terça-feira, 26 de junho de 2018

O CRESCIMENTO ECONÓMICO VISTO À LUPA DA DESIGUALDADE



(Os economistas do desenvolvimento, e não apenas esses, sempre foram críticos em relação à utilização da taxa de crescimento do PIB como medida do bem-estar material de uma população. Vários caminhos de crítica foram traçados e finalmente os critérios da desigualdade vêm ajudar nessa tarefa)

A insatisfação que muitos economistas sentem com a utilização da taxa de crescimento económico (a taxa de crescimento do PIB a preços constantes) tem uma longa história e vários caminhos de tentativa de superação dessa insatisfação foram traçados. São conhecidas as tentativas de combinar o crescimento do PIB com a dinâmica de outras variáveis, seja com várias dimensões da qualidade de vida, seja com a poupança dos recursos naturais ao serviço das gerações futuras e não ficaríamos por aqui nessa senda. Há mesmo quem seja mais radical e proponha a substituição do indicador PIB por algo de mais ambicioso. É o caso do Índice de Felicidade das Nações, cuja edição de 2018 (link aqui) acaba de ser publicada, com vastíssima e diversificada informação para os mais curiosos na avaliação comparativa da felicidade nacional. Na sua elaboração, há pelo menos um economista de grande projeção mediática, Jeffrey Sachs, com várias obras publicadas em português.


Mas não é o índice da felicidade nacional que hoje suscita a minha atenção. É antes uma via mais simples, tocada por uma matéria que é extremamente cara a este blogue, a economia da desigualdade. Sabemos, e já o documentámos neste espaço repetidas vezes, que a desigualdade tem merecido na última década de produção de investigação económica uma atenção extrema, aliás com resultados extremos em notoriedade mediática (veja-se o mistério do êxito editorial do Capital no século XXI de Thomas Piketty). Ora é ainda a desigualdade que inspira a procura de uma alternativa ao crescimento do PIB, segundo métodos paradoxalmente muito simples em termos conceptuais, mas ainda de difícil operacionalização. Os economistas americanos agrupados em torno do think-tank Equitable Growth, que tantas vezes é convocado neste blogue por minha iniciativa, chamam à correção do crescimento do PIB como medida da dinâmica do bem-estar material “desintegração do crescimento” (link aqui).

Como se operacionaliza então a “desintegração do crescimento” e que luz nova ela traz à medida do bem-estar material das sociedades?

Em primeiro lugar, há uma operação a fazer, de contabilidade nacional elementar: transformar o crescimento do PIB em crescimento do rendimento, ou seja, ver o seu crescimento pelo lado do que os indivíduos recebem pelos fatores que representam. Transformado em rendimento, o crescimento do rendimento nacional é visto não como uma grandeza global, ocultando a sua repartição pelos grupos de população. Divide-se a população de uma população por grupos (regra geral percentis) e analisa-se o crescimento do rendimento apropriado por cada um desses grupos. Não é difícil demonstrar que a taxa de crescimento do rendimento global é igual ao somatório das taxas de crescimento do rendimento de cada grupo de população ponderada pela percentagem de rendimento que cabe a cada grupo no rendimento global.

Uma simples operação desta natureza transforma radicalmente a interpretação de uma taxa de crescimento opaca numa outra em que será visível a desigualdade dos efeitos de distribuição desse mesmo rendimento. E assim por uma via simples e intuitiva se ganha profundidade na análise da repartição dinâmica do bolo, pressupondo que o bolo cresce.

O Equitable Growth tem uma máxima simples mas de grande alcance: se não medirmos o crescimento desigual não poderemos combatê-lo com medidas de política pertinentes.

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