sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

A CIMEIRA DAS MÚLTIPLAS INTERPRETAÇÕES


Passei uma boa parte da tarde de hoje dividindo-me entre duas coberturas praticamente on line da cimeira europeia, a do Financial Times (http://blogs.ft.com/the-world/2011/12/eurozone-crisis-live-blog-20/##axzz1fz7KDLDV) e a da Reuters (http://live.reuters.com/Event/Buzz_from_the_European_Summit) e a leitura da declaração dos chefes de Estado ou de Governo da zona euro (http://consilium.europa.eu/uedocs/cms_data/docs/pressdata/en/ec/126658.pdf).

O sentido dramático da cimeira, provocado pela rotura e isolamento do desajeitado (expressão que domina uma larga percentagem dos comentários) Cameron no processo de negociação, penaliza uma interpretação mais ampla dos resultados. Ao que parece, a posição do Reino Unido não terá sido determinada por críticas sólidas ao processo de governação democrática das decisões. Terá sido, antes pelo contrário, determinada pela defesa dos interesses do sistema financeiro da City londrina. Terá também eventualmente sobrevalorizado o aparente apoio inicial de alguns países às dúvidas de Cameron, designadamente dos 10 países não pertencentes à zona euro, que se esfumou num ápice. As sequelas da rotura e isolamento do Reino Unido abrem, por si só, um vasto campo de indeterminações que podem ir até à implosão da própria União Europeia configurada a 27. Tem sentido dramático, mas não é novidade. O Reino Unido sempre pareceu mais focado na lógica do mercado interno europeu do que no aprofundamento da governação da União Europeia. O alinhamento com as posições da City penaliza fortemente o impacto que a rotura de hoje poderia representar em termos de alerta quanto ao processo democrático da União. Resta a curiosidade de saber se o próximo passo da dinâmica política interna britânica será ou não um referendo sobre a continuidade da sua presença na UE.

Mas para além do drama central, a trama da indeterminação persiste. A leitura da declaração confirma que as posições de Draghi dos últimos dias foram premonitórias. O jargão do economês da zona euro ganhou um novo must – o “fiscal compact”. Draghi parece bem mais interveniente do que Trichet. As suas posições estão bem expressas no documento. Para além disso, surgem posições alemãs bem identificadas: maior disciplina fiscal; equilíbrio orçamental como regra constitucional ou equivalente; aprofundamento dos procedimentos por défices excessivos; reforço limitado do poder de intervenção de Fundo de Estabilidade e Equilíbrio Financeiro e sua posterior transformação no Mecanismo Europeu de Estabilidade (este último com maioria qualificada de 85% no processo de decisão); não extensão da co-responsabilização do sector privado em resgates financeiros adoptada para o caso grego; nenhuma abertura, por mais ténue que seja, à emissão de títulos de dívida conjuntos, mesmo que condicionais e nula referência a um papel mais activo do BCE.

A ortodoxia alemã, agora representada sob a forma de acordo internacional assinado a 26 ou a 23, consoante algumas consultas a parlamentos nacionais, o mais tardar até Março de 2012, parece ter ganho o foco da discussão. É neste contexto de mais do mesmo que emerge do drama artificial alimentado pela rotura do Reino Unido que devem ser compreendidas algumas reacções de desagrado pelo resultados da cimeira:

  • ·        Uma reacção entre os conservadores: “A Grã-Bretanha está tão isolada da Europa como um passageiro que recusa entrar no Titanic antes deste zarpar”;

Continuo muito curioso sobre os desenvolvimentos que os resultados da cimeira vão determinar em matéria de debate político interno e de validação em sede de parlamentos nacionais e de algumas maiorias políticas instáveis (Holanda, por exemplo). Parece não estarmos perante alterações menores de tratados existentes. Entretanto, pela hora em que escrevo não há sinais evidentes por parte dos enigmáticos mercados. O que parece contrariar o tom grandioso com que alguns líderes europeus apresentaram os resultados.

2 comentários:

  1. Os enigmáticos mercados não são mercados. São pecados. Mas:
    http://www.lemonde.fr/economie/article/2011/12/09/les-bourses-europeennes-en-hausse-dopees-par-l-accord-de-bruxelles_1616251_3234.html

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  2. Já agora:
    http://olinguado.blogspot.com/2011/12/reinventar-tordesillas.html

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