domingo, 20 de outubro de 2024

O RITUAL DE UM CONGRESSO

 


(A esmagadora maioria dos comentadores políticos pensa que Pedro Nuno Santos esvaziou o congresso do PSD, anunciando na sexta-feira passada a sua decisão de propor à Comissão Política do PS a abstenção na votação da generalidade do Orçamento de 2025. Não quero ser desmancha-prazeres, mas entendo pelo contrário que a jogada de antecipação de PNS serviu às mil maravilhas para o PSD regressar ao ritual de um congresso e durante cerca de dia e meio esquecer as agruras de governar em minoria e passar pelo incómodo de ser derrotado em matérias legislativas no Parlamento. Não irei ao ponto de defender a tese de que Montenegro e o seu grupo esperavam essa antecipação. O que simplesmente afirmo é que resolvida na sexta-feira a posição do PS, estavam criadas as condições para que o congresso se transformasse numa espécie de orquestração da felicidade inventada. Não esqueçamos que nos últimos dias antes de PNS decidir-se pela abstenção, Montenegro deixou-se enredar pela novela do diz que disse ou não disse com André Ventura, a propósito do número de reuniões efetivamente realizadas com o Chega no mesmo âmbito do Orçamento. Assim sendo, foi possível no Congresso de Braga construir um cenário de apresentação das coisas como se amanhã segunda-feira o governo não regressasse ao inferno de sobreviver em minoria. Por isso, ao contrário do que a generalidade dos comentadores o admitiu, o pretenso esvaziamento do Congresso de Braga veio a calhar para Montenegro e para o seu grupo mais restrito.)

Vale o que vale, mas a chamada de Leonor Beleza para assumir a Vice-Presidência do PSD, num cenário de paridade de género, integrou essa mesma encenação, assim como a retirada dos membros do governo de funções partidárias. Estas duas decisões enchem o olho mediático, sobretudo porque Beleza é uma mulher mediaticamente imaculada e ocupa a cena. Depois, um conjunto de medidas em número reduzido para não se perderem no circuito mediático fecha o cenário. O congresso está feito e nem tempo existiu para alguém ousar justificar o crescimento anémico, tão abaixo das grandes promessas eleitorais e das vantagens milagrosas do choque fiscal.

Amanhã, segunda-feira, regressa a realidade amarga de governar em minoria. A ilusão passou e da pretensa grande política lá voltaremos à pequena política. Com as forças à esquerda do PS fora de combate ou pelo menos à procura de um posicionamento que mantenha viva a militância, tudo vai reduzir-se à triangulação entre o Governo, o PS e o Chega. Estimo que enquanto durar a discussão do Orçamento vá assistir-se a um verdadeiro caos de discussão, sobretudo se Ventura estiver nos seus melhores dias de agitador inveterado. Outra coisa diferente acontecerá quando o Orçamento for aprovado. Haverá então tempo para refletir sobre a dinâmica política que teremos em 2025, já que após a aprovação do documento na especialidade e votação global o Natal estará à porta e Montenegro conceberá o programa natalício à sua medida.

 

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