luz dos critérios apressados que o populismo político costuma elaborar, farei parte da tal elite que esse populismo tanto odeia, por entender que não compreendemos o povo. Ora, seguindo esse critério, devo reconhecer que me enganei. Nunca imaginei que a irresponsabilidade ética e política de Montenegro fosse tão desvalorizada, a ponto de aparentemente não gerar qualquer impacto político em matéria de resultados eleitorais. Nessa perspetiva, continuo a não compreender o tal povo, confirmando-se o entendimento dos populistas. Por isso, começo a antever que irei votar derrotado e que a possibilidade de uma maioria, senão absoluta, pelo menos confortável entre a AD e a IL, poder gerar uma solução governamental se avoluma.

Existirá aqui a tentação alimentada por muitos de que isso será devido não à desvalorização política dos conflitos de interesses em que Montenegro se deixou mergulhar, mas também à não suficiente afirmação política do PS de Pedro Nuno Santos. Já compreenderam que não sou um entusiasta apoiante de PNS, mas neste caso acho que será injusto assacar-lhe culpas por esta convergência entre o eleitor mediano e a videirinha maneira de fazer política de Montenegro. PNS entendeu como a esmagadora maioria do comentário político o considerou que a prática de Montenegro não é digna de um primeiro-Ministro e por isso o trouxe para o debate político. Teria feito o mesmo com convicção, pois estas eleições resultam dessa teimosia e nada mais. Todos compreendemos que a chegada ao poder no PS de PNS não aconteceu no tempo mais adequado e que a sua procura de empatia com o eleitorado exigiria um outro tempo de maturação. Mas as coisas são o que são e os tempos políticos não afastam, felizmente, a imprevisibilidade e a necessidade de correção de trajetórias.

Mas há questões estruturais que já não é possível resolver para estas eleições e às quais o PS continua a não querer dar resposta, não sei por teimosia, se por preguiça mental da inteligência política do partido.

Uma delas é a minha convicção de que o PS não estabilizou ainda a sua visão do mundo empresarial, o que não deixa de ser estranho quando PNS tem uma história familiar empresarial atrás de si. Quem quer ser alternativa de poder não pode ignorar esta questão e isso não significa aderir ao princípio de que entre a AD e o PS não pode haver diferenças nesta matéria. Nada mais errado. Há um monte de possibilidades de fazer a diferença entre o “pro-business” da AD e um possível “pro-market” que o PS poderia protagonizar, o que teria de passar por muito mais e melhor atenção à democracia nas empresas e nas suas estruturas de decisão.

Uma outra é a inexplicável incapacidade do PS renovar os votos de confiança com o eleitorado mais jovem. A minha explicação para isto está nas personalidades dos nomes políticos mais jovens que vão aparecendo nas listas e nas cenas mais mediáticas. É gente demasiado certinha e aprumada para meu gosto e creio que também para o eleitorado mais jovem. Essas personalidades surgem demasiado conotadas com os jogos dos interesses partidários, especialistas no esgrimir das oportunidades que a filiação partidária vai proporcionando. O que para jovens às voltas com a procura de casa e de um emprego com salário decente em linha com a sua qualificação é o primeiro passo para o afastamento. O PS parece acomodado com este facto e com a ideia de que o seu palco eleitoral é o do cidadão envelhecido. O que me parece ser um cartão para a futura irrelevância política, principalmente porque esse eleitorado envelhecido vai desaparecendo e sem renovação.

Oxalá me engane nestas minhas reflexões de pessimista envelhecido.

Mas se votar derrotado, terei sempre a convicção de que no dia 18 terei mais um ano em cima do lombo e por agora ainda em condições físicas e mentais decentes para a idade. Sempre poderei comemorar alguma coisa.

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