(Um pouco longo)
Compreende-se o modelo. Um painel com seis
protagonistas, não sei se todos com verbo fácil e vontade de dizer de sua
justiça, não é fácil de gerir. Por isso, rédea curta para as intervenções e um
plano de intervenções, com conteúdos e tempos. Tudo bem. É verdade que tinha
preparado uma intervenção de maior trespassing,
orientada para uma visão mais integrada do ordenamento do território. As práticas
de ordenamento precisam dessa visão disciplinar mais integrada e menor
acantonamento. Não colheu para o painel. Atribuem-me a dimensão económica, pelo
menos nas duas intervenções mais temáticas. A verdade é que sou economista, por
isso amanha-te meu Caro.
Primeira questão
Que alterações foram observadas
nos últimos 10 anos no quadro económico que justifiquem a revisão do PNPOT?
Do ponto de
vista do ordenamento do território, as dinâmicas económicas suscitam uma dupla
dificuldade. Primeiro, é necessário captar o essencial das transformações
estruturais em curso. Uma estratégia de ordenamento do território não se
prepara com epifenómenos, tendências efémeras, exercícios d estilo de uma
pretensa imitação que não colhe. É necessário captar o que é verdadeiramente
estrutural e sustentado em termos de mudanças. Segundo, não basta captar essas
dinâmicas. É necessário compreender as suas implicações e efeitos territoriais.
Muitos planos estão cheio de belas análises económicas, mas sem qualquer
preocupação de identificação e prospetiva dos efeitos territoriais. Já vi muito
disso e continuo a ver. O discurso integrador da economia só o é em matéria de
ordenamento do território quando é realizado do ponto de vista das suas
implicações territoriais.
Sou dos que
penso que a relativa agonia do crescimento económico da década de 2000 ocultou
um processo de mudança estrutural em curso, essencialmente determinada pela
exaustão do modelo dos não transacionáveis, cuja expressão (imobiliária e
infraestrutural) territorial é bem conhecida, alimentada pelo crédito e pela
dívida. Essa mudança de procura de novas fontes de crescimento económico em
torno do universo dos transacionáveis e de níveis mais elevados de intensidade
tecnológica, é visível, por exemplo, na evolução nessa década da estrutura das
exportações por nível de intensidade tecnológica. Essa mudança em curso foi
impactada pelas duas crises da economia portuguesa, a do impacto da crise
financeira de 2007-2008 e a da crise das dívidas soberanas. Sabemos hoje que
crises ampliadas por terapias de austeridade não têm custos limitados às perdas
de produto observadas enquanto persiste a recessão. Há perdas de produto
potencial da economia, derivadas designadamente de efeitos de histerésis no
mercado de trabalho e também de empresas que não regressam ao mercado.
Não temos
ainda hoje devidamente dominada a geografia da crise. Mas há algo que se pode
dizer a partir do reforço significativo da alocação de recursos aos
transacionáveis, que roça por agora os 45% do PIB. Neste movimento, há duas
fases a considerar:
- Numa primeira fase, a oportunidade externa beneficia a concentração económica instalada;
- · Numa segunda fase, quando o peso da FBCF privada no PIB começa sustentadamente a aumentar, o que não é ainda hoje totalmente líquido, abrem-se novas oportunidades para alguma desconcentração de investimento empresarial e de atividade económica. A instalação ex-novo de novas unidades com orientação extrovertida à partida é um elemento crucial para a competitividade de novos territórios.
É esta
reflexão que me leva ao terceiro ponto, aliás acusada pelo texto do PNPOT, que
é a evidência de que passados 10 anos, há hoje melhores condições para falar de
alargamento da base territorial da competitividade. Nada como é óbvio que nos
leve a pensar que todo o território menos denso pode aspirar à desconcentração
de investimento. Mas isso permite trazer para a exportação novos territórios de
competitividade, alargando a mobilização de recursos e atraindo novos
residentes via investimento e emprego. Vários exemplos poderiam ser aqui mobilizados
como o da economia do vinho, mas há outros exemplos de desconcentração de
investimento não necessariamente ligado ao capital natural, como por exemplo a
aeronáutica no Alentejo.
O meu quarto
ponto é que há também novidades na concentração do litoral. Há dois novos
Sistemas Regionais de Inovação em claríssima maturação, no Norte e no Centro,
com ecossistemas de inovação vibrantes e abertos, potenciando novas trajetórias
de transferência de conhecimento e desenvolvimento tecnológico no Minho
(Braga-Guimarães), no Porto e em Aveiro -Coimbra-Leiria. Ou seja, sem embargo
dos problemas de governação e de sustentabilidade destas mudanças, há novos
ativos em presença com claríssimas implicações no desenho do modelo
territorial.
