terça-feira, 30 de setembro de 2014

O DEBATE DO MÊS

Podíamos tranquilamente ter optado pela interminável discussão observada em torno dos diferentes e sombrios incidentes produzidos no Novo Banco, com Passos e Albuquerque (acima apelidados por António de Monsieur et Madame Butterfly) afinal bem mais presentes do que quiseram deixar transparecer ao início.

(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)

Podíamos também ter corrido atrás das desculpas surpreendentemente apresentadas pelo educador Crato, sobretudo na procura de um adequado esclarecimento de qual das respetivas declinações melhor correspondência teria com a tão louvável e piedosa atitude ministerial.


Podíamos obviamente ter escolhido a escalada confrontacional entre Costa e Seguro à medida que se foi aproximando a data da ida às urnas no interior do Partido Socialista, designadamente aqueles episódios de gosto mais duvidoso ou de interpretação menos edificante.


Mas aquele “nós confiamos na palavra do primeiro-ministro” com que Portas veio categoricamente pôr uma pedra definitiva sobre um assunto tecnofórmico que desde há anos vinha afligindo Passos sem que este fosse capaz de lhe encontrar uma saída airosa, arrasou qualquer veleidade de debate e foi de homem em toda a imaginável plenitude do sê-lo...

BOA, MOEDAS!


Esta manhã, ouvindo o hearing a Carlos Moedas, confirmei quanto de bom aparelho digestivo e qualidade de rins é necessário para se chegar com sucesso à devida ocupação de certos lugares públicos. E não o digo com qualquer sentido crítico, antes com a admiração de quem sabe que não seria capaz, seja por uma qualquer coerência absurda, por falta de lata bastante ou por insuficiência de verbo à altura.

Cito três exemplos eloquentes. O primeiro foi aquele momento inolvidável em que o menino Carlinhos (ele que me perdoe a meiga liberalidade de lhe chamar assim...) respondeu a um outro Carlos que ele seguramente ou tanto despreza ou tão pouco aprecia (Zorrinho em concreto) que vai ser fiel à “mensagem” que este “começou a passar em Portugal” e que é também a sua – e logo mereceu de Zorrinho um tweet a seu favor! O segundo teve a ver com os ataques que lhe dirigiu Marisa Matias sobre a sua participação central no programa de ajustamento da Troika, aos quais Carlinhos retorquiu: “Foram sacrifícios enormes e eu conheço-os bem, porque os conheço ao nível familiar, ao nível dos meus amigos, e a senhora deputada também. E eu sempre reconheci a dureza e o sacrifício que esse programa foi. Mas Portugal estava num momento em que precisava de dar a volta à sua credibilidade e mostrar àqueles que nos emprestaram dinheiro que era um país credível.” E, para que não restassem dúvidas ainda quis acrescentar para o caso de não se ter notado: “Eu muitas vezes estive em desacordo com a Troika”! O terceiro veio da até agora desconhecida dimensão heterodoxa de Carlinhos que, sem rebuço, jurou a um eurodeputado interrogante que as ciências sociais são muito importantes, especialmente a nível do património cultural, e que devem ser incorporadas a um nível global na investigação e inovação, pois então!

Mas não se conclua do atrás referenciado que Moedas tenha estado mal na sua prova oral. Pelo contrário. Além de arrependido, mostrou-se aplicado e competente, capaz mesmo de se vir a tornar um bom comissário. E se privilegiarmos uma lógica de tipo comparativo, são tanto os trastes que querem vir a ser seus pares que quase podemos patrioticamente orgulhar-nos da flexível prestação do nosso Moedas...

