(A comunidade FEP – Faculdade de Economia do Porto, a família mais próxima e amigos e conterrâneos de Cesar, no Entre-Douro-e-Vouga despediram-se hoje do José Silva Costa, Professor da nossa Faculdade, com vida mais curta do que todos para ele desejaríamos, atraiçoado por uma doença fatal num dos órgãos mais complicados do nosso corpo. Privei durante muitos anos com o José na Faculdade, com gabinetes contíguos, mesmo junto ao átrio central do edifício, que deu para muitas conversas de ocasião, umas mais profundas e relacionadas com as nossas áreas de trabalho que por vezes se cruzavam, outras mais associadas a temas cívicos e políticos de momento. Tenho saudades desse tempo em que ainda me dividia pela academia e pela consultadoria e o José Costa fazia parte dessa ambiência, com amigos comuns como o Mário Rui Silva e o irmão Carlos Silva Costa de que também sou próximo. Não ficaria de bem com a minha consciência se não registasse aqui a sua partida numa manhã húmida, mas tépida, com uma cerimónia na igreja das Antas, caracterizada por um misto de sobriedade e grande sensibilidade.)
Para além do período em que foi Diretor da Faculdade (1998-2010), sacrificando a sua investigação à tarefa da gestão da Escola numa altura ainda relativamente fraturada entre tendências internas, cruzei-me disciplinarmente com a sua obra, investigação e docência em vários domínios.
Primeiro, apreciando os seus primeiros contributos de investigação, iniciada com o seu doutoramento na Carolina do Sul com o tema das infraestruturas e da sua relação com o crescimento e desenvolvimento económico. Este seu contributo foi teoricamente importante para compreender os efeitos e dimensão ótima dos investimentos públicos e por essa altura Portugal estava por via dos Fundos Estruturais num ciclo de fortíssimo impulso de modernização de infraestruturas. Foi graças a esse contributo que cheguei depois à obra do economista francês Rémy Prud’homme. O tema foi depois objeto de desenvolvimentos por parte de Alfredo Marvão Pereira, professor nos EUA, mas no meu entendimento a investigação inicial do José Costa marcou bastante a minha compreensão desse tema, numa altura em que toda a gente escarnecia da deriva infraestrutural do nosso desenvolvimento, impulsionada pelos Fundos Europeus.
Segundo, reagindo positivamente ao seu convite para assinar um artigo no seu Compêndio de Economia Regional, por ele inicialmente coordenado, e que teve depois a participação do prestigiado Peter Nijkamp numa nova edição dessa obra. A importância deste Compêndio para o ensino da Economia Regional em Portugal foi decisiva, já que era necessário algo que assegurasse a passagem de testemunho do saudoso Professor António Simões Lopes. A minha geração participou massivamente nesse Compêndio e o José Costa soube integrar as diferentes entradas construindo uma espécie de manual que, homenageando a obra pioneira de Simões Lopes, lhe acrescentou todo o saber de uma geração atualizada com a grande transformação que a ciência regional estava a atravessar.
Um pouco mais tarde, cruzei-me com um dos últimos contributos do José Costa que podemos classificar como estudos para a compreensão e operacionalização da descentralização, sobretudo da decentralização baseada no fortalecimento do poder local. As suas análises sobre a estrutura e valores de taxas municipais, em que chegou a trabalhar em municípios concretos, contribuindo para a racionalização de um sistema por vezes caótico e com dificuldade de nele identificar um racional, foi de grande utilidade para compreender os meandros da descentralização. Ness trabalho, manifestou-se todo o seu profundo conhecimento da Lei das Finanças Locais e da sua evolução ao longo do tempo, à medida que o Poder Local fazia a sua progressão como uma das mais sólidas manifestações da revolução democrática em Portugal.
Muitos alunos terão beneficiado todos estes anos do conhecimento do José Costa em disciplinas como Economia Regional e Urbana, sempre sereno nas suas convicções.
Na sua simples e comovida alocução no fim da cerimónia de hoje, o irmão Carlos Silva Costa salientou que uma das formas mais nobres de nos mantermos lembrados, como diria Virgílio Ferreira de nos mantermos vivos mesmo depois de deixarmos fisicamente este mundo, é o prolongamento do nosso pensamento e contributos, dos mais abrangentes aos mais pontualizados, nas instituições em que trabalhamos.
Estou certo que na Faculdade de Economia do Porto, na comunidade de práticas do desenvolvimento regional e urbano e na própria Associação Portuguesa do Desenvolvimento Regional o pensamento e obra do José Costa estarão internalizados nos princípios e valores de tais instituições ou comunidades. E essa é a melhor homenagem e recordação do seu convívio.
A Professora Aurora Teixeira da Faculdade de Economia do Porto tem em mãos o projeto de organizar uma obra de ensaios em homenagem à obra e pensamento do José Costa, o que será também uma forma dos que nela participarem de mostrar que o pensamento e investigação do que hoje nos deixou se prolongará para lá da tristeza desta manhã húmida no último dia de outubro de 2022.
À Rosa sua mulher, Sofia sua filha e família mais próxima, com destaque para o seu irmão Carlos da Silva Costa a quem envio um sentido abraço, a modesta lembrança e reflexão deste que com ele conviveu.