sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O “DEBATE” DO MÊS


No meio de toda a parafernália de opções com que este mês nos foram tentando entreter/enganar – já não há pachorra para ouvir os entendidos sobre os cautelares suaves e duros, o cenário irlandês e a saída limpa! –, o lúcido Luís Afonso ilustra hoje na “Sábado” aquela que parece ser a grande razão de aflição dos cidadãos mais conscientes perante a verdadeira encruzilhada/abismo que Portugal tem pela frente...

DESIGUALDADE: BORN IN USA




O discurso do Estado da Nação de Obama voltou a colocar o tema da desigualdade na agenda política americana, como algo que está a minar alguma das características de oportunidades de mobilidade social em regra imputadas ao modelo americano.
No dia 27 passado, Jared Bernstein no Economix do New York Times situava a questão em termos muito simples que vale a pena aqui reproduzir.
Primeira visualização do problema: enquanto que a mediana do salário real de trabalhadores a tempo inteiro desceu significativamente após 2007, a percentagem dos lucros empresariais no rendimento nacional atingiu valores muito elevados face à história americana. Moral da história: a estagnação do salário horário projeta-se na pujança dos lucros. Bernstein põe em evidência que mesmo em termos médios a remuneração real tem aumentado menos do que a produtividade, apesar também da percentagem de trabalhadores com salários mais baixos com alguma educação ter vindo a aumentar na economia americana desde 1960.

Segunda visualização: o comportamento dinâmico divergente do custo unitário em trabalho e do lucro unitário, penalizando o primeiro, mostra que tendo em conta o crescimento da produtividade favorece os lucros.
Jared Bernstein sintetiza o problema, mostrando que o contrato social americano está em perigo: o “estuda, trabalha duro, respeita as regras e terás oportunidades de compensação” parece estar bloqueado.
Born in USA: apenas?

PORQUE NÃO TE CALAS? (19)


Ainda a propósito da demissão do professor Bessa da presidência da Assembleia Municipal do Porto, ao que parece para dar lugar a um desconhecido (embora de boas famílias, uma mistura de Pereira Leite com Espregueira Mendes) militante do CDS que apenas ocupava o quarto na lista da candidatura “Porto, o nosso Partido” – o que pensarão disto aqueles muitos portuenses que votaram na independência de Rui Moreira ou numa mudança em relação à riista coligação PSD/CDS? –, constate-se acima a espantosa reação do líder distrital do PS ao facto. Prevalece, portanto, aquela pergunta cuja resposta me continua a transcender: porque será que há gente que tanto gosta de falar, mesmo quando não tem nada para dizer?

CURIOSIDADES (1)


Ainda a propósito de Steve Jobs – uma personalidade bem complexa, como aliás todos quantos foram tocados pela genialidade, assim pude confirmar ao ver no sofá o recente filme que lhe é dedicado e perdera aquando da sua breve passagem pelo cinema –, e enquanto recrudescem os rumores de que a Apple prepara um mistery new product line ou next big thing, justifica-se não perder de vista as tendências reveladas pelas vendas dos seus produtos nesta primeira e ainda ínfima parte do século XXI. Cinquenta e um milhões de iPhones é um número tão estonteante e vertiginoso quanto o lento passo de tartaruga que o devir dele fará?

MAIS MAONOMICS


É extremamente instrutivo analisar a evolução que trouxe o grupo chinês Lenovo ao primeiro plano do negócio internacional, sobretudo desde que Yang Yuanqing assumiu a sua presidência em 2005 e deu início a uma estratégia global agressiva com a compra da divisão de PC’s da IBM.

