sábado, 19 de novembro de 2016

OS POLÍTICOS E O PIB




(Reflexões sobre a ilusória influência dos políticos no crescimento económico, matéria particularmente útil para compreender as consequências da informação económica preliminar do INE quanto às Contas Nacionais…)

Num dos raros momentos virtuosos e apelativos do Quadratura do Círculo dos últimos tempos, em que o senso comum de Jorge Coelho e alguma incapacidade de Pacheco Pereira para compreender os verdadeiros problemas da economia portuguesa, com ou sem Comissão Europeia a pressionar, dão oportunidade a Lobo Xavier para dizer alguma coisa de diferente, este último fez referência à péssima prática dos políticos em Portugal cavalgarem os dados macroeconómicos. Claro que há várias maneiras de bem cavalgar toda a sela os dados macroeconómicos, mas o alerta de Lobo Xavier é inteligente e precioso, sobretudo no contexto de uma economia portuguesa em que a base estrutural dos seus principais problemas torna precipitada qualquer tentativa de estabelecimento de correlações entre estímulos de política pública e comportamento dinâmico do PIB. O já aqui comentado inesperado crescimento do PIB português no terceiro trimestre do corrente ano nem constitui um certificado de validação global da governação atual em matéria económica, nem por outro lado significa que alguns dos problemas estruturais da economia portuguesa tenham por encanto desaparecido. Mas que o ambiente macroeconómico está desanuviado isso está claro que assim acontece, embora tenhamos de reconhecer que esse desanuviamento não penetrou ainda as condições a que a economia portuguesa poderia financiar-se sem a sombra protetora do BCE.

Referi no meu último post sobre a matéria que, sem toda a informação das Contas Nacionais do terceiro trimestre, o que pode no mínimo dizer-se é que a política de reposição moderada de rendimentos não penalizou o comportamento dinâmico das exportações. Mas que foi a procura externa a assegurar o comportamento inesperado do PIB neste trimestre parece não haver dúvidas. Tal como referi nesse post, a principal interrogação consiste em saber se o bom desempenho das exportações neste trimestre, apreciável atendendo à anemia do crescimento europeu, aconteceu com a capacidade produtiva já instalada ou se, pelo contrário, ele refletirá já alguma animação do investimento privado. Não é indiferente ter acontecido uma ou outra destas duas situações. A variável investimento é a que melhor traduz os efeitos das expectativas quanto ao estado da arte da governação. Um diferimento das intenções de investimento pode refletir a letargia dos mercados de destino das exportações e a incerteza quanto ao comportamento dos mercados mundiais, mas também pode ser a consequência de uma avaliação insegura do que a governação atual tem para oferecer às empresas. Não será, por isso, indiferente, que o investimento tenha ou não reanimado, mesmo que a ritmos incipientes.

É verdade que o senso comum de Jorge Coelho pode ser em parte invocado quando ele diz que o comportamento do PIB e o pelo menos aparente convencimento de Bruxelas quanto às virtudes do otimismo da governação atual podem provocar o chamado clique das expectativas, segundo a fórmula “isto pode mesmo funcionar”. De qualquer modo, manda o bom rigor de que é precipitado colocar neste acordar do crescimento económico uma grande dose de influência da governação, com exceção claro está da recuperação empreendida na execução dos apoios dos Fundos Estruturais ao investimento privado. Por isso, há espaço também para acomodar o desabafo de Lobo Xavier quando ele reporta às empresas o grande contributo para o crescimento das exportações observado neste trimestre. Com razão.

Resta o problema de saber o que é que a governação atual tem para oferecer à minimização dos tais problemas estruturais que bloqueiam a economia portuguesa para um posicionamento mais sustentado e menos vulnerável no mercado global continuando na zona euro. Em meu entender, o que há essencialmente a fazer pode resumir-se em duas palavras: persistência e firmeza no rumo. O que é que quero dizer com isto? Quero significar que o problema da economia portuguesa não é a ausência de mudança e de inovação. O problema está em que essa mudança e essa inovação são veiculadas através de uma massa de empresas que não é ainda suficiente para influenciar os padrões médios de comportamento da indústria e dos serviços. O problema está em gerir a maturação dos efeitos de disseminação e alargamento do que de bom existe nessas matérias. Os efeitos dos start-up’s de base tecnológica, que importa como é óbvio generalizar e aumentar a sua massa crítica, nunca serão por si sós suficientes para assegurar o esbatimento da questão estrutural global. É por isso crucial aumentar a massa crítica das empresas já instaladas suscetíveis de protagonizar estratégias de mudança e inovação na economia global e com isso aumentar decisivamente a percentagem de exportações no PIB que uma economia com a dimensão da portuguesa pode perfeitamente atingir, entrando em intervalos de mais de 50% do PIB exportado. Essa é a questão crucial. Aí o que se pede é persistência de orientação e rumo, seguindo aliás a panóplia de instrumentos de política pública que os fundos estruturais têm permitido garantir em termos de apoios à inovação e internacional. É também uma persistência de orientação e de rumo que se pede a uma maior intensidade de transferência e valorização do conhecimento para as empresas, já iniciado sobretudo com o período de programação do QREN.

Moral da história: persistência de orientação e de rumo até é compatível com um perfil de Ministro da Economia como o de Caldeira Cabral, boas novas para ele, mesmo que o nosso jornalismo económico teime em ver as coisas à superfície. A sua formação não dá para mais, dos jornalistas que não do Ministro, esclareça-se.

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