domingo, 26 de agosto de 2012

ORDENAMENTO E CRISE


As sucessivas vicissitudes por que tem passado o projeto Roncão d’El Rei (antigo parque Alqueva) do empresário José Roquette no concelho de Reguengos de Monsaraz até ao seu mais recente pedido de insolvência são paradigmáticas da sempre complexa relação turismo-ordenamento-crise.
A emergência do projeto exigiu um exercício delicado mas conseguido de revisão do Plano de Ordenamento da Bacia do Alqueva.
Não vou discutir o argumento de José Roquette que invoca a contradição insanável do projeto ter sido considerado, primeiro, Projeto de Interesse Nacional (PIN) pelo governo Sócrates, depois Projeto de Interesse Estratégico Nacional e não ter obtido co-financiamento por parte da Caixa Geral de Depósitos, “banco do governo”, que em princípio deveria ter em conta nas suas avaliações o interesse estratégico do referido projeto. Essa questão é movediça. Há, pelo menos, uma diferença abissal entre o contexto macroglobal que determinou a sua classificação como PIN e o que terá presidido à decisão da CGD. É verdade também que esta última instituição não é propriamente um poço de coerência. Outras decisões e comportamentos permitem alimentar sérias dúvidas sobre essa pretensa coerência.
A questão que me interessa debater é a falácia do argumento que tem sido utilizado pela grande maioria dos grandes operadores turísticos, vidrados em mega-projetos, de que o ordenamento do território é o grande responsável pelas vicissitudes de emergência deste tipo de projetos. Ora esta questão fica irremediavelmente anulada pela génese do projeto Roncão d’El-Rei. Quando um projeto tem qualidade intrínseca e faz dessa qualidade a sua diferença competitiva e correspondente inimitabilidade atratora da procura, a relação turismo-ordenamento pode ser saudável. No caso concreto, o projeto de Roquette falha não pelo odioso dos Planos de Ordenamento. Falha, sim, pelo ónus da dimensão imobiliária que comportava e por essa via vê comprometida a via do financiamento.
A forte desalavancagem que o setor da construção-imobiliária vai sofrer na próxima década, incluindo o de topo de gama, enfrentará condições de financiamento impeditivas que obrigarão a uma revisão completa da miragem dos mega-projetos turísticos. É que o problema central é não haver mega-projetos sem uma forte componente imobiliária e essa terá de aguardar no horizonte longínquo. A estratégia turística do Alentejo terá de novo ser repensada, já que o efeito indutor deste tipo de grandes projetos dificilmente se produzira nos próximos tempos.
Que os processos de ordenamento poderão ser agilizados do ponto de vista temporal não tenho dúvidas, sobretudo se as autoridades públicas responsáveis pelo acompanhamento e emissões de pareceres assumirem mais profissionalmente a sua função, independentemente das dificuldades de recursos técnicos e humanos e até de motivação por que estejam a passar. Mas confundir essa agilização com o argumento idiota de que o ordenamento é o grande responsável pela debilidade do investimento nacional e estrangeiro cai por terra com casos similares ao do Roncão d’El Rei.
E, a propósito, é um verdadeiro escândalo que os Planos Regionais de Ordenamento do Território do Norte e do Centro continuem algures em algum corredor ministerial entupido por qualquer desalinhamento de circunstância no interior da maioria PSD-CDS. Custa-me entender que as Presidências atuais da CCDRN e CCDRC possam conviver naturalmente e sem estrilho com este impasse do ordenamento do território nestas duas regiões.
Agilizar, agilizar. Talvez seja este o mote que explica o impasse. Mas agilizar verdadeiramente o quê?

Sem comentários:

Enviar um comentário