segunda-feira, 15 de outubro de 2012

DO FUNCHAL



Por estranha ironia de uma vida de andarilho da consultadoria, cabe-me falar do êxito eleitoral socialista a partir do Funchal, mas não há contradição. Apesar das diferenças notórias entre as duas autonomias, a dos Açores e da Madeira, elas constituem a meu ver uma das mais significativas realizações da democracia portuguesa. Podemos assinalar na progressão das autonomias desvios, alguns sinais de despesismo controlado, excessos infraestruturais, posso aceitar. Mas não me venham a dizer que são especificidades das autonomias, longe disso. Nada mais do que o poder central não tenha estimulado com o seu próprio exemplo.
Na minha vida de profundo contacto com as autonomias, há dois aspetos que sempre me impressionaram: a qualidade de algum pensamento político nos Açores, assente numa sólida base cultural, e de partes relevantes da administração pública regional na Madeira, contrastando esta com o folclore da sua principal liderança política. Aliás, a liderança política de Alberto João Jardim é no plano interno, nacional e regional, bem diferente da sua imagem e prática exterior, ou seja a que é desenvolvida em instituições internacionais.
Mas o que me traz aqui hoje é o destaque das eleições açorianas e sobretudo a mestria com que Carlos César arquitetou a sua sucessão, num ato eleitoral em que, mesmo dada a conhecida influência da situação nacional, o PSD ainda reforçou a sua votação. E, neste caso, não pode deixar-se de reconhecer a elevação de todo o processo eleitoral, a qualidade do singelo discurso de vitória de Vasco Cordeiro preparando tempos difíceis e a difícil situação em que Berta Cabral se viu envolvida com a aceleração da queda e desorientação do governo de Passos Coelho. Ou seja, uma vez mais a autonomia açoriana dá mostras de consolidação, pondo em sentido possíveis vendilhões das autonomias refugiados no alibi da consolidação orçamental.
Isso não significa que o modelo açoriano não enfrente desafios sérios nos próximos tempos. A dupla ultraperiferia açoriana, o seu caráter longínquo e a fragmentação territorial exigirão sempre uma almofada pública. Mas o desafio principal é conseguir que essa almofada pública não iniba, antes promova uma dinamização empresarial mais eficaz, valorizando mais o conhecimento, a singularidade ambiental da Região, a sua inserção geoestratégica territorial e a melhoria de qualificações de ativos entretanto observada. Esperemos que Vasco Cordeiro esteja consciente destes desafios e mobilize um executivo nesse sentido.

Sem comentários:

Enviar um comentário