terça-feira, 31 de janeiro de 2017

MIRÓ, MOZART E MARTIN




Apenas uma breve nota para simbolizar ilustradamente um quase ideal fim de semana invernoso acontecido neste renovado Porto em que me vou movimentando. Miró está na Casa e, afinal, por mais quatro meses em relação ao inicialmente previsto – já não há desculpa para você evitar uma visita a esta mostra de seis décadas de pensamento visual e linguagens pictóricas, se possível fazendo-a com um daqueles guias discretos, conhecedores e detalhados que Serralves ostenta no seu portfólio. Mozart vai passando pela outra Casa, conjuntamente com outros sobredotados que fizeram a histórica musical da Humanidade – no caso mais recente, foi a vez da sua belíssima e grandiosa 41ª e última Sinfonia (“Júpiter”), com a Orquestra dirigida por David Angus e explicações de Mário Azevedo. Martin é o cinema, que parece de regresso a um maior e mais consentâneo espaço de convívio com os portuenses (vai mesmo voltar a haver cinema naquele meu Trindade onde nasceu a minha mãe?), e a sua obra em exibição (“Silêncio”) é um notável exemplo da Sétima Arte em estado puro – a adaptação do livro de Shusaku Endo, a mestria da técnica, a qualidade da fotografia, o gradual desfiar de uma narrativa permitindo enquadrar a repressão do cristianismo pelos japoneses (com os padres portugueses Ferreira e Rodrigues no centro da trama) numa compreensível lógica cultural e de diferenciação de mundividências. E só não acrescento outros M’s aos atrás citados, gastronómicos, convivenciais ou futebolísticos por exemplo, para não arriscar misturas talvez essencialmente indevidas...

O PESADELO DO BRASIL


(Osmani Simanca, http://atarde.uol.com.br)

Continuo banzado com o que nos vai chegando desse país de futuro sempre adiado que é o Brasil. Aqui acrescento hoje mais estes gritos de inconformada revolta...

OITO DIAS BASTARAM …




(As atrocidades trumpianas são demasiado gravosas para a democracia para ficarem neste blogue esquecidas. Entretanto, o presidente eleito bate o recorde do estado de graça mais curto da democracia americana, esperando nós que isso tenha consequências)

O gráfico que abre este curto post mostra que o estado de graça de Trump junto da opinião pública americana durou praticamente oito dias, o que é totalmente inédito na democracia americana. Mas nos tempos que correm os termómetros para medir as consequências políticas deste tipo de insatisfação parecem avariados. Permanecerá a sociedade americana em permanente alerta a ponto de influenciar Congresso e Senado e dar luta às ordens executivas que vêm por aí, assinadas para a televisão ver? Uma grande incógnita.

Entretanto, a tal elite derrotada nas urnas escreve duro, muito duro.

David Cole, na New York Review of Books, não hesita em afirmar que Trump está a violar a sagrada constituição americana. Um excerto:

É pressuposto que o presidente dos Estados Unidos sirva o povo americano, não a ele próprio e certamente que não os interesses de estados estrangeiros. O Presidente Trump escolheu seguir esta via e esta responsabilidade. Está a tentar fazê-lo por ambas as maneiras, servindo-se a ele próprio, a sua família e os seus longínquos interesses económicos ao mesmo tempo que assume decisões de política interna e externa que terão inevitavelmente efeitos diretos na sua riqueza pessoal. Esta via oculta o escândalo, a corrupção e a ilegitimidade. Infelizmente, o nosso 45º presidente escolheu deliberadamente minar os interesses das pessoas que devia representar de modo a aprofundar os interesses de uma pessoa com que se preocupa acima de tudo.”

Esta elite não tem papas na língua.

DE MALES MENORES A UM MAL MAIOR?

(Aurélien Froment, “Aurel”, http://lemonde.fr)

Os preliminares das presidenciais francesas mostram-se tão verdadeiramente escaldantes quão movediços. Com a lei de Murphy a espreitar sorrateira e perigosamente. As últimas revelações foram o escândalo surgido em torno de Penelope, a mulher do principal favorito a contrariar a vitória da extrema-direita (François Fillon), e a vitória esquerdista e mais que seguramente impotente de Benoît Hamon nas primárias do PS.


(Eric Laplace – “Placide”, http://www.leplacide.com)

(Corinne Rey – “Coco”, https://charliehebdo.fr)

(Felix Moureau – “Felix”, https://charliehebdo.fr)

Mas a coisa pode pôr-se ainda pior se Fillon vier a ter de abdicar da sua candidatura e Juppé mantiver a sua teimosia de não aceitar ser repescado – e isso porque adivinhem só quem já vai afiando os dentes? Pois claro que ele próprio, esse político irrequieto e sem mínimos de escrúpulos que a França moderna entregará à posteridade sob a alcunha que literalmente honra de petit Nicolas.

(Pierre Kroll, http://www.lesoir.be)

Num quadro destes, não especialmente entusiasmante para não dizer alarmante, emerge uma única solução de recurso concebível para enfrentar o demónio (Marine Le Pen): o melão ainda por abrir que é o social-liberal Emmanuel Macron.