Até hoje, momento em que comprei o Le Monde no aeroporto, o nome de Marli
Renfro era-me totalmente desconhecido, embora o tema sempre me tivesse seduzido
e a recente revisita do filme sobre Hitchcock o tivesse reavivado.
O tema circunscreve-se a tudo que rodeou e ainda
hoje rodeia as filmagens do PSICO e a eterna cena do chuveiro com Janet Leigh. Ora
Marli Renfro é nada mais nada menos do que a dupla de Janet Leigh que esta exigiu
para fazer a cena do nu que passa praticamente despercebida tal é a tensão que
Hitchcock consegue imprimir à referida cena, aliás uma das mais coscuvilhadas
pela instituição americana “defensora da moral e dos bons costumes” da
contraditória sociedade americana.
Tudo ficaria por aqui se o tema que leva o
assunto ao suplememento LIVRES do Le Monde de hoje não fosse
a publicação da versão francesa de um livro que também desconhecia e que, a
partir de agora, vou ter dificuldade em não ler compulsivamente e o mais
rapidamente possível: The Girl in Alfred Hitchcock’s shower de
Robert Graysmith.
Graysmith, estudante de arte em Berkeley, ter-se-á
apaixonado pela figura de Marli, que representaria para o jornalista a beleza
ideal. De facto, a imagem que abre o post, com os seios em forma de pero,
representa uma espécie de beleza naturista, que terá estado na base do seu
fugaz aparecimento no primeiro filme de Francis Ford Coppola, Tonight for Sure,
de 1962, que a reportagem do Le monde
considera uma espécie de opus naturista. O mundo é pequeno e há histórias do
arco da velha.
E, como não podia deixar de ser, o espírito de
Hitchcock não está também ausente. Não é que, em 2001, Graysmith tem
conhecimento que Marli foi assassinada em condições muito similares às da cena
do chuveiro? Não estão a pressentir aquilo sorriso meio cínico, meio estranho,
com que Hitchcock acabava as séries de tão boa memória na televisão?