As sucessivas vicissitudes por que tem passado o projeto Roncão d’El
Rei (antigo parque Alqueva) do empresário José Roquette no concelho de
Reguengos de Monsaraz até ao seu mais recente pedido de insolvência são paradigmáticas
da sempre complexa relação turismo-ordenamento-crise.
A emergência do projeto exigiu um exercício delicado mas
conseguido de revisão do Plano de Ordenamento da Bacia do Alqueva.
Não vou discutir o argumento de José Roquette que invoca
a contradição insanável do projeto ter sido considerado, primeiro, Projeto de
Interesse Nacional (PIN) pelo governo Sócrates, depois Projeto de Interesse
Estratégico Nacional e não ter obtido co-financiamento por parte da Caixa Geral
de Depósitos, “banco do governo”, que em princípio deveria ter em conta nas
suas avaliações o interesse estratégico do referido projeto. Essa questão é
movediça. Há, pelo menos, uma diferença abissal entre o contexto macroglobal
que determinou a sua classificação como PIN e o que terá presidido à decisão da
CGD. É verdade também que esta última instituição não é propriamente um poço de
coerência. Outras decisões e comportamentos permitem alimentar sérias dúvidas
sobre essa pretensa coerência.
A questão que me interessa debater é a falácia do
argumento que tem sido utilizado pela grande maioria dos grandes operadores turísticos,
vidrados em mega-projetos, de que o ordenamento do território é o grande
responsável pelas vicissitudes de emergência deste tipo de projetos. Ora esta
questão fica irremediavelmente anulada pela génese do projeto Roncão d’El-Rei. Quando
um projeto tem qualidade intrínseca e faz dessa qualidade a sua diferença
competitiva e correspondente inimitabilidade atratora da procura, a relação
turismo-ordenamento pode ser saudável. No caso concreto, o projeto de Roquette
falha não pelo odioso dos Planos de Ordenamento. Falha, sim, pelo ónus da
dimensão imobiliária que comportava e por essa via vê comprometida a via do
financiamento.
A forte desalavancagem que o setor da construção-imobiliária
vai sofrer na próxima década, incluindo o de topo de gama, enfrentará condições
de financiamento impeditivas que obrigarão a uma revisão completa da miragem
dos mega-projetos turísticos. É que o problema central é não haver
mega-projetos sem uma forte componente imobiliária e essa terá de aguardar no
horizonte longínquo. A estratégia turística do Alentejo terá de novo ser
repensada, já que o efeito indutor deste tipo de grandes projetos dificilmente
se produzira nos próximos tempos.
Que os processos de ordenamento poderão ser agilizados do
ponto de vista temporal não tenho dúvidas, sobretudo se as autoridades públicas
responsáveis pelo acompanhamento e emissões de pareceres assumirem mais profissionalmente
a sua função, independentemente das dificuldades de recursos técnicos e humanos
e até de motivação por que estejam a passar. Mas confundir essa agilização com
o argumento idiota de que o ordenamento é o grande responsável pela debilidade
do investimento nacional e estrangeiro cai por terra com casos similares ao do
Roncão d’El Rei.
E, a propósito, é um verdadeiro escândalo que os Planos
Regionais de Ordenamento do Território do Norte e do Centro continuem algures
em algum corredor ministerial entupido por qualquer desalinhamento de circunstância
no interior da maioria PSD-CDS. Custa-me entender que as Presidências atuais da
CCDRN e CCDRC possam conviver naturalmente e sem estrilho com este impasse do ordenamento
do território nestas duas regiões.
Agilizar, agilizar. Talvez seja este o mote que explica o
impasse. Mas agilizar verdadeiramente o quê?
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