(Inventem o que quiserem, governo Frankestein, geringonça à
la nacionalista, outras do género, mas a verdade é que a dinâmica parlamentar
em Espanha se limitou a expressar o sentimento maioritário dos espanhóis. Que
Rivera e o CIUDADANOS se tenham cortado não querendo assumir as
responsabilidades que o eleitorado potencial lhe concedia, disso o PSOE de Sánchez
não tem culpa. Que a situação é de grande instabilidade, de acordo. Mas
atribuir ao PSOE a responsabilidade por isso é grotesco.)
Foi com
dignidade democrática que Mariano Rajoy aceitou no hemiciclo de Madrid a sua
derrota, cumprimentou Sánchez e saiu de cena. Quem o imaginaria ainda até há
bem pouco tempo? Penso que nem o próprio Rajoy inteligiu esse acontecimento
como provável, esticando por isso a corda até romper.
Gostaria de
ser mosca para compreender a sobremesa de muitas horas que Rajoy e o seu núcleo
mais próximo (creio que Soraya de Santamaría não terá estado nesse almoço em
restaurante próximo do Congresso de Deputados) teve na antecâmara da sua
derrota.
Várias
interrogações se perfilam no horizonte político imediato de Espanha. Primeiro,
o que pode nestas condições um governo minoritário de Sánchez fazer: governar para
salvar o coiro numas próximas eleições? Dar resposta a algumas ambições à
esquerda? Pacificar o início de uma nova negociação sobre a questão territorial?
Talvez tudo isso, trabalhar no duro e esperar por um Congresso de Deputados de
agressividade máxima. Segundo, que guerra interna poderá estalar no PP? Terá
Rajoy a lucidez de compreender que o PP necessita urgentemente de renovação de liderança,
sobretudo de alguém o mais longe possível dos salpicos (hoje bátegas) incómodos
de corrupção? Terceiro, qual é o verdadeiro CIUDADANOS que vai emergir? O da
modernidade e de um espanholismo mais século XXI ou de um partido incapaz de
refundar a direita em Espanha? Quarto, que comportamento vão ter as principais
autonomias? Contribuir para uma gestão equilibrada da questão territorial,
aproveitando a presença no poder do único partido que o pode assegurar enquanto
ponte entre várias tendências de pensamento sobre a matéria em Espanha? Ou
escacar ainda mais o que já está bastante frágil?
Incerteza
que baste. De resto, a certeza de que tal como em Portugal não basta ganhar
eleições para poder governar. A dinâmica parlamentar resultante de umas dadas
eleições tem mais margem de manobra do que alguma vez pareceu e a atomização
política é sinal dos tempos. Por isso, uma lição sai de tudo isto. Mesmo em casos de
declínios eleitorais consumados a negociação democrática pode dar espaços
inesperados aos que não beneficiam da paixão eleitoral. O que significa que são
necessários nervos de aço e sobretudo assegurar a dignidade do trabalho parlamentar.
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