Por estes dias, a referida estratégia conheceu dois passos relevantes: primeiro, a compra do negócio deficitário de servers da IBM por via de um acordo avaliado em 2,3 mil milhões de dólares (divididos entre cash e ações) visto como podendo contribuir para a consolidação da sua liderança num mercado maduro ou em declínio como o dos PC’s (através do duplo racional de se tratar de um negócio de margens mais altas e de um deal concretizável a um múltiplo de vendas de 0,5, considerado muito aceitável); segundo, a aquisição da Motorola à Google por 2,9 mil milhões de dólares, confirmando uma ambição de disputa numa área em que a força da Samsung está ainda a léguas de distância (veja-se, p.e., a sua capitalização bolsista de 160 mil milhões de dólares, mais de dez vezes superior à da Lenovo) e não destituída de riscos em termos do respetivo payoff (apesar do acesso assim facilitado ao mercado americano e do correspondente potencial de  upgrade em margens, a Motorola perdeu 1,2 mil milhões de dólares em 2013).

E assim se vai cumprindo o sonho a que Yang prometeu consagrar a sua energia e carreira: fazer o orgulho de todo o país ao posicionar um produto chinês como a Lenovo no primeiro plano mundial do setor das tecnologias de informação...

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

MAONOMICS


Num post de há dias (22 do corrente) dei aqui conta sem grande aprofundamento das acabadas de desvendar habilidades da elite chinesa em matérias relacionadas com “o capital” e certas formas protegidas que utilizam para o entesourar. Logo na ocasião, fiquei com a impressão de ter tomado contacto com algo de complementar em artigo recente, pus-me à procura e aí está a curiosa infografia “Poder e dinheiro” acima reproduzida.

Vejamos apenas dois dos dados mais espantosos que nela surgem revelados: (i) enquanto os 50 congressistas mais ricos dos Estados Unidos da América possuem uma fortuna avaliada num total de 1,6 mil milhões de dólares, o património dos equivalentes 50 delegados ao Congresso Nacional Popular da República Popular da China é estimado em quase sessenta vezes mais (94,7 mil milhões de dólares); (ii) enquanto o congressista americano mais rico vale 355 milhões de dólares, o delegado chinês menos abonado vale 600 milhões e o mais rico (e família) é o patrão do principal grupo fabricante de bebidas do país (“Wahaha”) e detém 18,7 mil milhões de dólares (12 isoladamente segundo a “Forbes”, que o classifica como o terceiro homem mais rico da China).

Anda por aí um livro premiado de uma experimentada autora italiana que, pertinentemente, pretende contribuir para explicar o aparente paradoxo de os comunistas chineses fazerem “melhores capitalistas do que nós”. Tem por título “Maonomics” e inclui bastante informação e alguma reflexão inspiradora…


SÓ POR HOJE



Trabalho que baste e sobretudo complexo porque se trata de concretizar exercícios de avaliação ex-ante de programas operacionais 2014-2020 no reino da incerteza ainda reinante e com grande confusão de informação disponível para as trabalhar. Por isso, pouco tempo para “blogar”, limitado hoje a uma reflexão singela sobre um raro e profundo momento de realismo social radiofónico. No meio do tráfego e atormentado por uma humidade que nos massacra as “guelras”, apanha-se um momento de realismo na reportagem de hoje na TSF, no período depois do noticiário das 19. Uma reportagem de  Cristina Santos e Alexandrina Guerreiro (sonoplastia) sobre gente sem abrigo reconhecida pela Santa Casa de Misericórdia de Lisboa como tendo formação superior com frequência avançada da universidade.
Largamos a representatividade estatística, a correção do método, a pureza e rigor das fontes para simplesmente ouvir gente que se deixou cair, seja na droga seja no seu sucedâneo do álcool, mesmo que hoje abandonada a primeira e controlado o segundo. Gente que se deixou cair, todos podemos ter momentos desses, e que percorre penosamente na rua o eventual percurso de regresso, que provavelmente nunca chegará para alguns. Gente que gosta de música clássica como qualquer um de nós, que traz sempre um livro no bolso mais largo, que visita vezes sem conta os bancos mais amigáveis dos jardins mais aprazíveis e não condicionados para desincentivar a passagem da noite.
O choque afetuoso com a temperatura da nossa casa aquecida e confortável que nos acolhe depois de um dia intenso de trabalho não apaga o impacto do realismo social radiofónico de Cristina Santos e Alexandrina Guerreiro.
Só por hoje é simplesmente a verbalização por parte de um dos protagonistas da reportagem da sua sobrevivência diária.

