António Costa é um homem inteligente e com mundo e um político hábil e experiente. É deste pressuposto de raciocínio que parto para analisar a confiança que de há muito decidiu conceder publicamente a um Rui Rio que é todo o contrário do que ele tende a valorizar e apreciar: um sujeito autoritário e chico-esperto, básico e provinciano, condicionado e pequenino.
Ou seja: a minha tese é a de que Costa adotou estrategicamente Rio como o seu protegido à direita, fazendo dele assim como que uma espécie de irmão mais novo cujos mimados protestos se vão calando com os brinquedos que se lhe põem à frente, leia-se no caso metendo-lhe o braço e levando-o a almoçar de vez em quando para lhe dizer umas larachas mais ou menos simpáticas, logo seguidas de umas palavrinhas mais ou menos laudatórias e de preferência ambíguas para jornalista registar.
Esta orientação “costista” já vem de longe, pois que pode ser datada pelo menos dos tempos em que convidava o deslumbrado Rio para descer à ambicionada Capital e com ele se passear pelas Festas de Santo António. E à medida que as circunstâncias foram mudando, a tática foi-se naturalmente ajustando sem todavia por em causa o essencial do que o seu faro político lhe apontava: uma convicção firme de que, em algum momento, iria ter de apanhar com aquele emplastro, de lhe gramar algumas manias e de com ele negociar uns quantos entendimentos – e quando assim é, mais vale irmo-nos fazendo ao caminho, preparando com distância e propriedade aquele beijo que, em chegada a hora, talvez possamos contornar a contento nos indesejáveis contornos mais íntimos.
E se é certo que Costa está agora fundamentalmente concentrado numa outra e interna disputa, não o é menos que nunca regateia qualquer oportunidade de juntar o útil ao agradável, i.e., de procurar provocar, armadilhar e denunciar Seguro sem descurar a utilização de argumentos que possam ir alimentando essa incompreensível saloiice lisboeta em torno da grandeza de Rio (repare-se, não obstante, que até o amigo e sucessor Rui Moreira já está noutra!).
Rio – sempre ele e a sua providencial missão! – logo se deixou arrebatar pela entrevista de Costa ao “Expresso” em que este o dava como o seu adversário político de eleição (assim entregando Seguro e Passos ao seu triste apagamento), tendo-se permitido uma fugazinha noticiosa em torno de um livro que mandou prepararem-lhe para apresentação a breve trecho. Dadas as qualidades que definem o nomeado preparador, uma razoável e pirosa salgalhada está antecipadamente garantida como resultado e a cereja em cima do bolo ainda adviria por acréscimo se o controverso mas lúcido Miguel Cadilhe se deixasse envolver na interpretação de um papel que lhe querem inventar à força e a que é completamente estranho a variados títulos que aqui me escuso de inventariar. E é assim que aquele cultíssimo amante de calhambeques, que “com os dois pés” tanto fez para ajudar o Porto a regredir durante dez anos, volta agora à carga na sua obsessiva ânsia de que muito lhe peçam para se consagrar, desta vez “de corpo inteiro”, à patriótica tarefa de salvar o País em perdição com recurso ao rigor formal que só ele sabe imprimir às contas (e o fundo do Aleixo, os terrenos do Parque da Cidade ou as negociatas com Branquinho?) – convenhamos que a concretização de uma tal hipótese até seria uma penitência bem merecida para toda essa chusma de sulistas e elitistas que dos seus bunkers centralistas tanto se entretém em jogos florais sobre um país que arrogantemente insiste em desconhecer, mas cá acabo por voltar à minha: ao que isto chegou!
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