Segunda Questão – que olhar para
os próximos 10 anos do sistema económico? A revolução tecnológica do digital,
os ecossistemas de inovação e as especializações territoriais tendenciais
Em 1973,
Robert Solow avançou com uma máxima que haveria de ficar conhecida por
“paradoxo de Solow”: os computadores estão por todo o lado menos na
produtividade. Em Junho de 2018, a McKInsey perguntava: Terá o paradoxo de
Solow regressado? De facto, economia digital não estimulou ainda de modo
relevante o crescimento da produtividade. Aliás no seguimento de reflexões de
outros economistas como Robert Gordon.
O que une as
duas declarações, 45 anos a separá-las? A maturação dos efeitos organizacionais
e produtivos das tecnologias é lenta, determinada pelas mediações que exige e
pelo contexto em que emerge. O que é de absoluta e imperiosa ponderação para
uma economia como a nossa que está condenada a ser um follower, ou seja, a
construir trajetórias tecnológicas que passam por uma combinação hábil das
dimensões da difusão-inovação de progresso técnico e aproveitando nichos de
mercado para os quais o conhecimento científico e tecnológico existente no Páis
e a sua absorção empresarial possam fazer a diferença.
O que
sabemos é que a relação dos paradigmas tecnológicos com o território é variável
e tende a ser indeterminada. Poucos se lembrarão do alarme de que as TIC
suprimiriam o interesse do território. Não suprimiram, mas antes revolucionaram
essa relação. Algo de similar pode acontecer com a revolução digital, a
robótica e a inteligência artificial. Não sabemos como o território vai ser
afetado, ou seja como Portugal como território vai ser impactado e que efeitos
tenderá a produzir cá dentro.
Ecossistemas
de inovação de base territorial? Sim, sem dúvida, como resulta do meu primeiro
ponto, Ecossistemas com desigual estádio de maturação e com exigências de
governação e de governança para as quais não estamos preparados e sem soluções
à vista. Não sabemos ainda como é que estes SRI já em formação há pelo menos
uma década reagirão positivamente, reforçando-se, às orientações das
estratégias regionais de especialização inteligente (RIS 3) adotadas no PT2020
e que continuarão no PT2030. Dessa perspetiva e em modo atenuado de influência
podem resultar especializações territoriais, concentrando recursos onde o
potencial de variedade relacionada é mais elevado. Mas em última instância é o
cálculo económico privado que terá de contornar a indeterminação indestrutível
da inovação. E à questão pode o PNPOT dar indicações de atividades produtivas,
a resposta é muito limitadamente, para além de reconhecer a evolução dos SRI
como desejável.
De acordo
com a perspetiva desafiadora de Mariana Mazucatto, o Entrepreneurial State, a
intervenção pública na promoção da inovação faz-se menos por diretivas em
documentos de natureza estratégica e mais por investimentos concretos em áreas
que catalizam e estimulam o investimento privado, reduzindo a incerteza. Não
serão as diretivas e orientações inscritas no PNPOT ou outro documento qualquer
que dão confiança ao setor privado face ao horizonte de incerteza da inovação.
São os investimentos públicos em áreas motoras de inovação, abrindo
complementaridades. As diretivas e orientações perdem-se na vulgarização
programática dos documentos e nas alternâncias democráticas. Os investimentos e
o seu efeito propulsor ficam. Por isso, entendo que o PNPOT só deve
comprometer-se com orientações de especialização se e só se corresponderem a
programas de investimento e de políticas públicas de médio-longo prazo motores
de inovação.
A questão final (dirigida a
todos) – Pode o PNPOT influenciar o programa dos Governos e qual o seu nível de
vinculação?
Tudo depende
da vontade política de o assumir. O PNPOT deve ser a estratégia territorial
inspiradora de todas as políticas, para a qual devem estas convergir. Mas um
quadro ou referencial suficientemente aberto nos seus contornos regionais que permita
às estratégias regionais e sub-regionais enriquecer as opções nacionais, territorializando-as.
Mas com atenção à necessidade de trabalharmos o quadro institucional para as mediações
territoriais necessárias, em função dos territórios pertinentes que cada uma
das políticas públicas que temos. E trabalhando com as CCDR que temos e a
emergente organização intermunicipal.
E agora é encaixar
isto em cerca de 15 minutos com a benevolência do moderador.
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