A via
punitiva da estratégia
que inspira o pós-memorando da TROIKA teve, entre ontem e hoje, o seu
processo
de aceleração (um rolo compressor …) perturbado por algumas inesperadas
contrariedades, leia-se críticos, opositores ou Pilatos de nova geração,
para
além claro está da esperada e compreensível indignação ou revolta. O
tema da
inequidade dos sacrifícios (ou mesmo de violação do princípio da
equidade fiscal) ocupou o impacto mediático da proposta de orçamento.
Numa vertigem crucificadora, muitos clamaram pela multiplicação dos
cordeirinhos
para o sacrifício, exigindo o que poderíamos designar de equidade na
penosidade.
Não é esta vertigem que me desperta o comentário de hoje.
Interessa-me, pelo contrário,
concentrar-me naqueles que, numa onda determinada não por considerações de
equidade, mas por considerações de cátedra sobre a competitividade da economia
portuguesa, clamam pela redução salarial no sector privado, agora não por via
fiscal mas por uma espécie de choque de oferta, visando a recuperação dos
ambicionados níveis de competitividade. Curiosamente, não me apercebi que o
sector empresarial (associativismo ou empresários prestigiados) propriamente
dito estivesse muito representado nesta redução ao absurdo. Vi sim a expor-se
gente que se tem mantido bastante afastado da esfera empresarial
transaccionável, escondido numa perspectiva abstracta da empresa e incapaz de
raciocinar nas condições concretas em que as empresas concretas exercem a sua
actividade.
A tentação do choque salarial
reflecte bem a resiliência em alguma classe pensante do universo dos baixos
salários como condimento histórico de competitividade. Impor um choque salarial
em condições de manifesta queda do rendimento disponível real não apenas do
emprego público mas de toda a população empregada conduz-nos a paradigmas de
competitividade que a economia portuguesa tem interesse crucial em erradicar. Sobretudo
após uma década de forte ajustamento de uma parcela significativa do tecido
empresarial português, este regresso à tentação transformar-se-ia no sinal mais
errado que poderia ser dado às estratégias empresariais. O choque salarial em
baixa constituiria o pior incentivo à inovação empresarial e, em contexto
recessivo imposto pela terapia punitiva, tenderia a agravar a já explosiva
destruição de emprego na produção de não transaccionáveis. Esta vertigem do
sacrifício é doentia e neste caso nem as preocupações de equidade a podem
minimizar.
Sem comentários:
Enviar um comentário