James Surowiecki tem esta semana na New Yorker uma excelente peça sobre
alguns ventos de mudança que se vão observando em Wall Street sobre o culto do
sobretrabalho. O fenómeno passou pela banda de cá mas não com a expressão que
ele teve nos Estados Unidos. Surowiecki fala, por exemplo, de que era vulgar os
jovens analistas financeiros aceitarem trabalhar 15 horas por dia em troca de
remunerações relativamente elevadas e um vislumbre de riqueza. O fenómeno é
explicável em contextos de contágio psicológico e de emulação coletiva da qual
a saída significa perdas individuais óbvias.
O artigo destaca as mudanças que entidades
financeiras como a Goldman Sachs, a Merrill Lynch e o Crédit Suisse
introduziram que vão desde não trabalhar ao sábado (proibindo o acesso às
instalações), não ultrapassar o máximo de 70 a 75 horas por semana ou gozar quatro
dias de folga por mês. Há registos de que tais sinais podem considerar-se
mudanças radicais face a práticas que ascendiam a 120 horas de trabalho por
semana.
Estes excessos parecem incompreensíveis face a
estudos disponíveis que mostram que a performance cognitiva diminui acentuadamente
com o excesso e fadiga no trabalho. Surowiecki analisa algumas explicações possíveis,
tais como os efeitos perversos que resultam de remunerações à hora que
potenciam a extensividade. Pelo que pude elaborar sobre o assunto, é difícil encontrar
explicação de caráter económico para esta cumplicidade, até porque neste tipo
de trabalhadores continua a não haver medidas robustas de produtividade e com
isso ausência de método para comparar custos e benefícios de prática tão
doentia.
Inclino-me para uma explicação de natureza
intra-organizacional, baseada essencialmente em fenómenos de emulação coletiva,
autênticos rituais de compromisso, do tipo “eu sou mais comprometido com a
empresa do que o meu colega”, potenciados por modelos de gestão de recursos
humanos que acenam com a cenoura dos sobreganhos do setor financeiro. Uma espécie
de loucura consentida, internalizada pelos que jogam o jogo, aqui e ali
reforçada por algum doping de circunstância ou de continuidade mais ou menos
viciosa.
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