quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

UMA QUESTÃO DE SAPATOS


Vejamos o affaire do alegado envolvimento do presidente francês com Julie Gayet através do mais intelectualizado ângulo cross-cultural da diversidade europeia. Tomando por amostra as primeiras páginas dos principais jornais de hoje, concluo: nada nos eslavos e similares da Europa Central e Oriental (a Grécia é reconhecidamente um caso aparte), quase nada nos dos países nórdicos (a exceção é aquele cantinho em dinamarquês), pouco nos germânicos e germanófilos (as exceções são o discreto “Spiegel” do dia e o “Metro” de Amesterdão), alguma coisa nos britânicos e aparentados (incluindo o circunspecto “The Guardian” e o seu sarcástico título “Hollande tem muito a dizer – exceto sobre um assunto”), demais na periferia latina a sul (acima, apenas alguns morceaux choisis).



Por outro lado, e enquanto o very british “The Times” não deixava fugir a imperdível oportunidade de galhofar e zurzir nos seus velhos amigos franceses, recorrendo ao traço inspirado de Peter Brookes (http://www.thetimes.co.uk) nos dois exemplares cartunes acima reproduzidos, o assunto já suscita grandes precisões técnicas em torno do fabrico de sapatos com a “GQ” a sustentar que os seus colegas da “Closer” terão grosseiramente confundido as marcas “Derby” e “Richelieu” (imagem abaixo) – deixo, para os mais curiosos, a explicação na respetiva língua materna: “La différence se trouve dans le système de fabrication de la chaussure. On l’identifie plus précisément au laçage. Les bords (ou ailes de claques) d’une richelieu sont à touche-touche, on s’y glisse à l’aide d’un chausse-pied, le lacet est quasi décoratif. Les derbies, plus lâches et ouvertes, nécessitent absolument un laçage digne de ce nom pour rester fidèle au pied.“ Uma maravilha, este eminente (e iminente?) RichelieuGate!


Sendo ainda que a questão essencial é a que surge equacionada pelo “Le Monde”: “pode o presidente ter uma vida privada?”. Uma questão que nos faz, aliás, regressar à sempre presente centralidade dessa complexa dialética entre o público e o privado que tão cara é aos princípios orientadores deste blogue – uma matéria que valeria a pena discutir, aqui ou alhures, se verdadeiramente houvesse com quem nesta terra perdida no meio de nenhures...

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