domingo, 6 de novembro de 2016

PATXI




(O estado de urgência em que o PSOE se encontra após a sua divisão interna na viabilização do governo do PP exige análise profunda, pois a saída deste estado é paradigmática dos desafios de superação ou de irrelevância que a social-democracia de inspiração socialista hoje enfrenta)

Escrevi repetidas vezes neste blogue que a liderança de Pedro Sánchez me parecia pouco fiável para assegurar ao PSOE perspetivas credíveis de sobrevivência. Por sobrevivência do PSOE não entendo a possibilidade de regresso rápido ao poder. Ela significa tão só que, embora afastado do poder, se mantenha como referencial de voto democrático para a busca de uma alternativa, sobretudo no campo exterior à da base sociológica que vai assegurando ao PP a sua resiliência por entre as bátegas da corrupção que tem grassado por essas bandas e influências. Como se diz por vezes na linguagem desportiva, Pedro sempre me pareceu demasiado “tenrinho”, embora portador de uma imagem rejuvenescida (jeans e outras coisas) e talvez tenha aparecido na cena da liderança porque outras raposas terão escolhido outro timing para descer ao galinheiro.

O problema do PSOE não é um exclusivo da Espanha. A questão fundamental a dirimir é encontrar uma estratégia de ação que, embora mantendo o estatuto de partido da governação possível, desenvolva laços de resposta a uma vasta amálgama de populações descontentes e incompatibilizadas com o centro da governação. Esta tensão é já anterior aos efeitos da crise de 2007-2008 e das políticas de austeridade que se abateram sobre o sul da Europa após a crise das dívidas soberanas, apesar das diferenças de fatores que as determinaram. Não tendo em conta para já as populações marginalizadas que nem sequer na convocação de ideias do PODEMOS se reconhecem, o PSOE, tal como outras forças políticas de esquerda socialista na Europa, tem uma dificuldade intrínseca de interação com a amálgama sociológica que dá vida ao PODEMOS. Essa dificuldade é tanto maior quanto a manutenção desta força política fora dos desafios da governação vai adiando a confirmação de que não há nessas forças políticas nenhuma poção mágica para resolver as situações estruturais que as catapultaram para a integração dos movimentos da rua. A experiência local da diversidade de forças e movimentos que se acolhem no manto PODEMOS é desastrosa. Das Mareas, totalmente mareadas, que vão evoluindo na liderança das principais cidades galegas, aos avanços e recuos de Carmena em Madrid, passando talvez pela mais consistente Ana Colau em Barcelona, vai mostrando que se o PODEMOS tivesse algum compromisso de governo muita da sua auréola mobilizadora do descontentamento iria esmorecer. Mas enquanto isso não se verificar e, dada a dificuldade de extrapolar simplesmente do local para o nacional, o pensamento PODEMOS e o seu respaldo eleitoral continuarão a ser o “cabo dos trabalhos” para o PSOE. Não me parece que a recente vontade de Pedro Sánchez, já fora da liderança, de se aproximar decisivamente do PODEMOS seja a saída. Tal como não me parece também que, na senda do que Francisco Assis tem por cá defendido, a rotura total com essa faixa do eleitorado seja também a solução salvadora. Na primeira solução, o PSOE corre o risco de perder identidade. Na segunda, tenderá a alargar o seu fosso face às mudanças do eleitorado. A solução terá de andar por algo situado entre esses extremos, mais dificultada em Espanha do que em Portugal, dada a inexistência em Espanha de uma força tão estruturada e resiliente como o PCP, sem ignorar o atavismo de algumas das suas posições.

Mas se a procura dessa posição intermédia exige pensamento, e pouco se tem aprofundado de ideias nessa direção, ela é indissociável do tipo de lideranças. A equação ideias – lideranças é de resolução mais complexa do que a maturação de conhecimento para a ação política. Javier Hernández, líder da comunidade autónoma das Astúrias, tem-se revelado o homem certo para conduzir o partido nesta difícil transição de ter de viabilizar o governo de Rajoy e manter vibrante a sucessão de liderança. Para além disso, é necessário pacificar o possível para garantir um bom confronto de ideias que conduza à escolha de uma liderança. Mas Hernández não parece ser a liderança necessária para uma travessia de sobrevivência, ou seja, estar fora do poder e manter a chama no eleitorado. Já aqui em posts anteriores me referi ao que parece ser uma liderança possível no âmbito dos que pensam que a solução institucional da Espanha está na Espanha das Nações, Patxi López (ver link aqui de texto programático), PSOE basco e que já em tempos assumiu a difícil tarefa de liderar o governo basco. Parece haver no interior do PSOE alguma movimentação no sentido da sua liderança, o que servia para bloquear as pretensões da líder andaluza, Susana Diáz.

Os desafios são variados e complexos. Clara Ferreira Alvez na sua crónica inicial da revista do Expresso fala dos novos revolucionários, criados no âmbito dos movimentos do BREXIT ao Trumpismo, ao abrigo do primado das redes sociais em que a opinião faz a verdade. A esquerda social-democrata e socialista não está preparada para lidar com esses contextos, o que não significa ignorá-los. O trágico destes movimentos é que só com a sua chegada ao poder se compreende e reconhece a sua verdadeira natureza. Mas os danos incalculáveis que essa revelação poderia significar, uma governação Trump, por exemplo, significam que a solução e o combate que a ela há de conduzir não podem esperar por essa revelação.

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