IEKE


Acabo de saber do desaparecimento prematuro de uma grande agente política holandesa, membro do Partido Trabalhista e ex-eurodeputada. Ieke van den Burg destacou-se sobremaneira quando, no quadro do PSE e antes da plena irrupção da crise das dívidas soberanas, lutou denodadamente por tomadas de posição em favor da transparência dos mercados financeiros e de uma mais eficaz regulamentação das suas práticas especulativas – o relatório de 2007 que dá pelo seu nome ficará a marcar historicamente uma época de viragem no progressismo europeu. E já não iremos a tempo de nos juntarmos nesse  vosso “North Sea Jazz Festival” de Roterdão, Ieke!

CAVACO? ERA DEFESA

(José Bandeira, http://www.jn.pt)

O nosso queridíssimo líder e presidente é definitivamente um enorme catalisador de energias positivas. Então não é que ficamos agora a saber quanto ele também ajudou à conquista portuguesa do título europeu de ténis de mesa ao ter dado o seu inexcedível contributo praticando exemplarmente a modalidade de pingue-pongue. A nossa gratidão, caríssimo Aníbal...

MAIS OCCUPY


Acima, uma foto reveladora do que vem acontecendo numa cidade de Hong Kong em luta reivindicativa pela democracia. Com variados grupos estudantis envolvidos e o movimento “Occupy Central” de Joshua Wong a lançar uma campanha de desobediência civil, with love and peace, contra a incumprida promessa de "um país, dois sistemas" por parte do regime de Beijing. Abaixo, o essencial do que está em causa – quão premonitório?


(Michael Morgenstern, http://www.economist.com)

(Jeremy Banks, “Banx”, http://www.ft.com)

(Harry Harrison, http://www.scmp.com)

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

PUJOLADAS OU PUNHALADAS?



Não vão muito longe os tempos em que Jordi Pujol funcionava como uma espécie de role model para todos quantos sentiam na pele ou de perto os males e as perversões do centralismo. Obviamente que também nós, aqui no Porto e a norte de Portugal, olhávamos com alguma inveja para uma Barcelona capital de uma Catalunha onde imperava um partido nacionalista (Convergència Democràtica de Catalunya) cujo presidente era uma voz democraticamente irrefutável – Pujol foi sucessivamente eleito, desde 1980 e por seis vezes consecutivas, para liderar durante 23 anos a Generalitat – e incontornável quanto ao sentido dos destinos da Comunidade Autónoma.

Pujol retirou-se em 2003 e quis o acaso que por essa mesma ocasião eu tenha tido algumas responsabilidades profissionais que me levaram a passar com certa frequência por Barcelona e à correspondente oportunidade de aceder a alguns meandros da sociedade catalã e a um melhor conhecimento das suas elites. Buscava-se então por lá uma difícil readaptação na sequência da orfandade relativamente a um “pai” que sempre estivera muito presente e ao leme, designadamente através da defensiva criação de uma federação de partidos nacionalistas (Convergència i Unió, CIU) e com o Partit dels Socialistes de Catalunya (de Maragall e Montilla) no poder. Confessarei, para ser breve e explícito, que foi então que pela primeira vez senti alguns leves abanões nas minhas convicções regionalistas, hoje cada vez mais repartidas entre coração e razão.

Os incidentes a que presentemente temos vindo a assistir em torno de Pujol, com acusações graves de fraude fiscal à mistura, estão necessariamente em linha com as evoluções atrás referidas e que conduziram ao regresso dos nacionalistas (através da CIU) ao comando político durante a plenitude dos efeitos de uma crise económica (2010) cuja enormidade de implicações negativas encontraria campo fértil nas reivindicações e iniciativas pró-independentistas de Artur Mas. Sem prejuízo do gigantesco e genuíno fervor cidadão...

Esta é, pois, uma matéria sobre a qual as certezas deram lugar a um reinado das interrogações e em que as ideias e argumentos carecem de um profundo refrescamento. E a pergunta mais pertinente é a seguinte: qual poderá e deverá ser a saída última desejável para as imensas e variadas tensões entre o infranacional e o supranacional que cada vez mais nos desafiam e envolvem?

