Assisti esta noite a um espetáculo indescritível e quase degradante no programa “Negócios da Semana” da SIC Notícias onde o pivot – um tal José Gomes Ferreira absolutamente fascinado com o seu próprio brilho analítico-investigativo e imbuído da sensibilidade de um elefante numa loja de porcelana – veio exibir uma vez mais a sua impreparação fundamental, a sua limitada inteligência, a sua veia reacionária e os seus notórios propósitos punitivos. Desta vez a tese, sempre conspirativa e assente em vaga boataria de caserna, era a da defesa de um incomparável trabalho de Domingues na Caixa contra uma classe política que só tardiamente se veio a dar conta de que o dito homem iria destruir o “regime” instalado com a rigidez do plano de reestruturação que estabelecera para a maior instituição financeira nacional. Onde viverá o inventivo Zé Gomes? Terá ele uma ideia minimamente concreta sobre aquilo de que se apresenta como um praticamente exclusivo especialista? Saberá ele o que são, para que servem e como funcionam a DG Competition da Comissão Europeia ou o SSM Supervisory Board do Banco Central Europeu? Estará ele mesmo convencido de que mais ninguém vê o que só as suas privilegiadas lentes enxergam? A inenarrável prestação da criatura perante três atónitos e credíveis jornalistas económicos (Cristina Ferreira, Isabel Vicente ou Pedro Sousa Carvalho) teria sido só risível e insignificante se não fosse também perigosamente destrutiva...
quarta-feira, 30 de novembro de 2016
QUEM MANDA?
O terceiro jogo em branco passou a quarto. Há 430 minutos sem marcar um golo. Jogaram-se 48 minutos com um jogador a mais. O Benfica está a sete pontos de distância. Lenços brancos para Espírito Santo. Desconhece-se se Pinto da Costa foi ao balneário. E Nuno diz que seria injusto pensar em si neste momento. Cá vamos chorando e rindo...
terça-feira, 29 de novembro de 2016
A LUA E O DEDO
(Brad DeLong tem no Project Syndicate um curioso artigo em que Pascal Lamy, antigo presidente da
Organização Mundial do Comércio, cita a utilização de um provérbio budista, para distinguir entre a globalização e o
funcionamento mais geral do capitalismo …)
O provérbio budista diz mais ou menos o seguinte: “Enquanto o filósofo aponta
para a lua, o louco olha para o dedo”. Segundo Lamy, a lua seria a economia de
mercado capitalista e o dedo a globalização.
Compreende-se a alegoria. O risco estaria na confusão implícita entre os
rumos do capitalismo e os da globalização, que emergiu sobretudo como sequela da
deriva que resultou da globalização ter sido aprofundada desenfreadamente, sem
ter em conta dois outros aspetos com os quais a economia de mercado coexistiu
na sua era de ouro de crescimento económico, a relevância do Estado-nação e a
democracia com as condições associadas de defesa dos interesses do mundo do trabalho.
Explorando a alegoria budista de Lamy, a deriva da globalização ter-se-ia
traduzido na confusão entre o dedo e a lua, ou seja na perigosa tentativa de
fazer da globalização o estádio supremo do capitalismo e da economia de
mercado.
Assistimos hoje, do primarismo de Trump aos nacionalismos que grassam na
Europa, a um sério recuo nos discursos racionalizadores da globalização. O drama
trágico que nos assiste consiste em que esse recuo não significa a vitória dos “filósofos”
olhando para a lua (a economia capitalista de mercado). Aliás, não sabemos
exatamente a que esse recuo do discurso racionalizador da globalização corresponde.
Não é líquido que possa corresponder a uma reconsideração inspiradora do capitalismo.
O que a história nos ensina é que quando a integração económica foi deliberadamente
suspendida ou mesmo invertida o resultado foi social e politicamente desastroso.
Para além disso, sabemos que a manipulação do comércio internacional no sentido
de assegurar o domínio de outros países por via externa fez parte da ascensão nazi
na Alemanha, o que é manifestamente uma má companhia.
Os filósofos estão pela hora da morte e escasseiam aqueles que nos possam
indicar solidamente a lua, trabalhando o caráter mais inclusivo e distributivo
da economia de mercado, a sua sustentabilidade ambiental como oportunidade e uma
gestão mais negociada e participada da globalização, contrariando a deriva da
financeirização.
Temos ainda um problema sério para resolver em torno dos rendimentos
decrescentes do progresso tecnológico (como o sugere Robert J. Gordon na sua
obra monumental sobre o estancamento do crescimento americano), que podem ser
eventualmente contrariados pela relevância do progresso técnico baseado na ciência
que estará longe de corresponder ao epitáfio proposto por Gordon. Joel Mokyr (Northwestern
University – USA), que acaba de publicar uma fascinante obra sobre as origens
da cultura de crescimento na moderna economia, apresenta também no Project Syndicate uma visão bem mais esperançosa
nas virtualidades do progresso técnico puxado pela ciência, a qual exige
segundo ele algum tempo de maturação para apagar os baixos números de evolução
da produtividade global dos fatores que enquadra a reflexão de Gordon.
Há por isso matéria bastante e relevante para não confundir o dedo e a lua.
A globalização terá ido para alguns longe de mais ou, melhor ainda, terá evoluído
demasiado depressa, puxada pelos interesses e estratégias das empresas globais.
