(O taticismo potencialmente
suicidário de Passos Coelho pode ter várias leituras, mas o que mais me intriga é tal estratégia
continuar a merecer o apoio interno da maioria do eleitorado do PSD …)
Não conheço ninguém com um pouco de inteligência e lucidez que não se arrepie
com o taticismo politiqueiro de Passos Coelho e do PSD a propósito do acordo
conseguido em sede de concertação social. É de facto obra no espaço de um mês
mudar de posição ao sabor do vento das conveniências, certamente inspirado pela
recordação nostálgica da coligação negativa que determinou a queda do governo
de Sócrates na Assembleia da República, na antecâmara do resgate da economia portuguesa.
É obra, sobretudo porque precipitar uma tomada de posição sem que o assunto
esteja agendado no parlamento equivale a vontade de fazer sangue antes da
consumação do crime.
Já aqui mencionei que não sou um fervoroso adepto da solução encontrada pelo
Governo de através de uma redução da TSU compensar nas empresas a subida do salário
mínimo. Mas a minha posição não se confunde em termos de argumentação com as
posições do PCP e do Bloco de Esquerda. Entendamo-nos. Para muitas empresas,
incluindo uma vasta franja da frágil economia social, a subida do salário mínimo
constitui um constrangimento com algumas proporções. No contexto atual, a consolidação
da recuperação económica do país exige condições de retoma do investimento
empresarial, sem a qual tudo continuará a ser frágil e vulnerável. Por isso, a
ideia do Governo de acompanhar a negociação do aumento do salário mínimo com um
conjunto de compensações negociadas com o universo dos empregadores é lúcida e
justifica-se pela necessidade imperiosa de criar condições para o crescimento
do investimento empresarial, não esquecendo que há variáveis de entorno externo
que o Governo de uma pequena economia como a nossa não pode aspirar influenciar.
O que entendo é que provavelmente haveria outras vias a explorar para recuperar
essa confiança em contexto de aumento de salário mínimo do que a solução da descida
da TSU, se não fora por outros motivos pela dimensão simbólica da TSU na política
recente portuguesa. O Ministro Vieira da Silva compreendeu a importância do
tema, embora possa ter deduzido que negociações de outra natureza seriam mais
longas, envolveriam outras esferas da atividade do Governo e por isso concentrou-se
na matéria que poderia influenciar mais decisivamente.
Que o PCP e o Bloco de Esquerda nunca compreenderão a necessidade de criar
condições para a retoma do investimento empresarial privado não me espanta. O
problema dessa esquerda é esse mesmo, para ela o investimento privado é dispensável
e o seu conceito de regulação do mesmo confunde-se com o seu atrofiamento. Só o
PS pode preencher esse espaço, embora neste caso me pareça que se anularam
precocemente outras soluções que poderiam assegurar compensações ao setor empregador
para o aumento do salário mínimo.
Há uma outra matéria que tem estado fora da discussão e em torno da qual tudo
está concentrado em torno de desinformação quanto baste. O que está em discussão
exigiria que tivéssemos em cima da mesa uma leitura rigorosa da incidência do
salário mínimo na estrutura salarial para compreendermos objetivamente quem
lucraria com a compensação da TSU. Por exemplo, se chegarmos à conclusão que a
economia social é um dos exemplos de maior impacto do aumento do salário mínimo
então dada a sua dimensão seria possível muito provavelmente encontrar mecanismos
de compensação segmentados.
Em todo este processo, o que não se compreende é o taticismo politiqueiro
de Passos Coelho. Esse taticismo pode ter várias leituras. Uma delas é o facto
de se tratar de uma reação de fim de linha. Vale tudo quando o barco está a
afundar. A minha leitura é mais nociva do que esta. O problema é que Passos é
mesmo assim. De emblema na lapela e com pose pressupostamente de Estado o que
temos é um líder fraco, formado nas cogitações taticistas e de aparelho e, por isso,
a mudança de opinião em termos de catavento, o oportunismo político de circunstância,
fazem parte desse lastro de formação política. Não dará para mais. E o mesmo é extensivo
a um conjunto vasto de personalidades. É só olhar para a bancada parlamentar do
PSD e imaginar o conteúdo que poderia ser espremido a partir de tais
personalidades. Pouco sumo, muita esperteza política de curto prazo.
O velho PSD arrasa certamente Passos. O artigo do meu amigo José Silva Peneda
hoje no Público é desse calibre. Outras velhas elites do PSD dirão o mesmo, já
me dispenso de referir Pacheco Pereira, pois é conhecida a ideia desvalorizada
que ele tem do líder atual do PSD.
Mas não é isso que me intriga. O que me intriga é que, perante este descalabro
e este catavento, o PSD mantenha no eleitorado de sondagens percentagens em
torno dos 30%. Esse número é que me preocupa. Ele mostra que há eleitorado para
bater palmas ao taticismo político mais rudimentar, cavalgando ondas das mais
insólitas, conduzindo o eleitorado a comportamentos que não podem deixar de
produzir efeitos nas restantes forças políticas em matéria de desvario.
Resumindo, gostaria de acreditar que o comportamento de Passos é equivalente
a desespero de fim de linha. Mas não estou disso convencido. O que significa
que a preocupação deve ser maior.
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