António José Seguro quando tirou da cartola a
ideia das primárias para primeiro-Ministro para responder ao pronunciamento de
António Costa não terá imaginado nem a recetividade que a ideia iria suscitar
nos simpatizantes do PS, nem o resultado quase esmagador que o iria derrotar. Mas
ficará na história da democracia portuguesa e da história das suas estruturas
partidárias como o líder político que as escolheu como veículo de dinamização
da vida política do país. Para essa história é provável que não colha a ideia
da manobra estatutária e da arma de arremesso contra o seu adversário.
Eu próprio, quando numa manhã húmida me desloquei
às instalações da Junta de Freguesa de Mafamude-Vilar do Paraíso em Vila Nova
de Gaia para votar como simpatizante inscrito não fui capaz de antever a afluência
registada e muito menos o resultado observado. Muito sinceramente receava uma
nova divisão geográfica e que o estilo de Seguro tivesse acolhimento a norte e
fosse significativamente derrotado a sul. Enganei-me e ainda bem, pois começava
a ficar farto da dissonância entre o meu voto e o do meu entorno geográfico.
O eleitorado do PS que se movimentou para as primárias
intuiu a direção do vento da mudança e nas condições atuais de ressentimento da
sociedade portuguesa isso é bem mais importante do que a retórica dos
formalismos. Caíram também por terra as mensagens terríficas que, num dos
programas mais negros e esclerosados que alguma vez Judite de Sousa comandou (o
programa das lamúrias de António Barreto e de Medina Carreira contra as primárias),
foram lançadas a propósito das primárias. A campanha de caráter que AJS
permitiu que se desencadeasse contra António Costa e a canhestra tentativa de
ligar Costa ao mundo dos negócios, que AJS corretamente procura dissociar da
política, foram claramente esmagadas por essa intuição de que Costa era o
portador da mudança.
A partir de hoje, António Costa deixou de estar
no limbo das intuições de quem votou. Para forjar uma alternativa consistente
vai-lhe ser exigido uma outra capacidade de fogo. O calvário estatutário até à
sua consagração como líder oficial do PS exigirá mudanças que sejam elas
mobilizadoras e a primeira é seguramente a do Grupo Parlamentar que precisa de
nova energia que um acomodado Alberto Martins já não é capaz de fornecer. O
friso de personalidades que escutou com devoção o discurso de derrota de Seguro
não se recomenda a qualquer alternativa consistente. O alvo agora é outro e um
primeiro-Ministro, aparentemente descontraído que assistiu à notável vitória
dos portugueses das raquetes pequeninas sobre os alemães campeões da Europa há
seis anos consecutivos, precisa da ameaça de uma alternativa consistente.
Espero que o pensamento crítico deste blogue
possa mesmo que no plano mais distanciado e remoto que lhe queiram atribuir contribuir para essa alternativa mais consistente.
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