Faltarão os filósofos para nos guiar na direção certa?
A QUASE IMPOSSÍVEL MISSÃO DE MARTIN
(Klaus Stuttmann, http://www.tagesspiegel.de)
Depois de muita reflexão e várias contas de cabeça, assim como de algumas tentativas vãs de renovação da grande coligação que vem comandando os destinos do Parlamento Europeu, Martin Schulz assumiu que teria mesmo de se forçar a mudar de vida política. Voltando-se então para dentro do seu país, onde Sigmar Gabriel tinha tudo para parecer um caso perdido, Schulz disfarçou como pôde o seu assim ressuscitado interesse pela política nacional e lá conseguiu acabar escolhido como o representante do SPD numa próxima disputa visando complicar uma quarta vez de “Mutti”. Pese embora o facto de Schulz ser hábil e aguerrido, não se lhe auguram grandes hipóteses de sucesso... mas lá vai o livreiro de Würselen fazer as malas e regressar a casa.
segunda-feira, 28 de novembro de 2016
AFINAL O QUE É UM BANCO PÚBLICO?
AFINAL O QUE É UM BANCO PÚBLICO?
(Diz-se que o que
começa mal não acaba bem e estava escrito que a Caixa iria dar para o torto, mas no meio de tanta algazarra, para todos
os gostos e feitios, há algo que me preocupa, é que ninguém parece saber efetivamente
o que é e o que pretende do banco público, a não ser os que dominam o tráfico
de influências…)
Domingues e parte da sua equipa deram à sola. As forças da direita e a
vaidade do Bloco (parceiros instáveis de acordo e o que seria se estivessem na
governação) tiveram no parlamento uma tarde e anoitecer de glória, porque
afinal acabaram por se sobrepor aos ditames do Tribunal Constitucional. O
cronista do Reino Mendes veio comunicar à populaça que Domingues e a sua equipa
se sentiram ofendidos com a deliberação da Assembleia e houve quem dissesse
(terei ouvido bem?) que, no caso do Parlamento não deliberasse nesse sentido, a
equipa de Domingues teria acabado provavelmente por entregar a declaração de
rendimentos e de património. Isto parece mais uma ópera bufa. O governo faz de
conta e assobia para o lado, refugiando-se numa postura de Estado (agora?). A
direita, particularmente o PSD, cavalga desesperado esta brecha, afinal não tem
mais nada para dizer, até dói a grotesca postura de oposição em que o PSD se
colocou, numa patética esperança de que o tempo passe depressa e que o filme
não tenha de ser rebobinado.
Já se percebeu que a personagem Domingues não me impressiona, não só devido
a uma postura que, se não é de arrogância pura e dura, disfarça muito bem.
Impressiona-me a ligeireza com que os masters
do emprego privado nas instituições financeiras imaginam que é possível gerir
recursos públicos, exigindo as mesmas regalias e supra-imaginárias
remunerações, o que para mim é um excelente indicador da deficiente compreensão
dos limites e relações entre o público e o privado.
Mas no meio desta ópera bufa, o que mais me inquieta é que, perante tanta
convicção na defesa do banco público, é difícil encontrar alguém que saiba
efetivamente o que fazer de um banco público com a dimensão da Caixa,
imaginando que a recapitalização chega a bom porto e fique em condições para
funcionar.
O que espera o Governo da Caixa?
É a preservação sistémica da estabilidade do sistema financeiro que se
procura, estimulando pela concorrência na procura de recursos a banca privada a
comportamentos mais sólidos e menos lesivos dessa instabilidade?
Ou pretende-se que a Caixa seja o parceiro fundamental de apoio de crédito
a projetos empresariais que correspondam ao modelo económico de promoção de
melhores condições de competitividade na economia mundial, fazendo da Caixa por
exemplo um parceiro estratégico rigoroso do financiamento da internacionalização
das empresas portuguesas?
Sabemos que não queremos uma Caixa do tipo da que personagens como Carlos
Santos Ferreira, Armando Vara e outros amanuenses da gestão financeira
exercitaram, com financiamento de operações que não se compreendem numa
instituição bancária privada de confiança, muito menos num banco público. Mas
para que a defesa da opção banco público esteja firme entre os portugueses
talvez fosse conveniente ser mais claro naquilo que se pretende que ela seja. Afinal,
as duas opções que constam dos dois últimos parágrafos anteriores não se
reconduzem a apoiar projetos inviáveis. A Caixa não vai operar num mercado à
parte. Vai operar no mesmo mercado em que operam as suas principais
concorrentes. Vai estar sujeita aos mesmos constrangimentos e regras apertadas
de supervisão bancária europeia, enfrentando os mesmos desafios no seu
refinanciamento internacional. Com tudo isto, parece ser a hora de menos
discursos de bandeira e tempo de mais rigor e clareza nos objetivos que se
prosseguem. Não sabemos que mandato Domingues terá recebido. Não sabemos também
em que argumentos se baseia o tal parecer alternativo que dava a Domingues a convicção
(seria mesmo convicção) de que não estava sujeito à obrigatoriedade de entrega
de declarações de rendimento e de património.
Sabemos de facto muito pouco de coisas fundamentais para compreender o
alcance de ter um banco público na economia portuguesa de hoje. De chicana política
estamos fartos.
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