quarta-feira, 31 de outubro de 2012

EUROPA ILUSTRADA (X)


Outubro chega ao fim e, com ele, a habitual síntese europeia ilustrada do mês. Que nos trouxe, de um Sul em continuada aflição (Tsimis Skitso, http://www.ekathimerini.com), algumas notícias de assinalar. Como sejam: de Itália, uma cada vez mais provável continuidade de Monti no poder (Emilio Giannelli, http://www.corriere.it); de Espanha, o espetro de um resgate sempre adiado (Jaume Capdevilla ou Kap, http://www.lavanguardia.com); da Grécia, Angela em viagem de reconhecimento (Tsimis Skitso, http://www.ekathimerini.com); de Portugal, assaltos em pleno dia (António, http://expresso.sapo.pt).

 
 
 

Num âmbito europeu mais alargado, e enquanto prosseguia a odisseia da união económica e monetária (Janusz Majewski ou Mayk, http://www.sydsvenskan.se) e as tensões políticas se mantinham presentes embora discretas (Emilio Giannelli, http://www.corriere.it), aumentaram os prenúncios de novas ordens possíveis (Peter Brookes, http://www.thetimes.co.uk e Tom Janssen, http://www.trouw.nl).

 
 
 

Mas Bruxelas recebeu ainda notícias tão imprevistas quanto a atribuição de um Prémio Nobel da Paz (Martin Rowson, http://www.guardian.co.uk) em lugar de um bem mais provável Prémio Nobel da Economia (Philippe Chappatte, http://www.letemps.ch)...

 

CARLOS COSTA VOLTA À FEP


Foi um Carlos Costa em excelente forma que regressou à sua velha casa-mãe. Também eu o fiz expressamente para ouvir a sua conferência na cerimónia de abertura do ano letivo. Expectativas altas, portanto. Com balanço acima das mesmas.
 
O essencial da comunicação estará disponível no sítio do Banco de Portugal, pelo que não me estenderei muito sobre ela. Não obstante, sempre deixarei a respeito uma dúzia de brevíssimas notas, incontornavelmente simplificadas porque descontextualizadas e necessariamente subjetivas quanto ao critério de escolha:

·         a explicitação do caráter inquestionavelmente estrutural da crise que atravessamos (“não se resolve com medidas anticíclicas”), exigindo como resposta uma estratégia de desenvolvimento dirigida a uma convergência sustentada com os níveis europeus de rendimento per capita e pressupondo intervenções em quatro dimensões (estrutural ou schumpeteriana, orçamental e macroeconómica, demográfica, externa);

·         uma insistência na relevância central de ser salvaguardado o capital social do País e, assim, de se investir por todos os meios no consenso social;

·         o sublinhado da necessidade de um conveniente tratamento em relação aos sinais de descrença e erosão da base social de apoio ao programa de ajustamento em curso;

·         uma denúncia elegante do simplismo reinante no debate doutrinário em torno da adequabilidade de um abrandamento do ritmo de consolidação orçamental, com saliência para a imprescindibilidade de uma perspetiva dinâmica (vs. de equilíbrio parcial) e o anúncio de um próximo tratamento do tema em sede académica e a respeito de João Ferreira do Amaral;

·         a ideia de que a ausência de uma política monetária autónoma não é um custo mas apenas uma restrição;

·         algumas considerações pertinentes associadas às fragilidades do recente debate público sobre a relação austeridade-crescimento;

·         reflexões diversas em torno da ordem de grandeza, do momento e do ritmo de ajustamento das contas públicas, designadamente no tocante à interferência na questão de uma multiplicidade de variáveis;

·         a chamada de atenção para o desejável contributo dos parceiros europeus dotados de maior margem de manobra no sentido da ultrapassagem das nossas dificuldades atuais, aspeto potencialmente favorecido pelo processo de coordenação das políticas económicas inscrito no Tratado;

·         a defesa de que uma estratégia de crescimento para a economia portuguesa está na ordem do dia, constituindo o desendividamento apenas uma condição necessária mas não suficiente para uma saída da crise;

·         referências ponderadas quanto a uma sustentabilidade duradoura das finanças públicas, designadamente no tocante à compatibilidade do nível da despesa pública com a capacidade do tecido produtivo, as tendências demográficas e um nível de tributação tolerável e à clarificação de um modelo de organização e gestão do setor público;

·         a explicitação concreta de que a via de empobrecimento relativo em que o País se encontra só terá ultrapassagem por via da renovação do seu tecido produtivo (bens transacionáveis) e tendo o setor privado por ator transformador principal;

·         uma palavra de passagem exprimindo uma louvável homenagem a Fernando Teixeira dos Santos, “que teve o instinto certo no momento certo para evitar o pior”.

