(Reflexões em
torno de um artigo de Dani Rodrik no Project Syndicate, que veio ao encontro de ideias já afloradas
neste blogue…)
Hoje, a meio
da manhã, numa curta viagem entre o escritório e o local da reunião, apanhei um
daqueles espaços de discussão na Antena 1, no qual um ouvinte se insurgia
contra o facto do telefone estar ocupado pela intervenção de vários economistas,
perguntando algo zangado ao moderador se o fórum era para os ouvintes poderem
intervir ou se era para ficar ocupado por tais personalidades. O azedume era
claro, talvez devido à necessidade do ouvinte dar o seu apoio à solução governativa
em curso, identificando o tal grupo de economistas entre os que “só deitam para
baixo o país” (expressão do ouvinte).
Não tenho elementos
para confirmar se o agastamento do ouvinte era o produto de estar impedido de
participar por opiniões que iam contra o que desejava exprimir ou se o azedume era
um indicador da irrelevância dos economistas.
Utilizo este
facto impressivo da minha passagem pela rádio pública esta manhã para suscitar
o tema que me interessa tratar que é o da irrelevância dos economistas e do
pensamento que produzem como fator de alerta ou convencimento das populações
eleitoras quanto a derivas políticas que interessa combater. Já aqui me referi
a um manifesto de economistas Nobel de Economia, que integrava no grupo de signatários
da carta aberta aos eleitores americanos economistas e pensamento que eu nunca julguei
ser possível reunir numa tomada de posição pública, reunindo algo e o seu contrário,
paradigmas que se combatem no jogo da reprodução do conhecimento nas
Universidades. Esse manifesto preocupou-me e alertou-me para o que poderia estar
a acontecer com as eleições americanas, tamanho foi o significado que atribuí à
inesperada convergência no combate à ameaça Trump. O referido manifesto não terá
produzido o mínimo impacto eleitoral, o que veio reforçar a minha convicção de
que a VOZ dos economistas está em baixa.
O último artigo de Dani Rodrik no Project Syndicate agarra o tema por uma outra
perspetiva, que é afinal o dos efeitos do comércio internacional e da
globalização em geral, que é o domínio de especialização do economista turco-americano,
numa obra que é diferenciadora em tudo o que diz respeito a um pensamento crítico
sobre a globalização.
Rodrik
insiste sobretudo nos erros por omissão na avaliação e publicitação dos efeitos
provocados pelo impulso do comércio internacional e da integração económica dos
países determinados pela desregulamentação e plena liberalização do comércio. Nomeadamente
no que respeita aos acordos internacionais e aos impulsos de liberalização conduzidos
pela Organização Mundial do Comércio, Rodrik fala especificamente em enviesamento
sistemático da avaliação dos ganhos dos referidos acordos ou processos de
desregulamentação, sobrevalorizando ganhos, e de minimização de riscos e
perdas, subavaliando-os. O que Rodrik nos diz é que a teoria económica foi
erradamente utilizada para disseminar uma falsa ideia sobre o modelo de win-win
do comércio internacional desregulamentado e plenamente liberalizado, contribuindo
para a manutenção de um “status quo”
de ponderação dos benefícios desse comércio que iria revelar-se ruinoso. É
verdade que uma grande parte das situações de desigualdade e de perda de
rendimento associados à integração económica aprofundada por via do comércio internacional
livre mantêm com os efeitos da tecnologia, também ela globalizada e a difundir-se
a velocidades cada vez mais rápidas, uma relação de forte integração e
potenciação recíproca. O criticismo sobre o comércio internacional livre foi
sempre apontado pelo “establishment académico” ou como um resquício das ideias retrógradas
e bafientas do protecionismo ou então como servindo os interesses desse mesmo
protecionismo, proporcionando-lhe pro bono argumentação. Ironia das ironias, não
foi esse criticismo inteligente do comércio internacional sem regras que instalou
nas economias ocidentais a rejeição da globalização e dos acordos regionais de
comércio livre. Foi antes com os argumentos da perda de emprego, de rendimento
e de condições de mobilidade social ascendente que o espectro do protecionismo volta
a pairar sobre os rumos da economia mundial. Talvez se esse criticismo inteligente
como o de Rodrik tivesse sido ouvido fosse possível corrigir a tempo os desmandos
da globalização. E a VOZ dos economistas fosse mais ouvida.
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