Confesso que as minhas frequentes oportunidades de aproximação à realidade política do Brasil me levaram a alimentar uma certa sedução pela história de vida de um mineiro de 66 anos chamado José Dirceu.
Líder estudantil nos anos 60, foi detido em 1968, deportado para o México com mais 14 presos políticos em troca do embaixador americano, exilou-se em Cuba, fez plásticas, mudou de nome, voltou ao país e por lá viveu clandestinamente, retornou a Cuba e estabeleceu-se definitivamente no Brasil em 1979. Mas, além de tudo isso, ostenta o extremo requinte de ter protagonizado um romance de contornos marcadamente originais.
Em 1975, após ter modificado a sua aparência através de uma cirurgia plástica realizada em Cuba que lhe moldou as maçãs do rosto e fez um novo nariz e de uma decisão de passar a usar bigode e óculos, Dirceu instalou-se clandestinamente em Cruzeiro do Oeste (interior do Estado do Paraná) sob o nome falso de Carlos Henrique Gouveia de Mello, tornando-se proprietário de uma confeção. Por lá se casou com Clara Becker, a quem omitiu o passado e a identidade e com quem foi pai de José Carlos Becker Gouveia de Mello (hoje Zeca Dirceu) em 1978. Emocionante, reconheça-se!
Após o regresso da democracia, Dirceu ajudou a fundar o PT (Partido dos Trabalhadores), que acabaria por levar Lula ao poder em 2003, e exerceu intensa atividade política: foi deputado estadual e federal, esteve no centro do “impeachment” de Collor, foi candidato vencido na disputa pelo governo de São Paulo – uma derrota (terceiro mais votado) que lhe cerceou outros voos – e presidente do PT desde 1995.
Mas foi enquanto número dois do presidente (Ministro-Chefe da Casa Civil) que “o caldo se entornou”, levando-o em 2005 à demissão sob acusação de envolvimento no escândalo do “Mensalão” e a uma posterior cassação de mandato pela Câmara dos Deputados e subsequente inegibilidade por 10 anos.
Desse momento em diante, a figura de Dirceu foi sendo objeto de um continuado desgaste, muito também por via de uma culpa e obra própria que lhe valeram o cognome de “poderoso chefão” (“o padrinho” em português brasileiro), uma evolução que culminou esta semana com a sua condenação nos tribunais por corrupção ativa.
A vida é madrasta e este mundo não está mesmo para veleidades heróicas!
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