O que poderá ter ficado por tratar ou as diferenciações de ênfase que poderão ter parecido a alguns menos justificáveis resultaram, neste quadro, em aspetos desprezíveis e largamente suplantados pelo brilhantismo e fineza de raciocínio do melhor economista da sua geração e – porque não dizê-lo? – daquele que é o mais consistente “fepiano” de todos os tempos…

A ELITE DO NOSSO SUBDESENVOLVIMENTO




RETORNO FURTIVO A PARIS



Uma fuga rápida a Paris em trabalho, com tempo muito escasso para fruir a grande urbe, paradoxalmente rica no pequeno local, na pequena cidade, perdidos no turbilhão da oferta de serviços. Tempo apenas para uma curta passagem por Saint-Germain-des-Prés, com um copo de fim de tarde no  Les Deux Magots, repleto por todos os lados de brasileiros emergentes, bastante adinheirados, ostensivamente efusivos, com o ego profundamente em cima. Um retorno truncado à memória de outros tempos. Sem tempo para o retorno às livrarias, algumas delas já extintas, transformadas num bistrot qualquer ou numa outra função que nos incomoda a memória afetiva. Apenas tempo para uma curta entrada na Julliard que decididamente nunca foi uma das minhas favoritas.
Com o copo de fim de tarde, com trânsito febril, tempo para uma leitura convulsiva dos jornais, mas também oportunidade para corroborar impressões de uma tarde de trabalho. Tal como antevi à distância, o impacto da governação Hollande é bem mais significativo a nível europeu do que a nível interno, onde praticamente toda a gente, até algumas correntes de pensamento no interior do PS, antecipam uma situação recessiva em França e um profundo receio de que os estafermos dos mercados comecem a fazer trepar as taxas de juro às quais a França poderá financiar-se. O camarada Schroeder do SPD alemão ajudou à missa com uma espécie de reprimenda aos seus colegas franceses alertando também para a necessidade das famigeradas reformas estruturais (já não há pachorra …).
E no seio da governação Hollande começam a estalar conflitos inter-ministeriais, alguns deles anunciados, como por exemplo o choque entre a Economia e Finanças (Pierre Moscovici) e a Recuperação Produtiva (a imaginação retórica dos franceses é notável) (Arnaud Montebourg). Vá lá que o primeiro-Ministro Ayrault continua um ireepreensível aliado de Hollande. O debate sobre o possível impacto na recessão anunciada dos cortes orçamentais orientados para os 3% de défice continua ao rubro.
Aparentemente longe do teor do post de hoje, a viagem a Paris trouxe-me duas notícias sobre manifestações de rigidez nas relações de trabalho na TAP que são um primor:
Primeira: o acordo de trabalho de pessoal de cabine e de bordo contempla um horário de voo de 14 horas; acaso esse valor não seja atingido, a TAP paga aos seus trabalhadores uma multa pelo facto de não ter atingido aquele limiar, para além da remuneração fixada, claro está; acaso o limite seja ultrapassado, são pagas horas extraordinárias. Um primor não acham?
Segunda: por vezes, mudanças imprevistas de avião obrigam a que refeições de catering em princípio para serem servidas frias tenham de o ser quentes; porém, essa mudança exige a aprovação prévia de sindicatos, pois estes entendem que o aquecimento da refeição implica trabalho adicional; se tal autorização não for dada e se a mudança de avião se concretizar a refeição não é servida. Não lembraria ao diabo!
Estas situações são certamente pontuais no plano global, embora no contexto da TAP possam não o ser. A terem expressão, até eu, mesmo já sem pachorra, também diria que reformas estruturais são necessárias …

A CADEIRA DE SONHO

As eleições para a Câmara do Porto ainda vão fazer correr muita tinta e até, talvez, algum sangue. Para não falar de muita despesa em horas extraordinárias nos tribunais.

Meneses fez-se à estrada sem colocar o cinto de segurança e Rio não tardou a mover as suas pedras contra ele, assim pondo Moreira a salivar perante a hipótese de vir a alcançar a pequena glória que tanto ambiciona.

Em entrevista cirurgicamente preparada em colaboração com a RTP Informação, Rio explicou cristalinamente o argumentário oficial para um não ao sôfrego Meneses. Numa curta síntese: “Quinze juntas de freguesia no Porto. O de Massarelos ia para Lordelo, o de Cedofeita ia para Nevogilde, o de Nevogilde ia para a Foz… e no fim ficavam todos na mesma. É não é? Acho eu que é!”


Mas o momento alto daquele mesmo programa esteve no lançamento de Moreira por Rio. Nos seguintes moldes disfarçadamente burilados: “A minha leitura, local e nacional, diz-me isto: perante o desgaste gigantesco que os partidos têm neste momento – os partidos estão neste momento com um desgaste… quer dizer, há pessoas que quase têm ódio aos partidos e os partidos não têm grande juízo, ou seja, afunilam muito as suas escolhas… E na minha leitura há três cidades, talvez quatro (Lisboa, Coimbra, Porto, talvez Braga), que têm uma sociedade civil com uma vitalidade tal que… como é que eu hei de explicar? O que eu sinto no Porto – acho que não se deve estar a sentir em Lisboa nem em Coimbra, porque em Lisboa e Coimbra há provavelmente a recandidatura do António Costa e do Barbosa de Melo, não me parece que se coloque – (…), o que eu sinto é que os partidos, se não tiverem juízo, correm um risco enorme de poder haver uma reação, digamos assim, da sociedade civil, escolhendo um entre os seus, que são diversos, para protagonizar contra os partidos – contra, não é bem contra, em alternativa, está a ver?”


