O Financial Times
de 22.12.2011 (http://www.ft.com/intl/cms/s/0/e048b072-24c5-11e1-ac4b-00144feabdc0.html#axzz1hP4qDVl2) dedica, por
fim, após um longo interregno, algumas linhas ao processo de concretização do
resgate financeiro em Portugal. Poderia esperar-se que, de acordo com o
alinhamento do jornal, estivesse essencialmente em foco o grau de cumprimento
do pesado acordo. Mas, pelo contrário, é o tema das relações entre a terapia de
austeridade e a desigualdade que marca a reportagem do correspondente em Lisboa.
Tal como
oportunamente sublinhei na Conferência Economia com Futuro, em 30 de Setembro,
em Lisboa, o grau de desigualdade com que a terapia de austeridade começou a
ser aplicada constitui na sociedade portuguesa uma almofada de reduzidas
proporções protectoras. A margem de manobra que ela permite é muito limitada.
Portugal já era no início do processo a economia mais desigual da União Europeia.
A reportagem
tem pontos controversos, depreende-se que resultantes da entrevista realizada a
António Barreto. Não conheço nenhum artigo representativo de António Barreto
sobre o tema e por isso é difícil perceber se o argumento é do próprio
ou da interpretação feita pelo jornalista. A grande concentração da propriedade
e o peso do Estado (“demasiado gordo e demasiado fraco”) são apontados como os
principais factores de desigualdade. Uma pequena diatribe sobre os professores
e o seu peso negocial, com expressão remuneratória, fecha o argumento. Parece
estranho que a dinâmica de funcionamento do mercado de trabalho fique fora da
explicação da desigualdade. A incapacidade de continuar a criar emprego
desqualificado ao ritmo dos anos 80, por exemplo, representou a primeira
machadada no modelo de baixa desigualdade que a economia portuguesa gerou nos
primeiros anos após 1974.
Mas o que marca
o artigo é a remissão para um recente “paper” do Institut of Economic and
Social Research do Reino Unido (“Os efeitos distributivos das medidas de
austeridade: uma comparação entre seis países da União Europeia”, 2011) (http://www.socialsituation.eu/research-notes/SSO2011%20RN2%20Austerity%20measures_final.pdf).
De acordo com o referido estudo, a terapia de austeridade aplicada é claramente
regressiva, isto é, penaliza mais acentuadamente os grupos de menor rendimento,
capturando percentagens mais elevadas do seu rendimento disponível. Ou seja, não
se trata apenas de matéria impressiva. Corresponde, pelo contrário, a uma
perigosa deriva, comprometendo a já limitada margem de manobra que o grau de
desigualdade inicial consentia.
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