DUBLIN



De partida para Dublin, para defender um paper na Conferência da European Evaluation Society, centrado nas implicações para a avaliação decorrentes da crescente complexidade dos programas operacionais regionais com cofinanciamento comunitário, não deu tempo para rever algumas leituras das atmosferas dublinescas. O intrigante DUBLINESCA de Enrique Vila-Matas ou o turbulento e sempre mutável ULISSES de Joyce seriam leituras recomendáveis. Não deu. Deixo-vos com as conclusões do paper, malfadadamente em inglês, pois o conhecimento tem uma língua, seja ela de terminologia americana ou britânica e não adianta muito esperar por outra alternativa.
Some policy and evaluation-oriented conclusions
Closing the paper, the conclusions also put forward policy and evaluation-oriented recommendations, based on the need to develop more intensive links between the design and evaluation of programmes. Difficulties in achieving credible and rigorous evaluations tend to reduce the effectiveness of programmes and increase the risks of failure faced by policymakers.
Albeit the relevant contribution theory-oriented evaluations has made to minimizing evaluation risks and challenges generated by the increasing complexity of ROPs, as discussed in this paper, it seems clear that it is more and more difficult to build a sound evaluation of ROPs as a whole, encompassing the wide diversity of actions and policy instruments employed to achieve the targeted outcomes. To address this problem, the main contribution of theory-based evaluations, particularly rooted in the strong involvement of stakeholders participating in the programme’s design, is the validation of a theory of change for the ROPs, complemented by the identification of the mechanisms linking the actions and policy instruments and targeted outcomes, considered as the supporting conditions required for these mechanisms and the implementation context to work. The validation of a programme theory does not mean that the evaluation of the whole programme, encompassing all its complexity, is feasible. In our experience, the validation of a programme theory is always combined with the identification of critical programming factors (CPF). CPF are critical not only from the perspective of the strategic monitoring of the ROPs, but also because of the need of policymakers and programme managers to have an in-depth knowledge of the main mechanisms through which the ROPs’ strategic outcomes could be achieved.
The increasing complexity of the rationale underlying the ROPs is not only endogenous, derived from the complexity of targeted outcomes. In the new 2014-2020 programming period, complexity is also strongly determined by the high number (eleven) of strategic thematic objectives of the Europe 2020 strategy. An in-depth analysis of how national administrative bodies have reacted to the 2020 thematic objectives and the negotiation of the Partnership Agreement shows that a huge number of investment priorities and policy instruments were channelled towards the ROPs in order to increase the probability of accessing the ESIF. As we know, to tackle the complexity of regional weaknesses through an increase in the number and diversity of policy instruments is not necessarily the most appropriate answer.
Given the fact that a vast number of policy instruments do not have the same weight in terms of funding, the likely trend will probably be the deconstruction of the idea of evaluating the ROPs as a whole. The evaluation object will tend to be divided into blocks and probably focused on the strategic dimensions of programming. The identification of the CPF that theory-oriented evaluations tend in our experience to achieve could be very helpful in guiding policymakers and programme managers to select the evaluation object blocks.
This means that, in the future, ROPs cannot really be seen as integrated programmes. As a corollary of this trend, the division of evaluation objects into blocks requires policymakers and programme managers to lead meta-evaluation exercises in order to not only try to compensate for the stratification of the evaluation object, but also to allow for a more comprehensive view of the effects of the ESIF in the regions, which are not limited to the ROPs’ effects.
Finally, the paper concludes that the combination of quantitative analyses (namely counterfactual exercises) with the qualitative dimensions of identifying and reconstructing mechanisms linking actions and targeted outcomes seems to be a very powerful means to address complexity in evaluating ROPs. As far as counterfactual exercises are concerned, our experience shows that a selective strategy to mobilize them is necessary. The good practice here is to carry out these exercises only if feasible information conditions are met. There is no experience in Portugal of carrying out experimental evaluations before the implementation of policies. In this context, conducting ex-post counterfactual exercises is very time and resource-consuming.