domingo, 13 de abril de 2025

ESTÁ A AMÉRICA À VENDA?

 


(Se é verdade que a equipa MAGA parece continuar a apoiar o seu treinador e impulsionador, não é menos verdade que os apoiantes não MAGA de Trump estão em fase de debandada, descoroçoados pelo início da governação. Continuo a pensar que será pela via dos efeitos erráticos da política económica de Trump que os fundamentos da sua desabrida ação irão ser perturbados. Os últimos dias configuraram o que pode vir a ser uma primeira brecha nessa pretensa política fora da caixa. A sequência observada foi alarmante: primeiro, vendas alarmantes de ações; segundo, perturbações no mercado de títulos do tesouro com vendas significativas desses títulos, considerados como porto seguro para os investidores; terceiro, emergiu também a tendência para a venda da própria moeda americana. Esta última evidência da passada semana é a mais preocupante, pois perante a subida da taxa de juro efetiva (yields) dos títulos a procura de dólares deveria estar a aumentar e apreciar-se por essa via. Ora o que tivemos foi uma venda de dólares nos mercados. Ou seja, os mercados revelaram nos últimos dias vendas simultâneas em massa de ações, títulos do tesouro e dólares, como se os investidores quisessem ver-se livres da própria América. O que é a mesma coisa que dizer que a hegemonia do dólar foi posta em causa. Isso não significa que possamos ter uma tendência acabada nos próximos tempos. Mas o que interessa assinalar é que a convergência daqueles três padrões de vendas em mercado há muito que não era vista e isso só pode significar estupefação e uma profunda desconfiança com a falta de sustentação da política de aplicação indiscriminada de direitos aduaneiros. A situação registada nos EUA na passa quinta-feira era, assim, muito semelhante à dos casos conhecidos de economias emergentes perante uma crise financeira. As taxas de juro elevadas em vez de atrair mais capital eram entendidas como sinal de pânico financeiro, convidando à venda de dólares e à precipitação da sua cotação. Como foi anteriormente referido, essa libertação de dólares não é uma qualquer. Passa-se com a moeda de referência da economia mundial até agora, pelo que o seu significado não pode ser entendido de ânimo leve e isso teve manifestamente impacto na administração americana.)
O que se terá passado então nos últimos dias da semana passada
?

Não há sinais seguros de que essa tendência vá persistir nos próximos dias. Estima-se que tenham sido estrangeiros proprietários de títulos americanos que tenham vendido esses ativos em busca de moedas que estivessem por esses dias a reforçar o seu valor face ao dólar. Explicação mais complexa, porque essa atividade é mesmo complexa, envolve a atuação dos chamados “hedge funds” (fundos de cobertura em português) e essa dispenso-me de a incluir neste texto, já que este blogue não tem seguramente na complexidade financeira a sua razão de ser.

O que parece, entretanto, de relevar é a extrema volatilidade que a situação evidenciou, sobretudo do ponto de vista do contágio registado entre a tensão e instabilidade no mercado de títulos e a oferta e procura da moeda americana. Estes fenómenos de contágio costumam observar-se nos períodos iniciais de algum pânico financeiro e isso é que parece preocupante do ponto de vista do que aqueles movimentos de quinta e sexta-feira podem querer significar.

Em meu modesto entender, o que a volatilidade do fim da semana passada evidencia é a profunda desconfiança dos investidores quanto à lógica subjacente que pode ser descortinada para o descalabro da política aduaneira em curso.
Num post publicado no Bluesky, Joe Politano descrevia com espanto essa ausência total de lógica:

O exemplo de Politano mostra a aberração da decisão de, no que respeita à eletrónica, os produtos intermédios estarem a ser tributados em muito maior escala do que os produtos finais que os incorporam, o que não lembra de facto ao diabo. E como Brad DeLong o assinala com pertinência, mais do que a imposição dos impostos aduaneiros, o que choca mais o mercado é a volatilidade das decisões que acompanham as imposições. Essa volatilidade mina de facto a confiança dos investidores, pois ao contrário dos benevolentes intérpretes das tropelias de Trump essa volatilidade o que significa mais do que tudo é a ausência de racional para as mesmas. Por outro lado, imagina-se a densidade do “inside trading” que estará a acontecer entre os principais apaniguados de Trump. A literatura económica dos direitos aduaneiros mostra com clareza que a principal beneficiária da volatilidade da política aduaneira é a corrupção que o “inside trading” proporciona.

Pertencendo o futuro aos Deuses, o que podemos dizer com segurança é que a semana passada quebrou a costumeira relação observada nos mercados financeiros: yields (taxas de juro efetivas mais altas) significam regra geral um dólar mais forte (apreciado). O que aconteceu foi rigorosamente o contrário.

Não sabemos se por momentos episódicos se, pelo contrário, anunciando perturbações futuras, o dólar deixou de ser moeda de referência para alguns investidores e isso traduziu-se na sua venda em massa.

Será que a libertação de dólares irá continuar? Será que moedas como o euro ou o yen terão a sua oportunidade para equilibrar o seu papel de atractores para os investidores internacionais? Será que os rendimentos dos títulos alemães agora em baixa porque estão a ser procurados como alternativa vão permitir à Alemanha uma outra margem de manobra para o endividamento que acompanha o acordo de governo entre a CDU e o SPD?

São todas elas dúvidas compreensíveis, mas talvez a mais importante seja a de antecipar qual vai ser o comportamento do FED USA (Banco Central)? Vai ele sancionar a desprovida de racionalidade política ação em curso da administração Trump?



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