quinta-feira, 12 de junho de 2025

SOBRE AS PRESIDENCIAIS

 


(Ainda como sequela próxima dos resultados eleitorais de 18 de maio e da consequente importância que a essa luz as próximas eleições autárquicas de repente assumiram, sobretudo para o PS que busca nas mesmas um dique de resiliência que contenha a perda das legislativas, as Presidenciais do próximo ano passaram para um plano mais secundário, desvalorizando negativamente uma das eleições de maior espontaneidade popular. Imagino que os candidatos que se perfilaram demasiado cedo talvez estejam disso arrependidos, sobretudo porque arrancaram com um contexto e terão de adaptar-se a um outro bastante diferente, mesmo admitindo que havia tendências já demasiado claras para serem ignoradas. Um outro risco, e esse considero-o bastante nefasto, é a possibilidade de a candidatura do Almirante gerar um sentimento de vitória antecipada, que quebre o ânimo dos seus adversários e transforme a contenda num contributo mais para o pântano democrático que paira sobre o sistema político português. Vamos admitir, esperançosamente, que as Autárquicas venham baralhar as tendências de maio passado, trazendo por via da relação de proximidade alguma animação na perspetiva de contra a corrente dos acontecimentos mais próximos, abrindo caminho a um debate mais aceso que dê algum sentido à escolha do novo Presidente.)

De todos os concorrentes com lançamento já mais robusto de candidaturas, Marques Mendes é aquele que está em lençóis de pior qualidade. Paira sobre ele a nuvem de não conseguir sequer fixar o eleitorado da AD, apesar do apoio formal do 1º Ministro Luís Montenegro que comprometeu o partido nesse apoio. Alguns senadores daquela área política parecem estar seduzidos pela farda do Almirante e ninguém imaginaria que o revanchismo de Rui Rio desse para se envolver num lugar de mandatário da candidatura do mesmo Gouveia e Melo. E temos de convir que, apesar da preparação de contexto que a SIC lhe proporcionou com o seu programa de comentário político aos domingos, o discurso que Marques Mendes tem trazido para sobressaltar os portugueses é de uma confrangedora sensaboria, frequentemente um chorrilho de boas intenções, sobre o qual não se consegue reter uma ideia forte que seja. Estou convencido que Marques Mendes não tem densidade para inverter esta situação e não será seguramente com ele que se abrirá uma via qualquer para contrapor à tendência de notoriedade eleitoral do Chega e à sonsa capitalização desse contexto que a candidatura do Almirante vai protagonizar com a falsa argumentação do interesse nacional.

Posso admitir que a maior exposição pública de Gouveia e Melo vai acabar por tramá-lo nas suas contradições mais salientes, mas nem com essa abertura de fissuras na imagem pública do Almirante acredito que Marques Mendes possa capitalizar alguma coisa em termos de animação da sua própria candidatura.

É neste contexto que pode suceder algo de contrário à candidatura de António José Seguro. Contrário no sentido de que enquanto Marques Mendes dificilmente inverterá a tendência de esvaziamento dos seus propósitos iniciais, já no caso de Seguro as baixas expectativas com que arrancou podem proporcionar um ambiente de enchimento e não de esvaziamento. E aqui penso estar a gerar-se um paradoxo de difícil entendimento. O posicionamento de gente com notoriedade no PS, caso por exemplo de Augusto Santos Silva e de Mariana Vieira da Silva, com rejeição liminar do apoio a Seguro, penso que apenas contribuirá para o agravamento do declínio do PS, mas paradoxalmente poderá dar a António José Seguro algumas oportunidades. Dou neste momento de barato que, com o caldo entornado das eleições de maio passado e com as tendências mais profundas que nelas se ocultam, uma eventual candidatura de António Vitorino não terá qualquer chance de vingar. Isto não significa que acredite que Seguro tem mais desenvoltura e peso político do que Vitorino. Antes pelo contrário. Mas o rasto de lobismo que Vitorino traz consigo é-lhe, em meu entender, fortemente desfavorável. E dessa matéria lobista Seguro está sem mácula.

O acontecimento mais forte que poderia conduzir a candidatura de Seguro a um esvaziamento similar aquele que paira hoje sobre a de Marques Mendes seria dado pela emergência de uma candidatura unitária à esquerda do tipo da que Sampaio da Nóvoa protagonizou. Não tenho qualquer informação relevante que me permita dizer que Nóvoa se candidate ou não, apesar de ser seu Amigo e ter participado na sua própria campanha. Tenho dúvidas que essa possibilidade ocorra, mas a acontecer seria fortemente destrutiva para as aspirações de Seguro.

Em síntese, caso não ocorra a tal emergência de uma candidatura forte e unitária à esquerda, dar-se-á o paradoxo das características que associávamos ao inêxito potencial de Seguro poderem transformar-se em capital de apreciação positiva pelo eleitorado. A dimensão do paradoxo é preocupante. Não é isso que salvará o PS do plano inclinado, mas do ponto de vista das aspirações de Seguro e do que pretenda passar para o eleitorado pode acontecer que o favoreça.

É estranho, não é? Sim, é bastante estranho e o PS mais impetuoso que acaba de ser derrotado das urnas com algum estrondo ainda não compreendeu este paradoxo. Oxalá acordem a tempo.

 

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