terça-feira, 3 de janeiro de 2017

INDICADORES DE CLIMA ECONÓMICO E DE CONFIANÇA




(Este tipo de indicadores vale o que vale, não podem ser ignorados os seus limites, mas não virá nenhum mal ao mundo se procurarmos uma narrativa para integrar os seus resultados)

O INE acaba de publicar os inquéritos de conjuntura às empresas e aos consumidores, com data de dezembro de 2016. Não houve meio de comunicação que se preze que não tivesse acusado a publicação, com os jornalistas sedentos de encontrar nos resultados louvores ou reprimendas ao governo em funções.

Tem sobretudo interesse a comparação entre o indicador de clima económico, no qual se analisa a confiança na indústria transformadora, na construção civil e obras públicas, no comércio e nos serviços, e o indicador de confiança dos consumidores.

Estes dois indicadores apresentam resultados diferenciados, embora com moderada divergência. O indicador de clima económico revela no último trimestre de 2016 um ligeiro agravamento, que é devido sobretudo ao pessimismo revelado pelos empresários dos setores da construção civil e obras públicas e do comércio, que superou a melhoria de perspetivas registadas na indústria transformadora e nos serviços. Os valores encontrados não exigem uma narrativa de rotura. São sobretudo compreensíveis do ponto de vista do afundamento da construção civil, no âmbito da qual dizia há dias o Engº António Mota responsável da Mota-Engil que o setor não existe a nível nacional. Os sinais de alguma recuperação observada a nível urbano em matéria de renovação de habitações atinge um tecido empresarial de muito pequena dimensão que não é seguramente inquirido. Essa maior intensidade de trabalho na pequena escala da renovação é totalmente esmagada pela hecatombe das obras públicas e das grandes infraestruturas em geral, cuja reanimação por via dos apoios Portugal 2020 tenderá provavelmente a influenciar o indicador apenas no segundo e terceiro trimestres. Na verdade, em matéria de atrasos de execução de Fundos Estruturais na variável investimento há um completo mistério de entupimento burocrático a perturbar todas as boas intenções do Ministro Pedro Marques. Mas talvez o mistério mais profundo seja o ainda não reatado programa JESSICA, pelo qual a existência de instrumentos financeiros a contratualizar com a banca constitui uma oportunidade de apoiar o investimento privado. Tenho informações de que alguma banca, com experiência de intervenção no JESSICA do último período de programação, há perplexa com os atrasos de lançamento do novo programa e não se compreende como politicamente o problema ainda não suscitou qualquer atenção, sobretudo quando o primeiro-Ministro se farta de apresentar a renovação urbana como uma fonte de investimento a apoiar. Mistérios que a competência política deveria resolver. Tenho para mim que a construção civil jamais atingirá o estado de graça em que se movimentou na década de 2000, o que não significa extinção de espécie. Significaria tão só uma mudança saudável de perfil de especialização da economia portuguesa acaso os setores emergentes da mudança estivessem a cumprir o seu papel de novidade.

Narrativa mais difícil de construir é a do comércio, cuja diminuição de expectativas respeitante a atividade futura e evolução de stocks é difícil de explicar com o turismo a bombar nas principais cidades e o indicador de confiança de consumidores em alta. O comportamento do comércio contrasta com o dos serviços, podendo sugerir alguma dualidade entre tradição (comércio) e modernidade (serviços), mas os dados do INE não permitem ir tão longe. Já o comportamento em alta das expectativas da indústria transformadora traduz algum conforto, embora não seja suficiente para evitar a deterioração do clima de confiança económica no último trimestre.

O dado mais impressivo do inquérito de conjuntura do INE é o elevado valor atingido pelo indicador de confiança dos consumidores, o qual atinge o valor máximo captado pelo INE desde 2000. A narrativa do INE reforça a tónica da melhoria de expectativas em termos de desemprego (veja-se o gráfico abaixo) como o fator mais relevante para explicar a confiança dos consumidores. Mas penso que o resultado obtido em matéria de reposição de rendimentos pesa na melhoria das expectativas dos consumidores. 

Com o modelo de recuperação económica em que o país está envolvido, é seguramente confortável a confiança dos consumidores estar em alta. É sobretudo um conforto para as atividades mais diretamente dependentes do mercado interno, embora não possamos enjeitar a ideia de que essa confiança pode significar também mais importações. Mas com as exigências de crescimento económico que a economia portuguesa enfrenta, a confiança conjuntural de consumidores não é exatamente o fator primordial de que esse crescimento necessita. Mas ajuda. Porém, são as expectativas de investimento empresarial que temos de monitorizar. Aí se jogará um novo ciclo de crescimento de exportações puxado pelo investimento e não apenas pela engenhosa e conseguida busca de mercados para utilização de capacidade produtiva disponível e não utilizada. Essa narrativa é mais rigorosa e é ela que deve ser trabalhada, a vários níveis.

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