Claro que estamos todos a ver. E claro que há pontos que favorecem o racional exposto por Rio. Mas ainda não estou assim tão certo de que tanto contorcionismo tenha valido a pena, Dr. Moreira!

terça-feira, 30 de outubro de 2012

TUDO DIREITINHO 10

Tanta tem sido a algazarra e a trapalhada que até me esqueci de assinalar aquele que parece ter sido o regresso, no seu episódio 10 (não juro que não lhes tenha perdido a conta…), da tão apreciada série “Tudo Direitinho”, ausente em parte incerta durante breves meses.


O provocatório pretexto veio de uma obrigação imposta por Crato à Lusófona (capa do “Jornal i”, acima), a qual foi por Relvas desvalorizada nos seguintes termos: “a Universidade recebeu uma mera advertência e, agora, tem de responder sobre essa advertência”.


E quando tudo parecia assim serenado, a primeira página do “Expresso” voltou à carga nos termos acima reproduzidos: “Relvas teve equivalência a cadeiras que não existiam”!


Nada, no entanto, que tenha feito vacilar o sereno e consciencioso Relvas. Que logo tratou de declarar: “Não tenho receio de nada, quero que tudo seja apurado porque, como disse, fiz de acordo com a lei, de consciência tranquila, de boa-fé, era assim que estava, é assim que estou e é assim que continuarei a estar.”
 
Portugal em todo o seu esplendor, isto! 

PATÉTICO



É a palavra que me ocorre refletindo sobre alguns traços do primeiro dia de debate do orçamento de 2013.
Desde a invocação das conotações “salazarentas” do discurso do ministro das Finanças feitas por deputados como João Galamba e Honório Novo (mas quem é que atribui alguma conotação a este discurso?) até à antidemocrática invocação por Vítor Gaspar dos riscos do dilúvio associados à desunião e sectarismo, tudo soa a ecos patéticos do que não precisamos deste momento.
Mas não entender que é a trajetória seguida de aplicação distorcida e cega de uma estratégia de consolidação fiscal que está a provocar a “desunião nacional” e a flagelar a coesão entre os portugueses não é menos patético.

A MISÉRIA FEITA MINIMALISMO







O ilustrador do “El País”, Andrés Rábago García (“El Roto”), volta ao nosso convívio numa seleção de imagens que marcaram um mês em que foi especialmente cáustico: a vergonha de ser de qualquer sítio, a necessidade de pensar como os que não pensam, a publicação sem tinta do que não se pode dizer, a criação de desertos para que surjam oásis, as letras que não contam perante a ditadura dos números e a miséria aparentando minimalismo…

A NATUREZA E O HOMEM



UMA TARDE DIFERENTE



Duas atividades em termos de registo pessoal que proporcionaram uma tarde diferente.
A primeira, para ouvir o colega da Faculdade de Economia do Porto, Professor José Varejão, falar sobre um trabalho realizado por encomenda da Secretaria de Estado do Emprego, em colaboração com a investigadora Professora Mónica Dias, centrado na Avaliação das Medidas de Políticas Ativas de Emprego. Este trabalho passa despercebido na página WEB do Ministério da Economia e do Emprego, o que ilustra bem as debilidades comunicacionais deste ministério. O estudo interessa-me, pois é um dos exemplos pioneiros de utilização da chamada avaliação contrafactual (causal), que consiste grosso modo na comparação do impacto sobre a empregabilidade de públicos beneficiários das políticas ativas de emprego com um grupo de controlo de indivíduos não beneficiários dessas políticas. Independentemente da sofisticação econométrica dos métodos utilizados, este tipo de trabalhos, em conjugação com métodos mais qualitativos e menos sofisticados, é crucial para viabilizar um bom debate sobre a “cost effectiveness” das políticas ativas de emprego. O estudo é talvez muito ambicioso pretendendo avaliar o pacote integrado das medidas ativas, envolvendo não apenas medidas de emprego mas também de formação. Mas contém resultados que vale a pena refletir em posts subsequentes.
A segunda atividade para uma tarde diferente consistiu no início da minha participação como ouvinte atento no curso dirigido pelo Professor Abílio Hernandez Cardoso sobre História do Cinema, na Universidade Portucalense (Cátedra Manuel Oliveira). E para começar a análise de uma cena dos Pássaros de Hitchcock, um plano de sequência fabuloso de Touch of Evil de Orson Welles e a preparação conceptual da cena quase final do batismo do Padrinho I (Coppolla) foram uma boa estreia e estímulo para rever materiais, registos, impressões, recortes de tempos já longínquos. Mas o tempo disponível é tão curto e as escolhas culturais cada vez mais difíceis de assumir e concretizar …