CORRELAÇÃO OU ACASO?



Pergunto-me se existirá alguma hipótese de ligação entre estes excertos de capa do JN de ontem e do DN de hoje...

CÁTEDRA JEAN MONNET DA VACUIDADE


A senhora acha-se estrela e polivalente. Não perde nenhuma oportunidade para botar faladura, sobretudo nos media, não lhe importando o local nem o tema mas sim aparecer dizendo o que quer que lhe passe pela cabeça ou venha à boca – porque a imagem é que faz a glória de cada momento...

Apanhei-lhe, por estes dias, um daqueles seus comentários verdadeiramente determinantes, originais e incisivos a propósito do programa da Presidência Grega da União Europeia: “Claro que o programa é um programa ambicioso, pelas razões que referi não sei se será concretizável no curto espaço de que dispõe, mas penso que sim que é importante que a Grécia com a sua experiência – e até mesmo com o conhecimento que tem das consequências da crise – possa batalhar para que, por exemplo, se chegue à união bancária, para que haja uma maior atenção às políticas sociais, para defender o modelo social europeu e para que haja políticas voltadas para o crescimento económico e para a criação de emprego”.

Depois do êxito que obteve com “Saber Escrever Saber Falar”, estará esta tão extraordinária filóloga e política a preparar um cada vez mais necessário “Dicionário de Ideias Feitas”?

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

MARIA, SEM PAPAS NA LÍNGUA



O debate em torno da ciência em Portugal está vivo e a comunidade científica parece ter despertado finalmente de uma letargia típica de tempos com ventos favoráveis, de valorização do estatuto da ciência e com grande dificuldade de pronunciamento sobre os problemas do país. Essa letargia prolongou-se por algum tempo para além do início dos apertos orçamentais, talvez devido à comparação favorável com a vizinha Espanha, onde as diabruras do Governo de Rajoy cavaram mais fundo nos orçamentos da investigação científica, e nas regiões Norte e Centro a um contributo inestimável dos Programas Operacionais Norte e Centro (conheço melhor os apoios do primeiro) que proporcionaram a algumas equipas científicas e respetivas infraestruturas laboratoriais e físicas apoios não despiciendos em contexto de rarefação de fundos públicos.

