segunda-feira, 4 de novembro de 2024

A TENTAÇÃO DA CÓPIA E OUTRAS FORMAS DE NORMALIZAÇÃO DA ABERRAÇÃO POLÍTICA

 

(A diatribe rasco-populista do Presidente da Câmara de Loures, pretensamente iluminado pelas alimárias do Chega na denúncia dos acontecimentos nefastos do bairro do Zambujal e no ataque cobarde aos autocarros, não é, como Pedro Nuno Santos procurou desculpabilizar o seu colega de partido, um momento de infelicidade de um autarca. É antes o reflexo de um padrão que está aí, emergente, que já começou na Europa, e que vem direitinho até nós, com algum atraso, o que já não é novidade. Esse padrão está no mimetismo que as forças democráticas assumem relativamente às forças da extrema-direita, seja ela mais elaborada como Giorgia Meloni, ou mais rasca como a do VOX em Espanha ou ainda mais desqualificada como a do Chega em Portugal. Com o pretexto de querer estancar o crescimento eleitoral das posições mais radicais, assistiremos do lado do PSD e do CDS, e o caso de Loures mostra que também é possível que atinja o PS, a réplicas miméticas dos tiques anti-imigração e populistas da direita radical e antidemocrática. A ilusão de suster com essa réplica a fuga de eleitorado não passa disso, uma ilusão. Há muito tempo que a escolha dos autarcas que protagonizam as candidaturas socialistas autárquicas deixou de ser um campo favorável à defesa dos valores do Partido aplicados a territórios específicos, como se o local não fosse também um espaço de barganha dos valores políticos. Esta ideia de que os valores políticos diferenciadores são para as legislativas e que nas locais imperam outros princípios é tonta, oportunista e espaço de manobra para toda a série de estratagemas de pequena política que não enobrece o Partido e o rejuvenesce no pior sentido. O Presidente de Loures tem idade para ideias mais frescas e combativas.)
 

Em tom convergente com este mimetismo populista dos partidos democráticos anda por aí também uma outra tendência, a que eu chamaria a normalização da aberração política, mas que tem a mesma raiz. Normalização, por exemplo, dos desmandos antidemocráticos de Trump. Um bom exemplo desta nojenta normalização esteve na ida dos radicais livres (Pedro Tadeu e Jaime Nogueira Pinto) ao programa do Ricardo Araújo Pereira, momento a que só faltou a beatização de Trump, um pouco excessivo afirmou Nogueira Pinto, mas incapaz de sublinhar a clara violação de princípios básicos da democracia que o recandidato à Casa Branca exala do seu comportamento, no mesmo registo em que glorifica o tamanho do membro do grande golfista americano Harold Palmer. Essa tendência de normalização aconteceu também com a lavagem de branqueamento da boçalidade antidemocrática de Bolsonaro e, como verão, acentuar-se-á se, para nossa desgraça, Trump conseguir regressar à Casa Branca.
 

É algo que está também presente na estranha dificuldade de muita gente em Portugal discernir se votaria Kamala Harris ou Donald Trump, acaso fosse eleitor americano. Álvaro Vasconcelos insurge-se hoje no Público com a figura triste que alguns deputados portugueses do Parlamento Europeu fizeram no Programa Eurodeputados na edição de 27 de outubro de 2024, pronunciando-se sobre a disputa entre Kamala Harris e Donald Trump. Não perceber o que está essencialmente em jogo amanhã é sinal de uma miopia política que faz parte, em meu entender, da tal normalização da aberração política. É com isso a fazer-nos companhia que poderemos ficar acaso o eleitorado penda mesmo que por pequena margem para o lado de Trump.
 

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