Tenho de confessar que sou muito impulsivo e errático
na escolha das minhas leituras de formação em economia e ciências sociais em
geral, não tendo propriamente um programa de investigação a orientar essa escolha.
Agora que estou afastado das lides universitárias esse caráter aleatório das
escolhas tem vindo a intensificar-se, mesmo com o enquadramento do Interesse
Privado, Ação Pública a orientar uma parte dessas opções. Continuo a deixar-me
seduzir pelo acaso de uma referência e, de vez em quando, essa referência é uma
autêntica mina porque me conduz a novas pesquisas. Não é método que se
recomende a ninguém, mas sou refém da minha gama demasiado lata de interesses
académicos e por isso já não é tempo de mudar.
A referência de hoje, que pode dar origem a uma
leitura obsessiva e de grande alcance, tem uma história interessante e só a
reproduzo aqui porque está relacionada com alguma interação realizada a partir
deste blogue e do que nele se publica.
Tudo começou com o meu relato aqui no blogue do
encontro de António Costa na Cooperativa Árvore, no Porto, com algumas
personalidades potencialmente apoiantes, onde eu estava presente. Discutindo
criticamente a interpretação que eu tinha realizado da conversa de mesa que tínhamos
travado, o colega Guilherme Costa (GC) teve a amabilidade de me dirigir um mail
em que comentava essa interpretação e que tinha por suporte a incerteza da
governação nas condições atuais em que ela se concretiza. No âmbito dessa
reflexão, o GC referiu-me um artigo que o tinha fortemente influenciado, na
transposição que dele realizou para o mundo da empresa, que é aquele em que se
movimenta. Curiosamente, a referência correspondia a um artigo que tinha passado
algures no tempo pelo meu radar de seduções de leitura, na altura em que pela
entrada das teorias do planeamento o desenvolvimento urbano atraía então as
minhas atenções. O artigo era de autoria do cientista-arquiteto Christopher
Alexander, data dos anos 60 e chama-se “A City is not a tree” (link para o pdf aqui). Nesse artigo, Alexander
defende a sua relevante tese de que as cidades não podem ser representadas por
uma estrutura abstrata do tipo “Árvore”, mas sim por uma outra mais complexa,
designada de “semilattice” (em português livre, algo de semelhante a
semitrama). O artigo é marcante, pois sistematiza a crítica de Alexander à
incapacidade de arquitetos e urbanistas criarem cidades artificiais em
contraponto da complexidade das cidades naturais. Um dia voltarei ao significado
dessa tese.
Por agora, interessa sublinhar que a história não
ficou por aqui. A leitura de “A City is not a tree” despertou-me interrogações
e curiosidade, sobretudo porque dei comigo a pensar por que razão nas minhas
incursões pelas teorias de planeamento e do urbanismo a obra de Alexander não
me tinha saltado com naturalidade. Percebi depois que Alexander é um crítico
violento da modernidade na arquitetura e dos desastres de convivialidade e de
condições de vida que tem gerado e talvez esteja aí a razão para o seu
apagamento.
Mas todas estas interrogações preencheram uma
função bem precisa na minha errática pesquisa. Tratava-se de uma entrada que não
pude deixar de abrir, ou seja o artigo “A
City is not a tree” vai-me levar a novas leituras sistemáticas, compensando
aquilo que penso ser uma lacuna que ainda estou a tempo de compensar.
Christopher Alexander, Professor Emérito em
Berkeley, evoluiu para uma obra de fim de carreira, simultaneamente fonte de
investigação para muitos que iniciam a sua pesquisa, uma obra monumental de
quatro volumes, que tem por título global The Nature of Order – An Essay on the Art of
Building and the Nature of Universe. Ontem, mergulhei no primeiro
volume The Phenomenon of Life e tudo se conjuga para uma leitura
obsessiva que levará tempo. Tenho a intuição de que a minha forma de encarar o
planeamento não será a mesma depois de mergulhar nesta obra monumental, o que não
deixa de ser um enorme aliciante mesmo aos 65 anos.
Sem comentários:
Enviar um comentário