(Os economistas do desenvolvimento, e não apenas esses, sempre
foram críticos em relação à utilização da taxa de crescimento do PIB como medida
do bem-estar material de uma população. Vários caminhos de crítica
foram traçados e finalmente os critérios da desigualdade vêm ajudar nessa
tarefa)
A insatisfação que muitos economistas sentem com a utilização da taxa de
crescimento económico (a taxa de crescimento do PIB a preços constantes) tem
uma longa história e vários caminhos de tentativa de superação dessa insatisfação
foram traçados. São conhecidas as tentativas de combinar o crescimento do PIB
com a dinâmica de outras variáveis, seja com várias dimensões da qualidade de
vida, seja com a poupança dos recursos naturais ao serviço das gerações futuras
e não ficaríamos por aqui nessa senda. Há mesmo quem seja mais radical e proponha
a substituição do indicador PIB por algo de mais ambicioso. É o caso do Índice
de Felicidade das Nações, cuja edição de 2018 (link aqui) acaba de ser publicada, com vastíssima
e diversificada informação para os mais curiosos na avaliação comparativa da
felicidade nacional. Na sua elaboração, há pelo menos um economista de grande
projeção mediática, Jeffrey Sachs, com várias obras publicadas em português.
Mas não é o índice
da felicidade nacional que hoje suscita a minha atenção. É antes uma via mais
simples, tocada por uma matéria que é extremamente cara a este blogue, a economia
da desigualdade. Sabemos, e já o documentámos neste espaço repetidas vezes, que
a desigualdade tem merecido na última década de produção de investigação económica
uma atenção extrema, aliás com resultados extremos em notoriedade mediática
(veja-se o mistério do êxito editorial do Capital no século XXI de Thomas
Piketty). Ora é ainda a desigualdade que inspira a procura de uma alternativa
ao crescimento do PIB, segundo métodos paradoxalmente muito simples em termos
conceptuais, mas ainda de difícil operacionalização. Os economistas americanos
agrupados em torno do think-tank Equitable
Growth, que tantas vezes é convocado neste blogue por minha iniciativa, chamam
à correção do crescimento do PIB como medida da dinâmica do bem-estar material “desintegração
do crescimento” (link aqui).
Como se
operacionaliza então a “desintegração do crescimento” e que luz nova ela traz à
medida do bem-estar material das sociedades?
Em primeiro
lugar, há uma operação a fazer, de contabilidade nacional elementar:
transformar o crescimento do PIB em crescimento do rendimento, ou seja, ver o
seu crescimento pelo lado do que os indivíduos recebem pelos fatores que
representam. Transformado em rendimento, o crescimento do rendimento nacional é
visto não como uma grandeza global, ocultando a sua repartição pelos grupos de
população. Divide-se a população de uma população por grupos (regra geral
percentis) e analisa-se o crescimento do rendimento apropriado por cada um
desses grupos. Não é difícil demonstrar que a taxa de crescimento do rendimento
global é igual ao somatório das taxas de crescimento do rendimento de cada
grupo de população ponderada pela percentagem de rendimento que cabe a cada
grupo no rendimento global.
Uma simples
operação desta natureza transforma radicalmente a interpretação de uma taxa de
crescimento opaca numa outra em que será visível a desigualdade dos efeitos de
distribuição desse mesmo rendimento. E assim por uma via simples e intuitiva se
ganha profundidade na análise da repartição dinâmica do bolo, pressupondo que o
bolo cresce.
O Equitable Growth tem uma máxima simples
mas de grande alcance: se não medirmos o crescimento desigual não poderemos combatê-lo
com medidas de política pertinentes.
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