terça-feira, 2 de setembro de 2014

DRAGHI RÉPLICAS




Como previa, a aqui comentada intervenção de Mario Draghi, em Jackson Hole, sobretudo pelo seu confronto com discursos de outros banqueiros centrais com um mandato bem mais alargado do que o do BCE, tem suscitado imensas réplicas. E houve um pequeno pormenor que me escapou na apresentação do Presidente do BCE. Li o texto do discurso que ficou disponível no dia da intervenção na página do BCE, mas segundo relatos jornalísticos posteriores, a intervenção de Draghi numa certa altura do discurso fugiu ao texto, o que suscitou imensas interpretações. Nessa fuga ao texto, Draghi lançou para o mundo uma nova edição do “farei tudo o que for necessário” que é muitos entendida como o decisivo fator de acalmia dos juros da dívida pública na periferia sob ou ameaçada por resgate. Desta vez, Draghi usou uma fórmula do tipo “utilizaremos todos os instrumentos disponíveis para assegurar a estabilidade dos preços a curto prazo”. Como é óbvio, a estabilidade a que Draghi agora se refere é inversa da que os “inflação-fóbicos” esperariam. Desta vez, são os riscos deflacionários e da “armadilha da liquidez” que começam a preocupar finalmente o líder do BCE, na expressão de outros a “japonização “ da economia europeia.
Mas de volta ao texto, o que se torna interessante é combinar a fuga atrás referida com os lamentos que habilmente Draghi espalhou pela sua intervenção sobre as dificuldades europeias em manejar a política fiscal (orçamental). Dificuldades que são de dois tipos: as que resultam da inexistência de um verdadeiro orçamento europeu que se veja em função da sua dimensão de bloco económico e da falta de harmonização fiscal e as que decorrem da fobia alemã ao expansionismo fiscal. No primeiro semestre de 2014, a Alemanha apresentou o saldo orçamental superavitário mais elevado da sua história posterior à reunificação, cerca de 16 mil milhões de euros.
Ora, de acordo com algumas interpretações já depois alguns dias da intervenção de Draghi, sugere-se que Draghi estará a manobrar nas instituições europeias para conseguir uma espécie de três em um que convença as autoridades alemãs: “quantitative easing” (uso expressivo da política monetária tentando que finalmente os bancos intensifiquem a oferta de crédito à economia), algum estímulo fiscal (sobretudo em Itália e França) com flexibilização da ameaça do pacto orçamental e algumas reformas estruturais também em França e Itália para convencer os adversários do estímulo fiscal. Gavyn Davies, hoje no Financial Times, vai nessa direção e a própria Claire Jones também no Financial Times dá conta dessa possibilidade. É um assunto que interessa a Portugal, mesmo que pouco o possamos influenciar. A seguir com atenção.

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