Como já provavelmente
se aperceberam sou um fanático da New
Yorker. Esse apego pode valer-me algum risco de identificação com o snobismo
jornalístico, tipicamente nova-iorquino, mas a qualidade da revista vale bem
esse risco e o montante da assinatura digital e em papel. E ainda mais se me
aguçou esse apetite quando, já há aqui alguns anos, não sei se ainda se
recordam, a nossa protegida do já desaparecido Stephen Jay Gould, Clara Pinto
Correia, foi apanhada num plágio evidente da New Yorker numa das suas crónicas para um jornal qualquer que já se
me varreu da memória. A partir daí, comecei a ler ainda com mais atenção a
revista, esperançado em apanhar mais alguém em flagrante.
Volto ao tema porque,
no seu número de 29 de Outubro de 2012, a revista publica um editorial designado de “A Escolha” em que assume frontalmente o seu apoio à reeleição de Obama,
com base numa análise crítica frontal, honesta e não laudatória das realizações
associadas ao primeiro mandato do agora candidato. Gosto que os jornais se
identifiquem e que não nos queiram vender gato por lebre. A New Yorker, o Economist ou o Wall Street
Journal são jornais que se assumem, que explicitam bem os seus padrões de
valores e convicções. Gosto disso e não de jornalismo que se esconde por detrás
de uma pretensa neutralidade.
O editorial é uma peça
que considero notável e recomendo vivamente a sua leitura.
Destaco apenas alguns
elementos, esperando com isso aguçar a curiosidade de quem queira ter a
pachorra de o ler.
A herança económica e
política de Bush é impiedosamente documentada, bem como a sistemática tentativa
de no Congresso os Republicanos assumiram de torpedear tudo o que se afigurasse
inovação e promessa eleitoral do Presidente.
A relevância económica
e política do American Recovery and Reinvestment Act
de 2009, o já aqui referido pacote de estímulo fiscal, abaixo do que se exigia
e do que Christina Romer tinha recomendado em sede de Council of Advisors, é apresentado como um dos mais difíceis atos
presidenciais suscetíveis de capitalização política. As razões dessa dificuldade
interessam-me vivamente sobretudo como avaliador de políticas. Obama terá confessado
a um jornalista que “é sempre difícil demonstrar a efetividade de um
contrafactual”. O que é que Obama quer dizer com isto. Quer dizer que o pacote
de estímulo fiscal colocou a economia americana numa situação bem melhor do que
teria se não tivesse havido o estímulo fiscal, embora num contexto geral em que
o desemprego e o crescimento anémico persistem. Os defensores de um estímulo
fiscal mais forte dirão que a economia americana teria recuperado bem mais
depressa com um estímulo na ordem de grandeza que economistas como Christina
Romer desejariam.
Outros aspetos são
percorridos, como a proteção dos direitos cívicos de minorias, o Patient Protection and Affordable Care
Act (ainda longe do Medicare for All),
a frente externa, algumas das suas fragilidades (primeiro debate com Romney).
Quanto às razões para
o não apoio a Romney, destaco apenas três ideias: uma, que é uma citação de
Roosevelt: “Devemos ser testados não porque aumentámos a abundância dos que já
têm muito, mas antes pelo que pudemos fazer em relação aos que têm pouco”; a
segunda é uma delícia: “Ter contas bancárias no estrangeiro não é um sucedâneo da
experiência em política externa”; o argumento final: “A escolha é clara. O
bilhete Romney-Ryan representa uma visão constrangedora e retrógrada da América:
a privatização do bem público”.
Jornalismo do falar
claro, goste-se ou não se goste.
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