Vasco Pulido Valente, sexta-feira, no Público:
“Não por acaso,
evidentemente, em 1654 Portugal assinou o tratado de Westminster, que concedia
à Inglaterra o direito de ter em Lisboa um juiz conservador da Nação Britânica,
encarregado de julgar os súbditos do sacratíssimo Reino Unido e qualquer
questão em que por qualquer motivo eles se vissem envolvidos. Também a França,
a Espanha, a Holanda, a cidade livre de Hamburgo, ou seja, a Europa inteira,
acabaram por conseguir o mesmo privilégio. Com uma extraordinária visão do
futuro, o sr. Seguro reviveu estas boas práticas do século XVII, mas por
enquanto não se lembrou de convidar juízes da “Europa”, da América, do Brasil e
de Angola para facilitar os trabalhos da justiça; e de exigir a construção de
uma cadeia moderna com boa cozinha e ar condicionado para um eventual
cavalheiro obrigado a cumprir uns dias de prisão.”
Só o espírito corrosivo e implacável de VPV para arrasar
o que me parece ser um dos maiores mistérios do PS dos últimos tempos ou seja
quem terá sido o inspirador da mais desconchavada ideia pré-eleitoral que me
lembro. Curiosamente, quase em simultâneo, José Miguel Júdice e o deputado
socialista Alberto Costa defendem algo de mais sensato, a especialização de
juízes (formação como fator crucial) e a criação de tribunais-piloto para
resolver conflitos entre empresas.
Idem, domingo, Jornal Público
“(…) O que mais me intriga, apesar do resto, é a geral atitude
de apatia do jornalismo profissional. Não só não acha a ‘oligarquia’ ou a
‘fracção’, de que Capucho e Pacheco se queixaram, digna de investigação e de
comentário, mas não lhes repugna aceitar em silêncio o que os ‘notáveis’ lhes
metem pela goela abaixo. Ora este assunto não deve ser tomado como uma opinião
trivial a propósito de uma querela partidária, pela simples razão de que afecta
o regime inteiro. Como as diatribes do Dr. Soares contra a honestidade dos
jornalistas não devem ser atribuídas à notória irritação da personagem. Claro
que, se Portugal considera normal que pequenos grupos se instalem na direcção
de um grande partido, com dinheiros de origem obscura, e concorda que os
jornalistas são uma cambada de mercenários, o caso muda de figura. O melhor é
fugir.”
Um bom tema de debate: até que ponto e em que
medida a comunicação social que se faz em Portugal é cúmplice e responsável
pela anomia política em que vivemos?
Eduardo Prieto, arquiteto e filósofo, no La Cuarta Página do El País, sábado:
“(…) O certo é que pouco importa que a inteligência urbana
seja concebida como simples tecnologia aplicada ou como uma utopia ambiciosa à
maneira da Telépolis ou da Cidade dos bytes; o perigo é que a cidade acabe nas
mãos dos novos especialistas digitais e que os necessários papéis considerados
pelo inatingível político ou o urbanista megalómano ou arquiteto acabem
desvalorizando-se à medida que o que fazer deliberativo dos cidadãos anónimos,
construtores materiais da vida urbana, é simultaneamente posto em causa. Se a
complexidade da cidade pode reduzir-se à mera gestão digital de problemas
concretos, então é necessário substituir os antigos hierarcas por outros e
presumivelmente mais inócuos, os especialistas ou expertos digitais e os
cidadãos deverão assim conformar-se e assumir um papel passivo. (…) Este
ciberfetichismo de algoritmos e concertinas não resolverá os nossos problemas
económicos e sociais, nem tão pouco os urbanos, pois que nos territórios e nas
cidades não há mais inteligência do que aquela dos que os habitam. A conclusão
foi antecipada pelo arquiteto e tecnólogo americano Lewis Mumford: não devemos
pedir às máquinas mais do que elas realmente nos podem dar”.
Palavras sábias ou o retorno ao singelo como algo
de perene face à efemeridade da sofisticação tecnológica.
Pedro Santos Guerreiro, Sábado, Expresso:
“Vende-se, bom preço (…)
Vende-se austeridade. Custo: uma geração. Pagamento em
recibos verdes.
Vende-se ilusão de ultrapassagem da crise. Custo: 130% de
dívida pública.
Vendem-se anéis como se não fossem dedos, corpo como se
não fosse a alma, palavras como se não fosse a palavra.
Compra-se: submarinos, estradas vazias, bancos falidos e
dívida pública cara. Sem devolução. Paz? Pás!”
Recomenda-se a leitura de toda a crónica, um bom
libelo contra todo o non sense a que
o branqueamento europeu nos vai conduzindo.
José Pacheco Pereira, sábado, Público:
"Perguntas que eu gostaria de fazer a propósito do 'milagre económico'
(...) Que
papel têm no fechar de olhos europeu e da troika a estes resultados muito longe
do previsto, as circunstâncias políticas das próximas eleições europeias com um
ascenso claro de forças antieuropeias para quem a permanência da crise do euro
e das dívidas soberanas é um argumento central?
Ou que
papel tem na fácil aceitação de resultados medíocres, e mesmo no seu elogio
público por responsáveis europeus, a consciência de que não é possível
prosseguir estas políticas, entre outras coisas porque não existe consenso
europeu para continuar a apoiar directamente os países do Sul endividados e,
por isso, ser mais fácil fazer uma cosmética do sucesso do que uma verificação
do falhanço? Ou por se temer que a má fama dos ‘protegidos’ do ‘protectorado’
atinja a boa fama dos ‘protetores’?
(…) Será
que o Governo espera recolher os louros de curto prazo com uma saída ‘limpa’ e
depois deixar os problemas de sustentabilidade da ‘limpeza’ para os seus
sucessores na governação? Quem vier a seguir encontrará uma espécie de bomba de
relógio deixada pela ‘saída limpa’ que permanece dormente durante dois anos e
depois explode nas mãos de quem estiver no Governo?”
Perguntas que qualquer com um mínimo de senso
crítico deve continuar a fazer, combatendo impiedosamente o branqueamento da
encenação em curso, com cobertura europeia.
Judite Drench, Philomena, numa sala de cinema
O rosto de Judite
Drench, serenamente implacável, é o mais contundente libelo acusatório de
todas as omissões do fanatismo religioso, neste caso da igreja irlandesa mais
profunda. A contenção de Stephen Frears é notável, num registo de realismo
fílmico que tanto aprecio.
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