A letargia da comunidade científica prolongou-se também na incapacidade real de compreender ao que o ministro Crato e seus colaboradores vinham nesta matéria. Afinal trata-se de pares entre pares, questão extensiva não apenas à Secretária de Estado da Ciência Leonor Parreira e ao Presidente da FCT Miguel Seabra, ambos curiosamente (e se calhar não) investigadores relevantes na área das ciências da vida. Terá passado o pensamento de que pares não penalizam pares, embora aqui se trate de pares, sobretudo a Secretária de Estado e o Presidente da FCT, concentrados nas ciências da vida, que publicam incessantemente e têm um reconhecimento internacional indiscutível. Mas é estranho que a comunidade científica não tenha compreendido que o ministro Crato, não navegando nas mesmas águas da densidade de publicações e citações internacionais das ciências da vida, rapidamente deu mostras de que vinha para combater paradigmas anteriores sem construir nada de novo e de coerente, deixando atrás de si um rasto de vazio estratégico muito preocupante. Mas a comunidade científica pareceu admitir que ficaria a salvo de qualquer arremetida dessa natureza. Pois enganou-se e redondamente. Pois Crato para além de deixar rasto de vazio estratégico, revelou-se frágil quanto baste e não foi capaz de junto do Ministério das Finanças e primeiro-Ministro defender a dama e fazer valer o que pode valer o reconhecimento internacional do nosso potencial científico.
E por isso, muito por força da revolta de jovens cientistas a quem foi prometido uma outra trajetória de progressão e da reatividade de áreas científicas mais frágeis e sem a defesa das ciências da vida, acabou a referida letargia. E insurgiu-se contra o vazio estratégico.
Como é óbvio, o poder de autoridade de quem fala e se insurge não é homogéneo.
A cientista e Professora Emérita da Universidade do Porto Maria de Sousa quando fala é para escutar. Maria de Sousa trouxe para Portugal e sobretudo para o Porto e Instituto Abel Salazar (Ciências Biomédicas) um novo fôlego vindo do exterior com um rasto de reconhecimento a nível internacional atrás de si. Trouxe sobretudo o poder de mobilização e atração de jovens para uma carreira científica, retirando algumas teias de aranha de cabeças eméritas mas que nunca viveram o ambiente das grandes massas científicas de grandes universidades por esse mundo. Recordo-me que, nos tempos saudosos de tertúlia da Resultante, associação cívica, com amigos como o Professor Nuno Grande (já desaparecido), o Arquiteto Lixa Filgueiras (também), o Engº Rui Oliveira e gente então mais nova como eu próprio, o Arquiteto Nuno Guedes de Oliveira (também já desaparecido), algum tempo do Professor Abílio Cardoso (também desaparecido) e o Engº Manuel Miranda, se discutiu vivamente o teor de mudança que Maria de Sousa simbolizava e o que a sua vinda para Portugal poderia representar do ponto de vista da mudança de paradigma da investigação em Portugal. Ainda há dias, o muito prestigiado investigador Rui Costa da Fundação Champalimaud fazia referência ao que significou a sua passagem da Guarda pelo Porto (Ciências Biomédicas) e o nome de Maria de Sousa foi inevitavelmente referido como o grande atractor desse tempo.
O pretexto da crónica é a reação desrespeitosa e deselegante de Miguel Seabra a uma carta aberta liderada por Manuel Sobrinho Simões (MSS) também no Público, despachando-o com a ideia de que MSS é um entre 50.000.
Ora, sem papas na língua, Maria de Sousa hoje no Público convida polidamente o Presidente da FCT a continuar a publicar na Lancet ou em outras revistas de ponta, mas a abandonar a sua insuficiente representação dos investigadores portugueses. Maria de Sousa sublinha com finura que “o número de grandes investigadores que conseguiram conciliar as suas qualidades de investigador com a qualidade de grandes administradores da política científica é, na minha experiência em vários países, muito pequeno”. Crítica impiedosa de luva branca, atestado de não representatividade dos interesses dos investigadores ao Presidente da FCT, com Miguel Seabra claramente touché.
A discussão vai no adro e as sucessivas desconfianças que estão a surgir sobre os resultados dos júris de apreciação de bolsas de investigação, alteradas posteriormente pela própria FCT, não vão ficar por aqui em matéria de réplicas. A comunidade científica não passa ao lado das questões de poder, falta de ética e perversidade também passam pela ciência e seria democrático que todos os painéis fossem divulgados, escrutinados e sujeitos a alguma renovação. A ciência não é uma virgem púdica e santificada.
Mas esta crónica de Maria de Sousa coloca Miguel Seabra numa posição muito frágil. E não será de excluir a falta de cobertura política da Secretária de Estado. O que seria curioso pois tudo seria operado no interior das ciências da vida. Quem diria!

POSTIGA PELO POSTIGO

Em 2003, foi satisfeito que cumprimentei o meu amigo Fernando Gomes pelo negócio dois em um que fizera em Londres para o clube da minha preferência: ver-se livre de Hélder Postiga e ainda encaixar 9 milhões de euros pela sua venda ao Tottenham. Estava então longe de pensar que o dito futebolista funcionaria em termos de carreira como uma espécie de gato com mais de sete vidas: no final de uma época falhada ameaçou ir para o Benfica mas voltou para o Porto, depois foi emprestado a um clube francês (Saint-Étienne), voltou a regressar, foi novamente objeto de empréstimo (ao clube grego Panathinaikos), revogou a sua promessa de fidelidade portista e aceitou ser contratado pelo Sporting, despacharam-no para o Zaragoza da liga espanhola, de onde passou para o Valência de que agora acaba de ser transferido para a Lazio de Roma. Qual será o verdadeiro encanto deste rapaz, que só fica atrás do calo de banco/bancada de Hilário mas se constituiu num campeão em experiência turística e ganhos de comissões?

DUX


Um exemplar elucidativo, se preciso fora...