sexta-feira, 24 de agosto de 2012

PAN CON TOMATE (PA AMB TOMÀQUET)


O tempo neste blogue é de metáforas e autonomias regionais stressadas. Falamos da Espanha, claro.
Hoje, via La Vanguardia de 23 de Agosto, chega-me uma metáfora bem sugestiva, invocada por Antoni Puigverd, afinal uma metáfora gastronómica, adaptada aos desafios que se colocam ao catalanismo de hoje.
Puigverd cita um poeta catalão, Josep Carner, dos inícios do século XX, que investiu nesses tempos contra uma tradição da gastronomia catalã do uso do pão molhado de que o pa amb tomàquet constitui o símbolo mais expressivo. Segundo o poeta Carner, o ideal culinário catalão residiria nas “farinetes” (farinha cozida com água adoçada acompanhada de leite e mel (ou açúcar) que, segundo ele, era um prato rural e humilde para velhos e crianças desdentados.
Mas onde está então a metáfora? Segundo Puigverd, o catalanismo moderno aspirava então que a Catalunha se transformasse numa espécie de Suiça mediterrânica, cultivando a diferença entre a mastigação e a sucção, entendida a segunda como sinónimo de falta de determinação. Mais elegante seria preferir um boa torrada crocante com manteiga ao pa amb tomàquet ou a qualquer outra “farinete”. No fundo, dureza versus brandura, elegância versus rusticidade. E aqui Puigverd remete para a rotura em que o catalanismo atual se encontra, duvidando que exista dureza e capacidade de sacrifício suficientes em todas as gerações para enfrentar o que pode significar a rotura face a Madrid.
Metáfora um pouco rebuscada, mas mesmo assim bem sugestiva quanto ao sentido das transformações que a hipótese de resgate financeiro em Espanha pode significar para as autonomias.
Remexi nas minhas memórias de viajar ainda com filhos por essa Espanha de nações. Vieram-me à lembrança duas peças. A primeira é a de um pequeno-almoço em casa de um casal de amigos, Jaume (um Barça ferrenho que não pode ver o Mourinho nem pintado) e Núria, em Vic, no qual o batismo de pa amb tomàquet, acompanhado de “botifarra”, caíu como uma luva e que hoje recordo não como sucção, mas como uma refeição de eleição. O segundo, que não tem que ver com a metáfora de hoje, é a repetida lembrança de férias estivais na costa brava de ver na varanda dos apartamentos elementos da classe média catalã a beber vinho catalão (presumo) pela maneira mais esquisita de o fazer – um recipiente de vidro com um gargalo muito fininho e comprido do qual caía religiosamente o líquido para a garganta do sedento chefe de família catalão.
Bons tempos, para mim, mas creio que também para a autonomia que então rolava sobre rodas, com a CiU no poder regional e os socialistas catalãos a governar maioritariamente o poder local.

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