sexta-feira, 11 de abril de 2025

CRISE FINANCEIRA SISTÉMICA (TAKE 2)

 


(Pedro Marques Lopes foi o único no Eixo do Mal de ontem a evidenciar, embora não sendo economista, alguma preparação para compreender o turbilhão em que a economia e o o sistema financeiro internacional estão mergulhados. Luís Pedro Nunes continua a padecer daquela estranha dissonância entre a capacidade de escrita e a expressão verbal, transformando as suas intervenções num pesadelo dos antigos. Daniel Oliveira cede facilmente aos seus preconceitos ideológicos e a sua preparação é enviesada e limitada apenas a um quadrante de referências (o recurso a Varoufakis é simbólico desse enviesamento). Clara Ferreira Alves está cada vez mais desprendida de um estudo sério das matérias sobre as quais disserta, e santo Deus em matéria económica é um desastre completo, já que não consegue interpretar bem o que lê na imprensa internacional que está sempre a invocar. A preparação de ontem de Pedro Marques Lopes contrastou com toda aquela vacuidade dos seus colegas de painel. Esta gente tem uma imagem garantida que as conduz à preguiça mais indolente e ganha por isso, o que constitui um valente mistério representativo dos nossos tempos. Ganham para ter uma preparação mínima, em respeito também mínimo pelos espetadores que visitam o Programa. E não é difícil estar a par de uma compreensão mínima dos desenvolvimentos turbulentos dos últimos dias.)

No take 1 desta matéria, apoiando-me no prolixo historiador e macroeconomista Adam Tooze, mostrei que o seguimento da turbulência destes dias passa por estar atento às relações dinâmicas que vão ocorrendo entre a Bolsa (mercado de ações) e o complexo mercado de títulos, onde coexistem nos  os títulos de maior risco e preço mais elevado (este último é uma medida do risco envolvido nos mercados), os títulos de futuros e obviamente o gigantesco mercado dos títulos do tesouro americanos dos quais, é sabido, a China possui uma quantidade muito significativa.

A queda dos mercados bolsistas reflete o agravamento das perspetivas de lucratividade das empresas cotadas, que condicionam a distribuição dos dividendos e o valor das empresas na sequência da onda de direitos aduaneiros e da guerra comercial iniciada por Trump. O comportamento da Bolsa é o melhor indicador para mostrar que a conversa da administração Trump é conversa da treta. Os investidores estão a antecipar as más perspetivas induzidas pela guerra comercial e se Musk está certo na sua intuição Peter Navarro e seus apaniguados que aconselharam Trump à guerra comercial são mais burros do que um saco de tijolos. Como mostrei nesse post, a venda de ações significa liquidez que tem de ser parqueada em algum sítio, leia-se em algum ativo, que pode ir ao caso limite do parqueamento nas aplicações do overnight, como se o capital estivesse a ser sistematicamente parqueado em novas aplicações quase instantâneas, tudo favorecido pela tecnologia das comunicações que revolucionou o mercado financeiro.

Mas o mais natural seria o aumento da procura de títulos do Tesouro puxando para cima o preço a que são transacionados e opostamente à descida dos yields (taxa de juro efetiva) desses ativos.

O gráfico que abre este post tem o cunho insubstituível do Economist. O título é revelador – “O que não deveria estar a acontecer”. Os yields dos títulos do Tesouro americanos estão de facto a subir e não a descer, tendência ainda mais saliente nos seus similares de mais curto prazo, permitindo concluir que a procura desses títulos não estará a aumentar, antes a diminuir, registando-se vendas com alguma expressão. Tudo isto, enquanto o mercado bolsista não dá mostras de recuperação, antes pelo contrário.

Como a revista o assinala com a pertinência do costume, esta situação é, regra geral, típica de que algo mais está para acontecer (“they are a cause of more to come”). Não se trata, por conseguinte, de uma simples perturbação, autocorrigível, do mercado e isso significa que a situação entrou numa rampa perigosa que normalmente acontece na antecâmara de crises de pânico financeiro.

 Entrando num domínio em que a complexidade técnica é maior, a revista acrescenta a seguinte informação: “Os spreads das operações de SWAP sugerem que algo de similarmente alarmante está a acontecer. Esses spreads medem a diferença entre os yields dos títulos do Tesouro e as taxas de juro dos swaps, que não são mais do que a média das taxas de overnight que os investidores antecipam. As duas taxas evoluem normalmente na mesma direção, já que uma alternativa à compra de títulos do Tesouro e receber o seu yield fixo é em alternativa depositar dinheiro no mercado overnight e usufruir de uma taxa de juro em evolução permanente.  Mas o que acontece é que os yields dos Títulos do Tesouro a 10 anos estão num recorde de 0,6 pontos acima da taxa de juro dos swaps equivalentes”.

Complexo? Sim, mas muito esclarecedor.

O que sugere que a ideia dos títulos do Tesouro como porto seguro e abrigo das turbulências está profundamente em causa, sugerindo que os investidores estão a desenvolver operações de grande complexidade e risco para enfrentar a incerteza e sobretudo a quebra de confiança na política económica americana.

Aparentemente, o FED está calado como um rato.

É uma matéria para monitorizar atentamente.

Pedro Marques Lopes compreendeu este enredo e iria jurar que leu este artigo do Economist, bem mais informativo e explicativo do que a prosa de Varoufakis.

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