“Distúrbios nos bairros da Grande Lisboa: que região é esta?”, perguntava há dias um dos nossos órgãos de comunicação social. A questão faz sentido, na medida em que tudo foi espoletado pela aparente ligeireza que se pretendeu associar à morte de Odair Moniz – um cidadão nascido em Cabo Verde e morador no Bairro do Zambujal (Amadora) –, após ter sido baleado por um agente da PSP no Bairro da Cova da Moura (também no concelho da Amadora) e pela impulsiva reação de revolta dos seus próximos de relação ou condição perante a impunidade que parecia tender a prevalecer.
Pois a dita região é exatamente aquela que surge bem identificada na capa do “Público” que acima se reproduz, uma região em que a desigualdade gritante se aprofunda por força de um afluxo constante de pessoas (nacionais e estrangeiras) em busca de melhores condições de vida e trabalho – isto no quadro de um país que evidencia as variações populacionais que abaixo se apresentam (para os anos já transcorridos deste século XXI) e que um recente editorial de Sónia Sapage descrevia liminarmente do seguinte modo: “Somos um país de dez milhões de pessoas que tem quase três milhões a viver às portas de Lisboa, um valor que aumentou ligeiramente entre os Censos de 2011 e os de 2021. Na Área Metropolitana do Porto estão mais 1,7 milhões. Feitas as contas, somos um pequeno país de 92 mil quilómetros quadrados em que praticamente metade da população vive em duas grandes regiões urbanas, ambas no litoral, com todos os problemas que daí advêm.“ Dito de outros modos, integralmente compatíveis entre si: trata-se de uma região que que o meu colega de blogue já aqui caraterizou em termos de níveis e custos concentracionários insuportáveis e ingeríveis; a mesma região que eu também já aqui caraterizei, com recurso à investigação de Andrés Rodríguez-Pose, como sendo aquela que em Portugal mais afundada se encontra em indicadores típicos da chamada “armadilha de desenvolvimento” (mapas mais abaixo).
Ora foi perante algumas resultantes trágicas destas realidades incontornáveis reveladas por toda uma região alargada que se estende em volta da nossa Capital, e que cada vez mais fazem de Lisboa uma “cidade perdida” (cito Miguel Sousa Tavares), que tantos por cá se pronunciaram e muitos se manifestaram por estes dias. De tudo quanto se disse, quero apenas salientar duas tomadas de posição: a da inutilidade política fundamental que voltou a mostrar ser timbre do nosso ministro da Defesa Nacional (“já chega”, disse ele, quando é de puro bom senso assumir que, se nada tiveres a acrescentar de válido, te limites ao silêncio!) e a das declarações matarruanas e instigadoras provenientes do provocador líder parlamentar do “Chega” – a balbúrdia que crescentemente reina no retângulo não vai ser enfrentada/ultrapassada enquanto os nossos responsáveis (políticos mas também sociais e institucionais) se mantiverem agarrados às simultâneas salvaguarda preferencial dos seus interesses próprios e salvação minimalista das suas culpas e más consciências através de apelos cínicos a uma normalidade que mais não se traduz que por mudanças estritas e marginais num status quo apodrecido e dificilmente regenerável.
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